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Brasil está equivocado quanto à essência da Rio+20, diz sociólogo

Rio+20: expectativas se misturam a quatro meses do evento

19 fev 2012 - 10h58
(atualizado às 13h43)
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Eloisa Loose

Entre 20 e 22 de junho ocorre na cidade do Rio de Janeiro a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, mais conhecida como Rio+20. A quatro meses do evento, as expectativas em relação aos avanços na questão do desenvolvimento sustentável se misturam. De acordo com o sociólogo e cientista político Sérgio Abranches, há um sentimento misto de otimismo e desesperança, pois apesar do Brasil ter forte influência nas decisões por estar hospedando o encontro, a postura do governo brasileiro coloca a Rio+20 como uma conferência sobre desenvolvimento - em todas as suas dimensões -, mas não como um encontro ambiental.

Expectativas se misturam a quatro meses da Rio 20
Expectativas se misturam a quatro meses da Rio 20
Foto: ONU / Divulgação

Segundo Abranches, o raciocínio do governo está "equivocado". A essência da conferência é ambiental, e foi porque o Brasil estava consciente deste foco que, em 1992, a Eco-92 resultou em documentos importantes, como as convenções da Biodiversidade, Desertificação e das Mudanças climáticas, a Declaração sobre Ambiente e Desenvolvimento e a Agenda 21 (base para que cada país elabore seu plano de preservação do meio ambiente).

Já Aron Belinky, coordenador de processos internacionais do Instituto Vitae Civilis, acredita que não se devem fazer comparações com o evento de 20 anos atrás, pois ocorreram mudanças profundas na nossa sociedade desde então, e que devemos acreditar no potencial de mobilização das pessoas. "Tivemos mudanças profundas na organização da sociedade - em alguns casos, negativas (como no maior ceticismo do sistema multilateral e dos governos) e em outras positivas (como a maior conectividade que viabiliza mobilizações massivas como os movimentos de ocupação e Primavera Árabe). Temos certeza que na Rio+20 essa nova energia da sociedade irá se fazer presente com grande relevância", afirmou.

Independentemente do que irá ocorrer em junho, uma coisa é certa: ela não deve ser vista como um novo marco nas discussões ambientais - como foi a Eco-92. O cientista político diz que perspectivas neste sentido podem ser frustradas, já que não há indícios, nem movimentos de que haverá uma resposta pontual, e que muitos chefes de Estado ainda não confiramaram presença. "É preciso aguardar os próximos desdobramentos. Vai ser bom se houver surpresas", opina.

Rio+20 já está dividida

Antes mesmo da reunião oficial, manifestações de chefes de Estado e eventos preparatórios mostram que há uma divisão. O Brasil lidera um grupo de países que defende a separação radical da agenda climática na Rio+20. Além disso, como aconteceu nas reuniões das COPs (conferências do clima), os países em desenvolvimento acreditam que os desenvolvidos querem cercear seu crescimento, defendendo metas diferentes.

Apesar de ter um papel importante nas decisões, os países já demonstraram descontentamento com o Brasil ao acessar o "rascunho zero", esboço do texto que vai pautar as discussões da conferência em junho. O documento foi divulgado no começo de janeiro e foi considerado sem foco, incompleto e genérico por chefes de Estado e organizações não governamentais. Esta é uma das razões para que alguns achem que o encontro será mais de "falação" do que de tomadas de decisão, explicou Abranches.

O discurso da ministra de Meio Ambiente Izabella Teixeira, no qual o nosso País "teria todas as condições de liderar uma mudança, em nível mundial, para economias mais verdes", também incomoda por ser algo longe da realidade. Sérgio Abranches diz que o Brasil não pode ser considerado líder de uma mudança ambiental antes de modificar seus aspectos ambientais. Ele diz que embora os números do desmatamento tenham diminuído, o Pantanal continua ameaçado, e a questão de transportes está longe de ser sustentável.

O sociólogo, que tem experiência em reuniões políticas deste tipo, diz que muitas versões deste rascunho ainda serão elaboradas até o documento oficial e que pode ser que aconteça algo positivo. "Ainda há espaço para novidades porque isso é um jogo político de pressão", lembra.

Papel do evento

A conferência Rio+20 busca assegurar um comprometimento político para o desenvolvimento sustentável. Como uma reunião política, quer ampliar o debate sobre rumos atuais de nossa civilização, tendo como objetivo a construção de uma sociedade socialmente justa, economicamente próspera e ambientalmente sustentável. Seu resultado será um documento cuja força está no compromisso assumido conjuntamente pelos países e na abrangência e coerência da agenda colocada pelos objetivos e temas da conferência. O resultado, entretanto, não detalha aspectos técnicos de justificativa e de implementação, e nem implica o cumprimento obrigatório por aqueles que o assinam.

Mesmo assim, espera-se que o documento reafirme os compromissos e princípios já acordados nas várias negociações empreendidas pela ONU relacionadas ao desenvolvimento sustentável, e que apresente um roteiro para a transição rumo a um novo modelo econômico que leve a uma sociedade mais justa e sustentável, devidamente direcionado e controlado por um quadro institucional (instrumentos de governança) compatível com os compromissos e desafios assumidos.

Belinky explica que um dos ganhos do encontro será a maior visibilidade que a temática ganhará em todos os âmbitos da sociedade. "Essa questão subirá na agenda por conta da Rio+20 numa perspectiva positiva, uma vez que o que está sendo enfatizado não é apenas o lado ambiental mas também sua relação inseparável com aspectos sociais e ambientais", destaca.

O coordenador do Instituto Vitae Civilis afirma ainda que o que podemos esperar são "indicações fortes sobre medidas a serem implementadas tanto pela ONU quanto por países e outros atores". Dentre estas recomendações ele cita as metas do desenvolvimento sustentável, a criação do desenvolvimento além do PIB, e as reformas no sistema de governança ambiental da ONU.

Fonte: Terra
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