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Rio: próxima a local de Olimpíada, lagoa sofre com esgoto

27 dez 2012 - 15h13
(atualizado às 17h34)
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Localizada a poucos passos do mar e das futuras instalações olímpicas da Rio-2016, a bela Lagoa de Marapendi teve mais uma vez colocada em questão a qualidade de suas águas em um episódio recente: no início deste mês de altas temperaturas, 4 t de peixes apareceram mortos no local.

Em visita à lagoa, o biólogo Mario Moscatelli explicou à AFP que a causa das mortes foi a contaminação pelo lançamento de esgoto associada aos 40ºC típicos do verão. "O sistema de lagoas da baixada de Jacarepaguá (da qual faz parte a Lagoa de Marapendi, na zona oeste do Rio de Janeiro) foi transformado numa latrina há 40, 50 anos", explicou ele. "Aqui você tem um patrimônio ambiental e econômico inutilizado devido ao esgoto."

O biólogo atenta para o fato de que as águas de cheiro nauseante foram transformadas em latrina não por favelas, que costumam sofrer com a falta de saneamento, mas pelos ricos condomínios vizinhos do ecossistema, localizado em meio a edifícios da Barra da Tijuca. "O esgoto lançado na Lagoa de Marapendi vem de condomínios e loteamentos, sobretudo de classes média e alta, que não tratam completamente seu esgoto antes de lançar a água na lagoa", explicou Moscatelli.

"Eu vivi até 1985 da pesca na lagoa. Tinha muito robalo, camarão, corvina, pescada... Naquela época não havia muita pescaria em mar aberto porque a lagoa supria. Fomos para o mar aberto quando começou a dar problema porque vieram os grandes condomínios", relatou Sérgio Borel, 59 anos, pescador há 40 deles.

"Meu ganha-pão está na água. Quando falta oxigênio, morre peixe em tudo que é lado. Com isso, não consigo desenvolver nenhum tipo de projeto que viabilize a sustentabilidade da lagoa porque ninguém quer ficar passeando em cima de esgoto, com cheiro de peixe morto", indignou-se Ricardo Herdy, dono da empresa Ecobalsas, que faz o transporte dos moradores da região.

Herdy disse ter pensado em desistir do negócio, que inclui projetos sustentáveis como passeios educativos e ambientais, além de aulas de esportes aquáticos, devido à contaminação e à dificuldade da navegação na lagoa, cuja profundidade, que chegou a 12 m hoje, em alguns pontos não passa de alguns centímetros.

Ligações clandestinas

Segundo a Companhia Estadual de Águas e Esgoto (Cedae), o esgoto chega à lagoa por ligações clandestinas, pois até 2007, quando não havia rede oficial de coleta e tratamento na região, os condomínios tratavam seus dejetos em estações próprias. Atualmente, embora um decreto estadual obrigue os moradores a se ligar à rede existente, que abrange 60% dos imóveis da baixada de Jacarepaguá, muitos resistiriam a se conectar, mesmo estando sujeitos a sanções judiciais.

"Onde a rede está completa há a exigência do Inea (Instituto Estadual do Ambiente) para que os condomínios se liguem, mas existe, sim, uma resistência para se ligar à rede porque os condomínios precisam fazer obras de adequação, o que representa um custo", admitiu Marilene Ramos, presidente do instituto, encarregado de ações ambientais no Estado. "Quando o condomínio não se liga, a Cedae informa ao Inea, a quem cabe aplicar multas e inclusive medidas como a 'rolha ecológica' (tamponamento das saídas irregulares de esgoto), bem como mover ações por crime ambiental, nas quais o síndico pode ser responsabilizado", explicou ela.

A consequência dos lançamentos clandestinos é o assoreamento da Lagoa, que prejudica a navegação, e a baixa oxigenação da água, que mata os peixes e afeta outros animais que vivem na região, como aves, a capivara e o jacaré-de-papo-amarelo - este que, apesar de dar nome à baixada de Jacarepaguá (que significa 'lagoa rasa dos jacarés' em tupi-guarani), está sendo expulso pela poluição.

Os governos municipal, estadual e federal assumiram o compromisso de recuperar o complexo lagunar de Jacarepaguá, que se estende por 13 km e é composto pelas lagoas da Tijuca, Jacarepaguá, Camorim e Marapendi, além dos canais da Joatinga e de Marapendi, como parte dos encargos para a cidade do Rio sediar os Jogos de 2016. As obras preveem, entre outras intervenções, a dragagem de sedimentos poluídos no fundo das lagoas em um volume que daria para encher sete estádios do Maracanã, além da construção de quatro unidades de tratamento (UTRs) em rios da região.

A dragagem, a cargo do governo do Estado, é estimada em R$ 600 milhões, e as obras têm previsão para começar em fevereiro de 2013, com duração de 24 meses. A construção das UTRs, de responsabilidade da prefeitura, está avaliada em cerca de R$ 140 milhões com conclusão prevista para 2016, mas as obras não têm data para começar porque o projeto está em fase de captação de recursos.

"Não tenho dúvida de que (a situação na Lagoa de Marapendi) tem jeito. Não recuperam porque não querem", afirmou Moscatelli, destacando que em três anos é possível recuperar o local, porque há tecnologia, dinheiro e vontade política com a proximidade dos Jogos Olímpicos. "Eu tenho fé que essas lagoas vão ser despoluídas. Ainda vou voltar a pegar meus camarões na lagoa", disse, esperançoso, o pescador Sérgio Borel.

AFP Todos os direitos de reprodução e representação reservados. 
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