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Congresso americano erra o alvo sobre Benghazi, dizem especialistas

22 out 2015 - 10h20
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Diante de novo depoimento de Hillary Clinton sobre o atentado ao consulado dos EUA em Benghazi, democratas e republicanos estariam ignorando o cenário de instabilidade que levou à morte do embaixador americano na líbia.

Os democratas alegam que a investigação é um esforço partidário para prejudicar a candidatura de Hillary Clinton à Casa Branca. Os republicanos, por outro lado, dizem que querem apenas descobrir a verdade.

Em 11 de setembro de 2012, um atentado a um posto diplomático dos Estados Unidos em Benghazi, na Líbia, matou o embaixador americano Christopher Stevens. Antes do ataque, de autoria de militantes islâmicos, Stevens já havia solicitado segurança adicional, mas teve seus pedidos negados pelo Departamento de Estado, na época comandado por Hillary Clinton.

Sete investigações sobre os eventos em Benghazi foram realizadas, e nenhuma concluiu que funcionários do alto escalão do governo Obama tivessem sido negligentes ou tenham tentado encobrir os fatos.

Hillary Clinton depõe nesta quinta-feira (22/10) perante uma comissão especial da Câmara dos Representantes, que investiga, mais uma vez, o ataque em Benghazi. Segundo o analista Hafed al-Ghwell, tanto democratas quanto republicanos estão ignorando o cenário líbio de violência e instabilidade que levou à morte de Stevens.

Há quatro anos, Muammar Kadafi foi morto por forças rebeldes apoiadas pela Otan. Como no caso do Iraque, os americanos e seus aliados apoiaram a mudança de regime, mesmo sem nenhum plano para o que viria a seguir.

"Quando isso acontece, os EUA acabam criando um problema muito maior para si e para o mundo", diz o especialista em Líbia Al-Ghwell, do think tank Atlantic Council, em entrevista à DW. "Pois geralmente temos que voltar atrás e limpar tudo com muito mais vidas em jogo."

"Potências mundiais se retiraram"

A Líbia tem estado em constante turbulência desde a queda do regime Kadafi. Segundo adminitiu o próprio presidente dos EUA, Washington e seus aliadas da Otan calcularam mal.

"Mesmo quando ajudamos o povo líbio a colocar um fim no reinado de um tirano, nossa coalizão poderia – e deveria – ter feito mais para preencher o vácuo que foi deixado para trás", disse Obama na Assembleia Geral da ONU, em setembro.

Após ajudar as milícias rebeldes a derrubar Kadafi, com o fornecimento de apoio aéreo, a Otan passou a responsabilidade de reconstrução e estabilização do país para a ONU. A organização, no entanto, não tinha qualquer autoridade na Líbia.

"Eles não tinham uma ordem oficial", afirma o especialista em Líbia Barak Barfi, da New America Foundation. "Tinham apenas um papel de supervisão para prestar assessoria. Eles não podiam implementar nada. As potências mundiais se retiraram."

"Faltou engajamento"

A Líbia foi deixada para trás sem um governo funcional. As milícias que derrubaram o regime se recusaram a baixar as armas. Segundo Barfi, aqueles que cooperaram com Kadafi foram impedidos de assumir cargos públicos, privando o país dos conhecimentos técnicos necessários.

Em agosto de 2014, militantes islâmicos forçaram o governo internacionalmente reconhecido a fugir de Trípoli, no oeste, para Tobruk, no leste. Existem agora duas autoridades concorrentes na Líbia. As tentativas recentes da ONU – apoiados por Washington – de formar um governo de unidade nacional não tiveram sucesso.

"O engajamento não foi sério o suficiente a ponto de aproximar as partes e fazer com que elas resolvessem seus problemas", afirma Bari.

À beira de um colapso

As consequências têm sido catastróficas. De acordo com a ONU, dos 6 milhões de líbios, 2,4 milhões precisam de algum tipo de ajuda. Sob a ditatura de Kadafi, a Líbia não era livre, mas vivia em boas condições financeiras, por conta de suas grandes reservas de petróleo e de sua pequena população. Hoje, o país está à beira de um colapso econômico, enquanto milícias rivais brigam pelos campos de petróleo.

As fronteiras da Líbia estão sem controle. O país tem duas vezes o tamanho da França e cerca de 2 mil quilômetros de costa para o Mar Mediterrâneo. Militantes do Estado Islâmico (EI) ganharam espaço em meio ao caos. Refugiados estão cruzando o mar para chegar à Europa, e milhares deles têm morrido durante a viagem.

"Criamos um buraco político e desestabilizador", diz Al-Ghwell. "A Líbia é um país pequeno em termos de população, mas em termos de tamanho e localização se torna mais significante até que o Egito."

Justificativa questionada

A justificativa original para a campanha aérea da Otan em 2011 está sendo contestada. Na época secretária de Estado, Hillary Clinton advertiu que dezenas de milhares de civis poderiam ser massacrados se as forças de Kadafi fossem autorizadas a retomar Benghazi, segunda maior cidade da Líbia, considerada a "casa da revolta".

Segundo o jornal conservador Washington Times, a inteligência dos EUA não tinha informações que apontassem para um massacre iminente em Benghazi. O veículo americano revelou ainda que autoridades de Defesa receberam informações de que Kadafi havia ordenado suas forças a não disparar contra civis.

Em reportagem da revista liberal New Republic, as ONGs Human Rights Watch e International Crisis Group diziam ter dúvidas sobre um massacre iminente na cidade, embora as forças de Kadafi tenham matado manifestantes desarmados durante a revolta.

No debate presidencial democrata, Clinton defendeu sua posição em relação à Líbia, chamando a intervenção de "o poder mais inteligente possível". Segundo Barfi, a atual opinião da candidata sobre o país está de acordo com a passada, a de intervenção militar.

"Ela é uma intervencionista", opina Barfi. "Clinton apoiou a invasão do Iraque, a zona de exclusão aérea na Líbia, e o armamento dos rebeldes sírios antecipadamente. Ela apoia uma política externa muito musculosa. É nisso que ela acredita."

Deutsche Welle A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
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