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Assaltos violentos levam terror a alunos no campus da USP

Casos recentes de violência reacenderam debate sobre presença da PM na Cidade Universitária, por onde passam todo dia quase 100 mil pessoas

25 jun 2015 - 08h37
(atualizado em 29/6/2015 às 17h24)
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"Não me sinto seguro nas dependências da Cidade Universitária especialmente pela falta de policiamento efetivo aqui", diz o estudante de Engenharia Metalúrgica Felipe Marins
"Não me sinto seguro nas dependências da Cidade Universitária especialmente pela falta de policiamento efetivo aqui", diz o estudante de Engenharia Metalúrgica Felipe Marins
Foto: Janaina Garcia / Terra

Há uma semana, o estudante chileno Sérgio Ibarra, de 33 anos, pensou ter confundido o som de tiros de revólver com o de fogos de artifício até ser abordado por três rapazes, aparentemente menores de idade, que o derrubaram, bateram em seu rosto com a arma e levaram seus pertences. Em dois anos, foi o segundo assalto sofrido por Ibarra – que já havia tido uma bicicleta furtada.

Há pouco mais de um mês, a estudante Ariane Toledo, de 28 anos, seguia de bicicleta por um atalho, entre o trabalho e a residência, quanto três garotos a surpreenderam com empurrões e uma sequência de rasteiras que a deixaram cheia de hematomas e ferimentos. Abordados por seguranças e policiais, atiraram – mas acabaram detidos.

Terror no campus da USP: veja relatos de violência no campus:

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No final do ano passado, a estudante Maria Clara Sassaki, 29 anos, foi abordada por criminosos duas vezes: quando dois menores de idade tentaram levar a mochila dela, na primeira, e durante um arrastão no estacionamento, na segunda, quando a jovem e um amigo perderam os pertences que carregavam, não sem antes ele levar uma coronhada na cabeça. O carro ao lado, lembra Maria Clara, foi roubado com a vítima dentro – o que seria assalto virou, portanto, também um sequestro-relâmpago.

Ainda ano passado, o estudante Felipe Cardoso Marins, de 25 anos, de São Paulo, estava com a namorada e um amigo quando dois homens, de moto, abordaram o grupo com revólveres em punho.  A garota perdeu a bolsa; Marins ficou sem o celular e foi agredido na cabeça.

Além da violência, os quatro casos têm em comum também o local: todos foram cometidos dentro do campus da Universidade de São Paulo (USP), maior e mais conceituada instituição de ensino superior do País e a melhor expressão do setor nos rankings internacionais mais recentes. Em março passado, por exemplo, a instituição ficou entre as 100 melhores do mundo no ranking divulgado pela revista britânica Times Higher Education (THE). Este mês, no QS University Rankings Latin America, a USP ostentou no primeiro lugar entre 300 universidades latino-americanas.

A avaliação da comunidade acadêmica sobre a segurança na Cidade Universitária, no entanto, destoa, e bem, das qualidades de ensino e pesquisa que ranqueiam a USP com louvor para fora de suas fronteiras. É o que a reportagem do Terra constatou ao conversar com alunos que frequentam a Cidade Universitária todos os dias – em um universo de 100 mil pessoas, entre comunidade acadêmica e público externo, que passam pelo local, em média, de segunda a sexta-feira.

Os assaltos no campus voltaram a ser notícia semana passada depois que uma aluna do curso de Odontologia foi roubada e agredida a coronhadas enquanto esperava o ônibus na região do portão 3 – perto do qual está localizada também a favela São Remo e uma passarela de pedestres.

No mesmo dia em que a estudante de Odonto foi atacada, o mestrando Sérgio Ibarra seria assaltado próximo dali por três adolescentes que teriam atirado para dispersar, segundos antes, seguranças do campus.

Graduando de Farmácia-Bioquímica, Rodolfo Medeiros de Aquino, de 22 anos, contou ter presenciado tiroteio ocorrido em um acesso de pedestres na região do Portão 3, semana passada
Graduando de Farmácia-Bioquímica, Rodolfo Medeiros de Aquino, de 22 anos, contou ter presenciado tiroteio ocorrido em um acesso de pedestres na região do Portão 3, semana passada
Foto: Janaina Garcia / Terra

"Aqui é ao lado da favela São Remo", diz aluno de Farmácia e ex-PM

Graduando de Farmácia-Bioquímica, Rodolfo Medeiros de Aquino, de 22 anos, contou ter presenciado o tiroteio – ocorrido em um acesso de pedestres na região do Portão 3.

