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Monitores ajudam indígenas a se inserirem na universidade

9 ago 2013 - 17h57
(atualizado às 17h58)
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<p>Letícia Cardoso monitora sua colega de terceiro semestre de Enfermagem na UFRGS Berenice da Silva</p>
Letícia Cardoso monitora sua colega de terceiro semestre de Enfermagem na UFRGS Berenice da Silva
Foto: Divulgação

“Há uma invisibilidade dos estudantes indígenas na sala de aula”, afirma a professora da Universidade Federal do Tocantins (UFT) Márcia Machado, antropóloga e doutora em Ciências Sociais. Alunos e professores parecem se recusar a ver que existe, dentro da instituição, pessoas vindas de outra realidade social e cultural. Em busca da inserção do estudante indígena, universidades de várias partes do Brasil oferecem bolsas de monitoria para que alunos não indígenas acompanhem seus colegas no processo de adaptação a uma nova sociedade.

Não se trata exclusivamente de orientá-los nos estudos, mas de acompanhá-los nas práticas cotidianas. A Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) conta com o Programa de Monitoria Indígena desde que o sistema de cotas para esta parcela da população iniciou, em 2008. Coordenadora de acompanhamento das ações afirmativas da UFRGS, Luciene Simões explica que grande parte dos indígenas são de áreas rurais, com organizações sociais autogeridas e escolas especiais. No caso gaúcho, a maioria é alocado na Casa do Estudante, no centro de Porto Alegre. A adaptação ao meio urbano e a diferença nas relações interpessoais é um choque para grande parte dos estudantes. Os desafios encontrados pelo indígena geram taxas de evasão de até 90%.

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Orientadora de quatro alunos que monitoram 19 indígenas, Márcia afirma que as dificuldades são de naturezas acadêmica, social e linguística. Como muitos índios aprendem a língua portuguesa apenas depois dos 10 anos, os monitores têm papel fundamental na facilitação da leitura e no acompanhamento dos estudos.

São os obstáculos para a inserção social, entretanto, os mais difíceis de serem superados. Relatos de choques interculturais são frequentes nas universidades. Luciene conta o caso de uma estudante que era vista no campus, porém nunca em sala de aula. Depois de um tempo, os colegas descobriram que ela aguardava no corredor da faculdade, à espera de um convite para entrar na classe. “Os indígenas interagem de maneira diferente, são menos proativos, perguntam menos”, diz a professora.

A diferença na forma de interação pode causar dificuldades no aprendizado. Os professores esperam que os alunos peçam espontaneamente esclarecimentos, enquanto os indígenas aguardam um convite para a interação. É neste ponto que o papel do monitor é fundamental. Caroline Lencine, índia Terena, está no oitavo semestre de Fisioterapia na Universidade Católica Dom Bosco, no Mato Grosso do Sul, e afirma que os seus três monitores a ajudaram muito na explicação do conteúdo de maneira simples, atenciosa e dando abertura para esclarecimentos de dúvidas.

Aprendizado empírico

Dificuldades de natureza acadêmica se dão principalmente nas matérias mais teóricas. “Não é fácil se estudar dez créditos de anatomia quando na cultura indígena se aprende fazendo. É preciso aprender outra maneira de aprender”, diz Luciene. Letícia Cardoso monitora sua colega de terceiro semestre de Enfermagem na UFRGS Berenice da Silva. As aulas de anatomia, biofísica e bioquímica eram as maiores dificuldades da estudante indígena, diz Letícia. Na disciplina de anatomia prática, no entanto, ela se saía muito bem.

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Berenice não precisou de orientação para se inserir na sociedade, mas sim para os estudos. Ela deixou sua aldeia em Iraí, no extremo norte do Rio Grande do Sul, e, aos 15 anos foi morar em Curitiba. A aluna de enfermagem sempre buscou se atualizar, estudar português e informática - duas das maiores dificuldades dos indígenas. Berenice comenta que sua relação com a monitora foi de sucesso, mas que, em muitas vezes, a monitoria falha por não conseguir conciliar os horários livres dos estudantes envolvidos. Em grande parte das bolsas, os monitores - que, dependendo do caso, podem ser mais ou menos de um por aluno - dedicam 20 horas semanais ao acompanhamento do aluno, ao estudo da cultura indígena e a conversas com seus professores orientadores.

Identidade cultural

Preservar a cultura e inserir o estudante na universidade é um desafio para as instituições. Márcia Machado afirma que é necessária a inserção para que os próprios alunos possam defender seus direitos. Luciene Simões acredita que “as identidades se dinamizam”, não se deve ter uma visão conservadora da cultura indígena. Ela diz que é muito comum nas aldeias a escolha de caciques jovens, que têm mais facilidade em se relacionar com outras culturas. “A missão da juventude indígena é estabelecer relações com a cultura não indígena”, afirma Luciene.

Para Márcia, não é aos alunos indígenas que falta preparo para estar na universidade e preservar sua cultura. O problema é a universidade que não está preparada para recebê-los e entendê-los. Casos de preconceito vindos tanto da parte de alunos, técnicos e professores exemplificam isso. Um livro está sendo produzido pelos monitores do Programa Institucional de Monitoria Indígena da UFT com relatos e informações que denunciam o preconceito sofrido em sala de aula. “Deslocamentos culturais são inevitáveis, a questão é o quanto a universidade vai aprender com os indígenas para dar oportunidades para que eles se insiram”, afirma Luciene.

Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra
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