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Entenda a ditadura através do Festival Internacional da Canção

22 dez 2011 - 11h05
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Controlada pela Divisão de Censura de Diversões Públicas (DCDP), a produção artística brasileira viveu um momento de forte tensão durante a época da ditadura. Segundo o professor de História Robson Arrais, a censura, tanto antes quanto depois do AI5, foi responsável por novas características na produção cultural do País. "O AI5 estabeleceu a censura prévia. Para burlá-la, os artistas passaram a usar figuras de linguagem", explica. O esforço rendeu canções que se imortalizaram e hoje ilustram com maestria os anos em que o Brasil esteve à sombra de um regime militar.

Principal competição musical do período, o Festival Internacional da Canção (FIC) tinha o objetivo de divulgar a MPB, incentivar compositores e arranjadores e promover o intercâmbio cultural entre grandes centros musicais do mundo. Durante suas sete edições - de 1966 a 1972 -, foi dividido em duas fases: nacional e internacional. A campeã da etapa nacional representava o País na edição internacional, que também ocorria no Brasil. "Os Festivais da Canção acabaram se transformando em palco político", afirma Arrais. Confira cinco participantes do festival que podem lhe ajudar a compreender o período da ditadura:

Pra não dizer que não falei das flores (Caminhando) - Geraldo Vandré / 1968

Geraldo Vandré compôs e interpretou a música que se tornaria um hino de resistência do movimento civil e estudantil. Os versos "Vem, vamos embora / Que esperar não é saber / Quem sabe faz a hora, / Não espera acontecer" foram interpretados como uma apologia à luta armada contra a ditadura. "Vandré já era um compositor visado", diz Arrais. "Sem metáforas, a música apregoava a luta de alguma forma."

Na época, o DCDP considerou uma ofensa à instituição militar o seguinte trecho: "Há soldados armados, amados ou não / Quase todos perdidos de armas na mão / Nos quartéis lhes ensinam uma antiga lição / de morrer pela pátria e viver sem razão". A canção, que ficou em segundo lugar na terceira edição do festival, acabou censurada. A primeira cantora a interpretar Caminhando após a censura foi Simone, em 1979.

Sabiá - Chico Buarque e Tom Jobim / 1968

Interpretada por Cynara e Cybele, a campeã de 1968 foi vaiada pela plateia, que desejava que o prêmio fosse entregue à Pra não dizer que não falei das flores. Sabiá era uma canção sobre o exílio de muitos artistas e intelectuais: "Vou voltar / Sei que ainda vou voltar / Vou deitar à sombra / De uma palmeira Que já não há". Mais lírica, acabou apagada pela música de Vandré, que criticava a ditadura com mais incisão.

É proibido proibir - Caetano Veloso / 1968

Durante a eliminatória paulista da edição de 1968, Caetano Veloso foi vaiado ao cantar com Os Mutantes a música É proibido proibir. "Me dê um beijo, meu amor / Eles estão nos esperando / Os automóveis ardem em chamas / Derrubar as prateleiras / As estátuas, as estantes / As vidraças, louças/ Livros, sim..."

Composta a partir de um slogan do movimento estudantil francês, a canção foi desclassificada e recebeu vaias da plateia, que virou as costas para o palco. A reação do cantor se tornou célebre: Caê quebrou o protocolo, enfrentou a organização do festival e desafiou os presentes. "Mas é isso que é a juventude que quer tomar o poder? São a mesma juventude que vai sempre matar amanhã o velhote inimigo que morreu ontem. Vocês não estão entendendo nada, nada, nada, absolutamente nada", bradou. Exatamente três meses depois do episódio de 12 de setembro de 1968, Costa e Silva decretou o AI-5, um dos símbolos máximos da ditadura.

O amor é o meu País - Ivan Lins / 1971

"De você fiz o meu País / Vestindo festa e final feliz / Eu vi, eu vi / O amor é o meu País." Comum às músicas da época, Ivan Lins mescla o amor à pátria ao romantismo - receita infalível para burlar a censura. A música ficou em segundo lugar no FIC 1970 e hoje é um dos símbolos do vendaval ufanista que atingiu artistas da MPB, fazendo coro à marcha Eu te amo, meu Brasil.

Fio Maravilha - Jorge Ben / 1972

Interpretada por Maria Alcina, foi a campeã da última edição do festival, mas já aponta o enfraquecimento do movimento musical no País, rigidamente controlado com a instituição do AI5. "Entre 1969 e 1973 ,com a censura prévia, o conteúdo político das canções tornou-se menos efetivo", enfatiza Arrais. Fio Maravilha é um dos principais retratos da situação: o título é uma homenagem ao jogador de futebol João Batista de Sales, conhecido como Fio Maravilha. A canção foi bem recebida pelo público, sendo cantada pela torcida durante os jogos do Flamengo.

Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra
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