“Eu estava na biblioteca, descendo [para casa], quando vi três moleques vindo de bicicleta, um deles, de braços abertos. Aí veio uma viatura da PPUSP [Guarda Universitária], buzinando, e um dos moleques começou a atirar para o alto. Então os guardas foram e deixaram ele seguir – e me disseram que eles tinham feito um arrastão em um ponto de ônibus”, relatou Aquino. O que sentiu? “Dediquei quatro anos à Polícia Militar; para mim isso é comum, mas não é comum em uma universidade o acesso ser tão livre assim”, declarou o estudante, que se disse favorável à presença de mais PMs na Cidade Universitária. “A PPUSP não tem porte de arma, e isso causa insegurança. Tem muitos alunos que são contra a PM aqui; eu sou a favor. Porque só pelo fato de poderem ter porte de arma, é uma segurança a mais. E aqui do lado tem a favela São Remo, né”?

"Um bandido me agrediu com coronhada na cabeça", relata estudante da Poli

Estudante de Engenharia Metalúrgica na Escola Politécnica, Felipe Marins contou que foi assaltado há poucos meses quando ele e a namorada estavam no campus com um amigo. “Eram dois homens em uma moto. Levaram a bolsa da minha namorada, minha mochila, e um deles me agrediu com uma coronhada na cabeça”, disse. “Não me sinto seguro nas dependências da Cidade Universitária especialmente pela falta de policiamento efetivo aqui –a Poli já fez inclusive um plebiscito, do qual participaram mais de mil alunos, e a maioria se disse a favor de ter PM aqui”.

Aluna de Matemática, Ariane Toledo foi assaltada há pouco mais de um mês por adolescentes; agredida, ela ainda viu dois deles serem apreendidos
Aluna de Matemática, Ariane Toledo foi assaltada há pouco mais de um mês por adolescentes; agredida, ela ainda viu dois deles serem apreendidos
Foto: Arquivo pessoal / Divulgação

"Um dos assaltantes tinha 14 anos e era analfabeto", conta aluna de Matemática 

Aluna de Matemática, Ariane Toledo foi assaltada há pouco mais de um mês quando voltava do trabalho de bicicleta. Moradora do Butantã, região onde fica a Cidade Universitária, ela cortaria caminho pelo campus, mas acabou abordada por três garotos, dois deles, armados. “Eles pularam o muro da [favela] São Remo, armados; me empurraram e me derrubaram, um desceu até a portaria de pedestre da favela com a minha bicicleta, com mais alguns meninos que já esperavam do outro lado da avenida, enquanto os outros dois ameaçavam atirar e me chutavam. Tentaram roubar minha mochila, mas, perto dali, havia um vigilante da USP e dois PMs de moto que detiveram dois deles”, contou. “Quando fiz o Boletim de Ocorrência na delegacia, descobri que um deles tinha 14 anos e era analfabeto, e o outro, de 15 anos, tinha estudado até a 5ª série do ensino fundamental”, salientou.

"Vi um grupo de moleques assaltando todo mundo no estacionamento", fala aluna de Meteorologia

Graduanda de Meteorologia, Maria Clara Sassaki foi assaltada com um amigo durante um arrastão no estacionamento da Física, no final do ano passado. Ela havia acabado de sair de uma prova. “Quando cheguei, tinha um grupo de moleques de mais ou menos 15 assaltando todo mundo. Levaram um carro do lado do meu, com o motorista dentro, e bateram com arma na cabeça do meu amigo”, recordou. “Deveria haver mais PM no campus, nem que fosse para intimidar mais os bandidos. À época, fiquei uma semana sem ir para as aulas da noite, pensei em desistir, mas precisei enfrentar essa sensação de carência, de abandono que tomou conta da nossa segurança pata não parar a minha vida”, definiu,

O acesso de pedestres próximo ao portão 3 já foi palco de assaltos recentes no campus da USP
O acesso de pedestres próximo ao portão 3 já foi palco de assaltos recentes no campus da USP
Foto: Janaina Garcia / Terra

Alunos são contrários à presença de PM no campus

Entre os estudantes entrevistados, porém, há também aqueles que admitem a falta de segurança na Cidade Universitária, mas são contrários à presença de PMs no local.

