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Revolução iraniana é matriz do fundamentalismo islâmico

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Voltaire Schilling

Iranianos admiriram imagem do Aiatolá Khomeini, líder da revolução de 1979
Iranianos admiriram imagem do Aiatolá Khomeini, líder da revolução de 1979
Foto: AFP

A Revolução Iraniana de 1979 é a matriz do renascimento do fundamentalismo islâmico, seja de inclinação xiita ou sunita, no Oriente Médio e na Ásia Central. Desde 1979, com a derrota das forças do Xá da Pérsia e a ascensão do aiatolá Khomeini, uma visão mais estreita, teocrática, xenófoba e anti-moderna passou a imperar na região inteira.

A vitória das massas iranianas, desarmadas, sobre um exército poderoso, municiado e treinado pelos Estados Unidos, infundiu uma notável confiança nos setores mais atrasados das sociedades islâmicas. Se tal feito era impensável, a vitória do movimento liderado pelos fundamentalistas alterou radicalmente as perspectivas. De minoritários, eles passaram a ser predominantes, tendo como inimigos os governos islâmicos que se propõem a colaborar com o Ocidente ou com a Rússia, e no fronte externo contra Israel, os Estados Unidos, a Rússia e a Índia.

A Revolução Iraniana

Foi o enorme entusiasmo provocado no povo persa pela chegada do aiatolá Ruhollah al-Khomeini a Teerã, em seguida a fuga do Xá Reza Pahlevi, em 16 de janeiro de 1979, o ditador que governara o Irã de maneira implacável. O exército dissolveu-se, assim como a Savak, a polícia secreta, e a Majlis, a assembléia dos deputados que sustentavam o regime deposto.

Todo o sistema politico-militar iraniano, apoiado pelo Ocidente desde 1953, ruíra como um castelo de cartas, assombrado pela fúria das multidões que saíram as ruas de Teerã pedindo a cabeça do Xá. Porém, a euforia durou pouco. A luta eclodiu entre as várias agrupações de esquerda e os líderes religiosos. Não demorou para que a balança se inclinasse para os aiatolás, os guias espirituais do povo iraniano. Enquanto isso a sociedade era varrida de cima a baixo de todos os símbolos que podiam identificá-la com os valores ocidentais.

A guerra iraqui-iraniana

Aproveitando o momento de confusão e desordem generalizada, o ditador iraquiano Saddam Hussein, apoiado pelo Ocidente, decidiu atacar o Irã, em setembro de 1980. Foi talvez a pior decisão da sua vida. A intenção dele de fazer um guerra curta, extremamente móvel, com tanques e aviões que lhe proporcionasse "estar em Teerã em três semanas", como ele assegurara aos americanos, revelou-se uma trágica fantasia.

Nos dez anos seguintes, até 1989, iraquianos e iranianos travaram uma mortífera guerra de fronteiras que produziu milhares de mortos. Além de invadir o Irã para recuperar alegados direitos históricos sobre o canal Shatt al Arab, Saddam Hussein procurou aparecer ao mundo sunita e ocidental como uma barreira à expansão do fundamentalismo xiita sediado em Teerã.

A guerra russo-afegã

A intenção de neutralizar a potencialidade revolucionária do fundamentalismo islâmico, despertado pela Revolução Iraniana de 1979, também foi a preocupação da União Soviética quando o Politburo, em Moscou, ordenou que suas tropas transpusessem a fronteira afegã para dar apoio ao regime pró-comunista de Kabul.

Ao contrário do que imaginaram, a presença soviética incitou uma rebelião generalizada entre as tribos e facções afegãs. As sete principais delas uniram o seu esforço em fazer com que em cada vale do Afeganistão fosse preparada uma emboscada aos invasores e que atrás de cada pedra um tiro certeiro poderia abater um soldado russo.

A situação deles melhorou ainda mais quando a Jihad foi proclamada. Milhares de combatentes, vindos de diversas partes do Islã, atravessando a fronteira do Paquistão, apresentaram-se para, embalados atrás de um fuzil Kalichnikov e empunhando um lança-míssil portátil Steiger americano, fazer dos russos arrependerem-se amargamente de terem cruzado a fronteira, violando um país muçulmano.

Dinheiro não lhes faltou. Recursos americanos juntaram-se aos da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes, além do que fora coletado pela diligencia de Osama Bin Laden entre as fortunas privadas do Oriente Médio. Em abril de 1988, a União Soviética, impotente em deter os mujadhins, depois de ter perdido 15 mil homens nas incontáveis armadilhas que lhes prepararam, ordenou que suas tropas se retirassem do Afeganistão.

O papel do Afeganistão

Dez anos depois da Revolução Iraniana, uma nova vitória sacudiu o mundo islâmico. Desta vez não foi contra o desgastado exército iraniano, mas contra o poderoso Exército Vermelho, até então uma das mais eficazes máquinas de guerra do século 20. Entre os heróis dessa vitória impensável, emergiu a figura de Ahmed Shah Massoud, chamado de Leão do Panjshir.

As consequências psicológicas disso foram incalculáveis. Para as massas islâmicas pareceu que Alá, depois de grande ausência, voltara para empunhar a espada do Profeta contra os infiéis e contra os hereges. A fronteira do Paquistão com o Afeganistão tornou-se então um forja de mujadhins, de guerreiros islâmicos dispostos a tudo. Kabul tornou-se assim a capital do fundamentalismo sunita, tendo no pouco conhecido Mullah Mohammed Omar, nascido em 1959, o seu mentor político e espiritual, surgindo no cenário do islamismo radical como uma espécie de Imã oculto, aquele que poucos enxergam mas a quem todos obedecem.

Os campos do Afeganistão

Em campos especiais, mantidos com os mais diversos tipos de recursos, foram treinados milhares de combatentes que, depois, foram expedidos para os mais variados destinos. Alguns se dirigiram para a Bósnia para ajudar os muçulmanos locais, enquanto um número significativo deles misturou-se à guerrilha da Chechênia na primeira guerra que eclodiu no Cáucaso, para lutar contra as tropas da Federação Russa. Outros ainda infiltraram-se pela fronteira da Caxemira para por em fuga os indianos e assolar suas guarnições militares.

Neste amplo raio de combates, os americanos conheceram uma guerra especial. Não aquela travada pelos guerreiros islâmicos na Bósnia, na Chechênia, no Daguistão ou na Caxemira, mas a que se manifestou por meio de uma série de atentados seletivos, organizados pelo Al-Qaeda de Bin Laden, visando claramente objetivos militares e diplomáticos.

Portanto, fica evidente que os mujadhins, tendo apenas o apoio do regime talibã do Afeganistão, a neutralidade um tanto cúmplice do Irã, e o oscilante apoio estratégico do Paquistão, declararam guerra às potências do mundo: Rússia, Estados Unidos e Índia.

Fonte: Especial para Terra
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