PUBLICIDADE

Pais da "partícula de Deus" alertam para cortes para ciência

27 nov 2012 - 14h12
(atualizado às 14h52)
Compartilhar

O físico teórico britânico Peter Higgs e o belga François Englert - que formularam a existência de uma partícula subatômica na origem da massa de outras partículas, finalmente confirmada este ano e apelidada de "partícula de Deus" - alertaram nesta terça-feira sobre o risco de cortar o orçamento para pesquisa por causa da crise.

O CERN qualificou como um avanço "histórico" a descoberta de uma nova partícula consistente com o Bosón de Higgs, chave para entender a formação do Universo, mas alertou que ainda resta muito trabalho a ser feito
O CERN qualificou como um avanço "histórico" a descoberta de uma nova partícula consistente com o Bosón de Higgs, chave para entender a formação do Universo, mas alertou que ainda resta muito trabalho a ser feito
Foto: AFP

"Não se desenvolve uma sociedade sem ter as bases fundamentais para conhecer a estrutura subjacente da ciência", disse em entrevista à agência Efe Englert (Bruxelas, 1932), que hoje participou junto a Higgs (Newcastle, 1929) de uma conferência organizada no Parlamento Europeu (órgão legislativo da União Europeia) pelo painel que assessora os eurodeputados em assuntos científicos, o STOA.

"Se não se tem nenhum conhecimento sobre pesquisa fundamental, destrói-se o pensamento criativo e, sem isso, no final simplesmente se copiam coisas que outros fizeram, mas não se fará nada de novo", disse o físico belga.

Englert de um lado, junto ao físico belga Robert Brout - já falecido -, e Higgs, por outro, predisseram em 1964 ao mesmo tempo e de maneira independente a existência do que se popularizou como "Bóson de Higgs", a partícula com a qual interagem outras partículas que faz com que, nesse mecanismo, "adquiram" uma massa determinada.

Quase 50 anos depois, o Centro Europeu de Pesquisa Nuclear (CERN) anunciou em julho passado a confirmação experimental de que o bóson existe. Higgs, que assegurou à Efe sentir-se "surpreendido" pela "grande" reação pública que a descoberta gerou, reconheceu o "sucesso" dos responsáveis do CERN encarregados de divulgar a notícia.

"O que me preocupa é que, se há muita concentração nesta descoberta particular, existe o perigo de que talvez o público não se dê conta de para quantas outras coisas foi construído o Grande Colisor de Hádrons (LHC, na sigla em inglês)", onde o experimento do CERN foi realizado.

"Sempre é um risco quando há dificuldades financeiras, como é atualmente o caso. Algumas pessoas dirão, bom, estas partículas foram descobertas, por que estão usando esta máquina tão cara, por que não a fecham?", afirmou Higgs.

Englert considerou que os cortes em ciência poderiam representar "uma catástrofe" que poderia levar à "desintegração não só da Europa, mas também de todos os países desenvolvidos", enquanto Higgs prevê uma diminuição dos resultados.

"É perigoso cortar o orçamento em ciência de modo a reduzir a provisão de cientistas formados que trabalham em projetos que possam ter um impacto econômico maior, e ajudam a sair da crise econômica", assinalou Higgs.

Os dois cientistas destacaram as dificuldades pelas quais a Espanha passa, e Englert insistiu que "não se deve tomar medidas irreversíveis que façam com que não se produza nunca uma recuperação. É preciso ser extremamente cuidadoso".

"Os políticos costumam pensar nos progressos imediatos que podem ser feitos. Isso é inevitável em tempos de crise, como está acontecendo na Espanha", opinou.

Higgs avaliou os esforços para criar o LHC, já que, quando formulou sua teoria, "não estava claro" que ao longo de sua vida pudesse conhecer uma máquina suficientemente potente para provar a existência do bóson.

"Foi bom estar vivo quando a descoberta foi feita", brincou Higgs, que se declarou "satisfeito". "A descoberta é essencialmente o final da verificação do modelo padrão da física de partículas", explicou, mas ao mesmo tempo afirmando que abre um caminho para teorias que "vão além", como a da supersimetria, que poderiam ajudar a entender outros "enigmas" da composição do Universo, como a desconhecida matéria escura, que forma mais de 90% do cosmos.

Perguntado por uma aplicação real e imediata da descoberta, Englert assegurou que definitivamente "ela não pode ser utilizada para desenvolver um novo tipo de pasta de dentes".

"O desenvolvimento da pesquisa fundamental, após tudo, nos deu todas as coisas que nos rodeiam, elas são consequência da pesquisa fundamental, mas não ocorreram de um dia para outro, é preciso tempo", disse Englert, e deu como exemplo a descoberta da eletricidade e da mecânica quântica.

"Mais importante em essência que esta aplicação, é mostrar a importância de expandir o conhecimento, ter um olhar racional das coisas", concluiu o físico.

EFE   
Compartilhar
Publicidade