“Não acho o campus um lugar seguro porque tem alguns pontos dele que ou são muito escuros, ou os ônibus demoram para passar, à noite. Nunca fui assaltada, tenho amigos na ECA (Escola de Comunicações e Artes) que já foram, mas não acho que a PM seja a solução para dentro do campus – ela acaba é aumentando a  violência. Talvez tivessem que estudar outras formas de policiamento de segurança dos alunos”, analisou a estudante de Relações Públicas Giovana Sales, de 20 anos. “Hoje o policiamento que existe é a do patrimônio, não das pessoas”, completou.

"Não acho que a PM seja a solução para dentro do campus. Talvez tivessem que estudar outras formas de policiamento de segurança dos alunos”, analisou a estudante de Relações Públicas Giovana Sales
Giovana Sales, de 20 anos.
"Não acho que a PM seja a solução para dentro do campus. Talvez tivessem que estudar outras formas de policiamento de segurança dos alunos”, analisou a estudante de Relações Públicas Giovana Sales Giovana Sales, de 20 anos.
Foto: Janaina Garcia / Terra

Calouro de Odontologia, Émerson Santiago, de 24 anos, também prefere que a questão da violência no campus seja resolvida sem a necessidade de policiamento militar.

“Não tem como desvincular o campus da realidade de São Paulo, que não é uma cidade segura, mas que não abandonaria nunca. Não tem como colocar vigia em todo lugar do campus, é complicado, não é um caso pontual, mas, talvez, como há uma favela do lado – e sem generalizar, é claro –, talvez os trabalhos sociais voltados para lá talvez melhorassem a nossa qualidade de vida aqui dentro”, opinou.

USP promete " modelo próprio de policiamento comunitário" com SSP

Em nota, a assessoria de imprensa da USP informou que a segurança nas áreas comuns da Cidade Universitária é feita hoje por 47 guardas universitários, “distribuídos em três turnos que cobrem as 24 horas do dia, sete dias por semana”. “Há ainda cerca de 600 postos de vigilantes terceirizados, distribuídos por todo o campus (interior e exterior das unidades) e há 2.400 vigias, especialmente no interior das unidades. A Polícia Militar faz rondas e acompanha as ocorrências. Também está adiantado o projeto de instalação do sistema de monitoramento eletrônico das áreas comuns (avenidas, bolsões de estacionamento, pontos de ônibus e acessos) e o sistema de iluminação está em fase final de implantação. Está em desenvolvimento, com a Secretaria Estadual de Segurança Pública, um modelo próprio de policiamento comunitário”, encerrou a nota.

PM promete números da criminalidade na USP, recua e diz que cometeu "equívoco"

Também via assessoria, a PM informou que realiza patrulhas no campus com um efeito de 20 policiais espalhados em duas equipes de radiopatrulha com duas motocicletas, duas viaturas, uma base comunitária móvel e um trailer.

Apesar dos relatos de violência, feitos pelos alunos, a corporação garante que “percebe-se atualmente uma redução dos índices [de criminalidade na Cidade Universitária], que teve como fonte de pesquisa a base de dados Infocrim em 16 de junho de 2015”.

A reportagem pediu os dados que atestassem eventual reversão de crimes à corporação, mas foi informada, na sequência, mas eles não seriam divulgados. A citação de tabela com eles, na primeira resposta ao pedido, teria sido “um equívoco”. No lugar deles, a assessoria encaminhou apenas que, entre janeiro e abril deste ano, 99 pessoas foram presas ou apreendidas (no caso de adolescentes), dez armas de fogo ilegais foram recolhidas, “aproximadamente 5,942 quilos de drogas” foram apreendidos, e 188 veículos furtados/roubados foram recuperados. Os números, porém, pertencem ao 16º BPMM (Batalhão de Polícia Militar Metropolitano/ 1ª Companhia), responsável pelo policiamento ostensivo “na região que inclui a USP” – e não apenas, portanto, na Cidade Universitária.

Alunos e professores da USP protestam contra terceirização:
Fonte: Terra
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