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Francês Debret teve papel no desenvolvimento do Carnaval

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Voltaire Schilling

'Vi...certo Carnaval em que alguns grupos de negros mascarados e fantasiados de velhos europeus imitavam-lhes os gestos...eram escoltados por alguns músicos, também de cor e igualmente fantasiados.'

O entrudo, de Debret
O entrudo, de Debret
Foto: Reprodução

(J-B, Debret - Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, T. I, pág. 220, 1836).

De certo modo tudo começou com as festas da Revolução Francesa. Robespierre querendo introduzir a celebração à Razão (a deusa do paganismo iluminista) contratou os serviços de Louis David, pintor famoso promovido a coreógrafo oficial da Convenção Nacional. O desfile de 10 de novembro de 1793, supervisionado por jacobinos radicais, que culminou na transformação da catedral de Notre Dame, de Paris, num templo pagão, foi um sucesso e projetou seu autor como hábil organizador de festejos cívicos ( estes eram uma ideia de Jean-Jacques Rousseau que as considerava fundamentais para consolidar o amor à pátria).

Quando Napoleão ascendeu ao poder, Louis David refinou-lhe as paradas militares como ainda promoveu toda a encenação da coroação de Bonaparte como imperador em 1804, na mesma catedral de Notre Dame.

Foi neste meio de pompa imperial e arrogância marcial que o então artista Jean-Baptiste Debret, 20 anos mais jovem do que seu famoso primo David, se formou ao frequentar-lhe o ateliêr.

Assumindo as procissões

Já era todavia homem maduro, quase um cinquentão, quando, liquidado o império Napoleônico, aceitou com Lebreton vir em missão cultural para o Brasil. A corte do príncipe d. João, refugiada há oito anos no Rio de Janeiro, precisava de artistas.

Mal os franceses desembarcaram no cais da baía da Guanabara quando foram convocados para auxiliar nas exéquias da rainha d. Maria I, a louca, falecida em março de 1816.

Debret logo mostrou serviço e ganhou a simpatia palaciana. Em seguida, deram-lhe a tarefa para assumir o Ato de Aclamação de d. João VI, ocorrido no Largo do Paço em 6 de fevereiro de 1818.

A população carioca nunca vira tamanha ostentação: perucas&plumas, medalhas, meias de seda e tantas mais bandeiras e fanfarras (era um cenário deslumbrante que depois Debret reproduziu para o jovem imperador do Brasil, d. Pedro I, em outubro de 1822, quando alçou-se ao trono).

D. João VI, como a maioria dos reis portugueses, adorava procissões. Em qualquer ocasião aproveitava a oportunidade de sair pelo Rio de Janeiro com seus cortesãos e fâmulos, o mestre-sala e o porta-bandeira à frente, seguidos pela comissão de frente (a ala dos notáveis), cabendo à banda fazer as evoluções. Tudo orientado por Debret que deu um toque bonapartista às caminhadas.

Imitando a nobreza

Isso calou fundo na escravaria. Nunca mais os desfiles se apagaram da memoria popular carioca. Não tardou para que, ao som das zambumbas e dos clarins, se vestissem como os nobres e se portassem como os viam nos cortejos. Aos poucos, abandonando as brincadeiras de lançarem água de cheiro uns nos outros e as grosserias do entrudo, tomavam as ruas como condes e marqueses, como princesas e baronesas, como fidalgos e outros, cobertos com lentejoulas e ouropéis, na maior metáfora das transgressões sociais até então vista.

Os pobres da terra, em meio à folia geral, traziam para as praças o fabuloso mundo da corte para, em seguida, ver 'tudo terminar na quarta-feira'.

(*) Historiador

Fonte: Terra
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