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Temacapulín, o povoado mexicano que se nega a desaparecer sob a água

24 jul 2014 - 06h11
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Os 480 habitantes do povoado mexicano Temacapulín lutam há anos para evitar que o projeto da represa de El Zapotillo leve suas casas, os deixem sem trabalho e violem seus direitos humanos.

"Nós não nos movimentaremos daqui. Se a água chegar, sabemos nadar. Nossa postura é essa: jamais venderemos e não queremos nos mudar, aconteça o que acontecer", disse à Agência Efe Francisca Carvajal, uma das moradores deste povoado localizado no estado de Jalisco.

Sua ferrenha postura e a de quase todos os que vivem em Temacapulín contrasta com a tranquilidade que prevalece neste lugar de apenas 15 quadras, situado a 100 quilômetros de Guadalajara, a capital de Jalisco.

O mal-estar no povoado começou há nove anos, quando as pessoas se inteiraram que a Comissão Nacional de Água (Conagua) e as empresas La Peninsular Compañía Constructora, FCC Constructores e Grupo Hermes construiriam este projeto hidráulico a 30 quilômetros rio acima da comunidade.

A represa já é construída sobre o rio Verde, perto de Temacapulín, a fim de levar água até a zona árida dos Altos de Jalisco e Guadalajara, assim como a León, capital do estado central de Guanajuato, com o objetivo de beneficiar 2,4 milhões de pessoas.

De acordo com a Conagua, para armazenar 911 milhões de metros cúbicos de água é necessário levantar uma cortina de 105 metros de altura para um reservatório que inundará cerca de 4.816 hectares.

Isso provocará o desaparecimento dos pequenos povoados de Acasico, Palmarejo e Temacapulín, este último com 200 anos e cuja igreja é uma joia arquitetônica da região.

A Conagua negociou com os habitantes a compra de suas casas e sua realocação em um complexo de 32 casas em Talicoyunque, um terreno próximo ao povoado.

Os habitantes de Acasico e Palmarejo aceitaram a oferta, mas os de Temacapulín se negam porque as novas casas são menores que as suas e carecem de serviços básicos.

Além disso, teriam que encontrar trabalho, pois o novo local não reúne as condições para se dedicar à apicultura e à pecuária.

"A única coisa que pedem os habitantes é que o projeto original seja respeitado", uma cortina de "80 metros e dois diques para a proteção de Temacapulín", disse a diretora do Instituto Mexicano para o Desenvolvimento Comunitário, María González, que assessora a comunidade.

As mulheres e o padre do povoado Gabriel Espinoza lideram o movimento "Salvemos Temaca", que tenta evitar que sejam despejados de suas propriedades e suas terras de cultivo, mas até agora só encontraram o silêncio das autoridades.

"Estão realizando uma obra contra a lei. Vamos encontrar os caminhos para que a nossa vida, nossos direitos humanos, nossa terra e nossas decisões sejam respeitadas. Não vamos nos render", declarou à Agência Efe o sacerdote.

A Comissão Estatal de Direitos Humanos recomendou em 2009 ao governo de Jalisco deter a obra até garantir o cumprimento dos direitos dos habitantes e realizar estudos para projetos hidráulicos alternativos. No entanto, as autoridades a ignoraram.

A luta chegou aos tribunais em 2012, com uma controvérsia constitucional promovida pelos deputados de Jalisco. Um ano depois o Supremo invalidou um acordo assinado em 2007 para aumentar a altura da cortina de 80 a 105 metros e ordenou manter o projeto original de 2005.

"Salvemos Temaca" interpôs três ações. Em duas delas, um juiz ordenou a suspensão provisória de El Zapotillo e na terceira, em 9 de julho, determinou a suspensão definitiva.

Isso obriga que a construção seja suspensa até assegurar que não ultrapassou os 80 metros e evitar que Temacapulín seja inundado, disse à Agência Efe Guadalupe Espinoza, advogado da organização.

No entanto, a construção da represa continua, como constatou a Efe em um percurso pela área, que é protegida por policiais federais.

No início de junho um grupo de habitantes chegou até o lugar para verificar o cumprimento do mandato de um alto tribunal, mas sua entrada não foi permitida.

A Agência Efe tentou sem sucesso entrevistar funcionários da Comissão Estatal de Água de Jalisco e da Conagua, assim como representantes das construtoras, que aparecem como terceiros envolvidos nas ações interpostas.

O diretor de Conagua, David Korenfeld, assegura que a cortina da represa está abaixo de 80 metros e insiste na necessidade de atenuar a escassez de água e "construir esta plataforma, que garanta a sustentabilidade da maioria" dos habitantes.

Enquanto isso, o governador de Jalisco, Aristóteles Sandoval, assinala que, enquanto existir uma ordem de suspensão do tribunal, não permitirá que a represa ultrapasse de 80 metros.

No entanto, os habitantes tramitam uma permissão para entrar na represa a fim de verificar que a cortina não tenha ultrapassado os 80 metros.

Se for assim, Patricia Campos, advogada da organização, não descarta comparecer à Comissão Interamericana de Direitos Humanos para expor o caso.

EFE   
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