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Professor: sem corretor qualificado, redação do Enem é loteria

5 jan 2012 - 16h28
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Angela Chagas

O caso de um jovem de São Paulo que tirou zero na redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e, após entrar na Justiça, conseguiu que a nota passasse para 880 pontos reascendeu as críticas de estudantes quanto às "injustiças na correção das provas". O professor de redação Rafael Pinna, que já participou como corretor do Enem em 2009, diz que o maior problema é que não há uma seleção de profissionais qualificados para avaliar os textos e que o treinamento é insuficiente. "Assim, a nota da redação é quase como uma loteria".

Veja polêmicas do Enem em 2011

Para Pinna, que é coordenador de redação do Colégio e Cursinho de A a Z e do Pré-Vestibular Social do Rio de Janeiro, a correção do texto tem um grau de subjetividade muito maior do que uma prova de matemática ou de história, mas que quando há controle sobre quem realiza esse trabalho, os erros são minimizados. "O problema é que no formato do Enem, os corretores são pagos por redação corrigida. Assim não se estimula uma correção bem feita, e sim que tudo seja feito muito rápido", afirma.

Pinna diz que os corretores do Enem são escolhidos por indicação e que não há análise das competências técnicas. "Eu fui corretor por indicação de um amigo, ninguém se preocupou se eu sabia fazer aquilo", afirma. O professor diz ainda que participou de apenas um treinamento antes de começar o trabalho de correção. "Foi um encontro que durou menos de cinco horas. Isso é insuficiente, o avaliador acaba fazendo muito a cargo da sua opinião pessoal, o que torna o processo injusto".

Para o professor, o tamanho do Enem, que na última edição teve mais de 5 milhões de inscritos, prejudica o trabalho de fazer uma correção justa. "São necessários 2 mil corretores. Será que é possível encontrar toda essa gente com capacidade técnica para o trabalho? Ainda se houvesse um treinamento reforçado, as injustiças seriam minimizadas", completa.

O coordenador do vestibular da Universidade de Campinas (Unicamp), Maurício Kleinke, concorda que é muito difícil encontrar profissionais capacitados para realizar esse trabalho. "O maior desafio do vestibular da Unicamp é selecionar os corretores para a redação. Se para nós é complicado, imagina para uma seleção do tamanho do Enem".

Kleike diz que a Unicamp foca no treinamento intensivo dos avaliadores para garantir que a correção seja isenta. "Nossos corretores são professores da universidade, de colégios e alunos de pós-graduação. Todos passam por três etapas de treinamento: um simpósio em abril para explicar como funciona o trabalho, um treinamento em outubro e uma capacitação final antes das provas", afirma ao destacar que o maior custo do vestibular da universidade é para o pagamento e capacitação dos profissionais envolvidos com a redação.

"Se fosse expandido o número de candidatos na Unicamp, que hoje é de cerca de 60 mil, não sei como seria corrigir umas 100 mil redações. Não teríamos como encontrar mão-de-obra qualificada para isso", completa o coordenador da Unicamp.

O MEC informou por meio de sua assessoria que a escolha e o treinamento dos corretores é de responsabilidade do consórcio contratado para aplicar as provas, formado pelo Cespe e Cesgranrio. No entanto, o consórcio diz que não está autorizado a falar sobre o Enem.

Nota na redação passa de 0 para 880

Na quarta-feira, o MEC confirmou que um estudante de São Paulo conseguiu na Justiça a revisão da nota da redação do Enem 2011, que passou de 0 para 880 pontos. Uma banca extraordinária composta pelo consórcio responsável pela aplicação foi acionada para analisar o texto, atribuindo a nova nota.

O órgão não comentou a diferença na pontuação do candidato após a decisão judicial, mas afirmou que o processo de correção das provas do Enem "funciona muito bem" a partir da avaliação de dois corretores e de mais um terceiro em caso de discordâncias. A assessoria do MEC ainda disse não acreditar que esse caso possa abrir precedência para outros candidatos que queiram que a nota seja revista.

Momentos de desconcentração foram registrados após o término do Enem em São Paulo
Momentos de desconcentração foram registrados após o término do Enem em São Paulo
Foto: Aloisio Mauricio / Terra
Fonte: Terra
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