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Cremesp: País troca qualidade por quantidade de escolas de medicina

25 jul 2012 - 10h21
(atualizado às 11h03)
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Renata Crawshaw

Para tentar reverter a "troca da qualidade de ensino pela quantidade de escolas" de medicina no País, o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) tornou obrigatório o Exame do Cremesp, um processo de avaliação dos formandos em Medicina semelhante ao aplicado pela Ordem dos Advogados do Brasil.

A diferença, por enquanto, é que o Exame de Ordem tem força de lei, e sem aprovação os bacharéis em direito não podem advogar. Na medicina, o exame (que existe há sete anos em caráter facultativo) será obrigatório, mas a nota não impedirá o profissional de trabalhar. A primeira prova no novo modelo acontece em novembro. Em entrevista ao Terra, o presidente do Cremesp, Renato Azevedo Júnior, afirmou que, apesar de ser o segundo país com mais escolas de Medicina no mundo, o Brasil não forma bons médicos na mesma proporção. "São escolas que não têm hospital de ensino, não têm corpo docente em número e qualidade suficiente, não têm biblioteca, laboratório, nem cadáver para estudo de anatomia, e não tem garantia de residência médica após a graduação". Veja a seguir os principais trechos da entrevista:

Terra - Por que o aluno que fizer a prova e for reprovado vai receber o registro?

Renato Azevedo Júnior Porque não temos uma lei que nos permita negar o registro de um médico que se forma em qualquer faculdade de medicina no Brasil hoje. Diferente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que tem uma lei federal que permite a ela não dar o registro para quem não passa no exame. Infelizmente, ainda não temos essa lei, a gente apoia um projeto que prevê que o estudante reprovado volte à faculdade e fique mais um ano em estágio. A obrigatoriedade que o conselho de medicina de São Paulo está exigindo é o comparecimento e a realização da prova, aí o recém-formado receberá um documento do conselho, que será um dos exigidos para ele obter o registro médico.

Terra - Qual o principal objetivo de fazer prova já que não existe obrigatoriedade da aprovação?

Azevedo O primeiro objetivo é fazermos avaliação do ensino médico. O resultado será fornecido de maneira confidencial. Será feito um consolidado do exame, que será fornecido para cada escola. Essa informação também vai para o Ministério da Educação (MEC). Tem acontecido no Brasil nos últimos anos uma troca da qualidade do ensino pela quantidade de escolas de medicina. Hoje temos 196 escolas, somos o 2º colocado mundial, só perdemos para a Índia.O nosso exame, que por enquanto é voluntário e com questões básicas em medicina, tem demonstrado isso, já que 50% dos estudantes não conseguem aprovação. E, paralelamente, há essa abertura indiscriminada de escolas médicas autorizadas pelo MEC. Hoje, o médico sai mal formado de uma faculdade qualquer e já ganha o registro. Não dá mais para continuar assim.

Terra - O anúncio do MEC da criação de 2,4 mil vagas de cursos de medicina vai de encontro ao Cremesp?

Azevedo Em qual hospital escola eles vão estudar? Tem corpo docente em número e em qualidade suficiente para atender a esses alunos? Eles têm garantia de vaga na residência médica? Não tem. Hoje temos vaga na residência médica apenas para metade dos alunos que se formam como você vai aumentar o número sem essa garantia?

Terra - O cenário de despreparo nas escolas de medicina é uma tendência nacional?

Azevedo Tem sido no Brasil inteiro. Em São Paulo vamos alcançar o número absurdo de 36 faculdades de medicina. Tem cidades médias do interior paulista que tem três faculdades de medicina. A má formação é uma consequência imediata. E o mais espantoso é que a maioria das faculdades é privada, que cobram de R$ 4 mil a R$ 5 mil por mês dos estudantes. Para chegar ao fim do curso e a faculdade falar que ele vai ter que arrumar um estágio em um hospital. Não é séria uma coisa dessas.

Terra - Quais seriam as alternativas para melhorar o ensino da medicina, além do exame obrigatório?

Azevedo Essa é uma função, uma obrigação e um dever do MEC, junto com o Ministério da Saúde. O aparelho formador é obrigação do ministério, eles têm todas as informações sobre a má qualidade do ensino médico no Brasil, muito mais do que a gente tem. Inúmeras faculdades deveriam ser fechadas porque não têm a menor condição de ensinar medicina para ninguém. Mas o MEC não fecha e, pelo contrário, autoriza a abertura de cada vez mais cursos.

Terra - A ideia é que a prova se tornasse como um exame da OAB?

Azevedo A gente defende aqui em São Paulo que seja aprovada uma lei no Congresso Nacional para que se estabeleça o exame de habilitação do recém-formado em medicina. E aquele que não conseguir aprovação no exame, volta para a faculdade e fica mais um ano aprendendo e estudando, e depois se submete ao exame novamente.

Fonte: Terra
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