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Documento base da Rio+20 precisa levar em conta limites do planeta

Documento base da RIO+20 precisa levar em conta limites do planeta

13 fev 2012 - 14h46
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Em janeiro, a Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou o primeiro esboço da declaração final da Conferência sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), que será realizada no Brasil em junho. O documento, no entanto, deveria destacar de forma mais clara e objetiva o princípio de que há um limite natural para o planeta - um conceito central para o desenvolvimento sustentável. A opinião é de Carlos Alfredo Joly, titular do Departamento de Políticas e Programas Temáticos (DEPPT), da Secretaria de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento (Seped) do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e coordenador do programa Biota-Fapesp. As informações são da Agência Fapesp.

"O principal problema com o documento é o fato de não partir do princípio de que há um limite natural para o planeta, e que inevitavelmente teremos que nos adaptar à sua capacidade de suporte. Este é um conceito chave do desenvolvimento sustentável, que não está posto de forma clara e objetiva em parte alguma do documento. Partir desse princípio pode ser a única chance para que a Rio+20 alcance objetivos palpáveis", disse Joly à Agência Fapesp.

Outras autoridades e especialistas ambientais também criticaram o documento. O ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, contou à Folha de S. Paulo, em reportagem publicada em 8 de fevereiro, que os membros da comissão nacional que discute a Rio+20 pediram maior detalhamento dos objetivos de desenvolvimento sustentável no texto do esboço, além da inclusão de menção a padrões insustentáveis de produção e consumo.

Produzido por uma comissão da ONU envolvendo estados membros, agências internacionais, organizações não governamentais e grupos políticos, o documento, intitulado Zero Draft ("Esboço Zero"), também foi criticado publicamente por autoridades ambientais da Europa, mas em sentido oposto: elas atribuem "falta de foco" ao texto, já que ele estabelece como prioridades da conferência temas como economia verde e desenvolvimento sustentável.

Segundo os europeus, a conferência deveria ter mais foco na questão ambiental propriamente dita e na reorganização institucional dos órgãos internacionais voltados ao tema. A ministra francesa do Meio Ambiente, Nathalie Morizet, disse ao jornal O Estado de S. Paulo, em reportagem publicada no dia 1º de fevereiro, que "quanto mais falamos sobre crescimento verde e menos sobre governança, mais estamos perdendo o foco". Jean Jouzel, vice-presidente do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), também afirmou que a Rio+20 precisa ser "mais conclusiva e menos filosófica".

A divergência de pontos de vista, segundo Joly, confere ainda mais importância ao evento que será realizado conjuntamente pelo Biota, pelo Programa Fapesp de Pesquisa em Bioenergia e pelo Programa Fapesp de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais nos dias 6 e 7 de março. Segundo Joly, a conferência foi planejada para que a comunidade científica possa discutir os temas da Rio+20.

No dia 8 de março, a comissão brasileira que discute as sugestões para o documento final da Rio+20 se reunirá novamente. As sugestões da reunião serão compiladas pela secretaria executiva brasileira, que condensará um novo texto para encaminhar à ONU.

"O workshop trará algumas lideranças internacionais centrais para esse processo de discussão e será uma grande oportunidade para avançar. De agora em diante, as delegações vão trabalhar no Zero Draft até a 3ª Conferência Preparatória da Rio+20, que será realizada entre 13 e 15 de junho no Rio de Janeiro. Uma vez que se chegue a um acordo, o documento será aprovado pelos chefes de Estado na conferência, de 20 a 22 de junho", disse Joly.

Capacidade de suporte

De acordo com Joly, que é professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o tema da capacidade de suporte da Terra, longe de ser uma "discussão puramente filosófica", é justamente a maior promessa de resultados concretos para a conferência. Se os chefes de estado reunidos no Rio de Janeiro em junho de 2012 aprovarem o princípio dos limites na capacidade de suporte da Terra, segundo Joly, isso levará a uma mudança de paradigmas que definirá uma nova trajetória para o planeta.

"Concretamente, esse me parece o único objetivo palpável que a Rio+20 poderá alcançar. Sem o reconhecimento desses novos conceitos, como economia verde, a criação de novas estruturas, assim como a reorganização institucional da área ambiental das Nações Unidas, na melhor das hipóteses, apenas retardarão o colapso ambiental", afirmou.

Segundo ele, o Zero Draft deveria ter já em seu preâmbulo do documento, cujos tópicos descrevem o cenário no qual ocorre o debate, uma menção clara ao limite natural da capacidade de suporte do planeta. "Trata-se de uma questão extremamente concreta. Se esse princípio constar na introdução do documento, a discussão já se desenvolverá com um sentido completamente diferente. Se todos os países endossarem a posição de que temos um limite de esgotamento do planeta, as convenções terão que trabalhar necessariamente nessa base. Isso determinará a agenda de como vamos modificar nossos padrões de destruição dos habitats, da biodiversidade, dos serviços ecológicos, de emissão de gases de efeito estufa e assim por diante", explicou.

Apesar das limitações, o Zero Draft também tem pontos positivos, na avaliação de Joly, que elogiou o documento por fazer significativas referências ao avanço científico e tecnológico na promoção do desenvolvimento sustentável. "O texto reafirma a importância da transferência de tecnologia para que todos os países possam avançar mais rapidamente nessa direção. Reforça também a necessidade da colaboração científica entre países, sem perder o foco nas soluções e inovações locais", disse.

Outro aspecto positivo é que o esboço aponta para a necessidade de ampliação do relacionamento entre a comunidade científica e os formuladores de políticas e tomadores de decisão. "Ele reconhece que as decisões governamentais na área ambiental devem, cada vez mais, basear-se no resultado de pesquisas científicas", afirmou. A participação da comunidade científica será determinante para o aprimoramento do documento, que será objeto de intenso debate nos próximos meses.

Segundo Joly, para ser endossado por mais de 190 países, o documento final terá que conciliar posições amplamente divergentes. Mas discutir a questão de governança e a reformulação dos órgãos da ONU será tão importante como priorizar os temas do desenvolvimento sustentável e da economia verde.

"Por enquanto, o texto está muito parecido com o do documento final da Rio+10, realizada na África do Sul em 2002, que teve impacto muito baixo fora dos meios diplomáticos e frustrou as expectativas de todos. Na Rio+20 não teremos a assinatura de nenhuma nova convenção, portanto o mínimo que precisamos fazer é propor uma agenda muito clara. É isso que vamos discutir intensamente no workshop da Fapesp, em março", destacou.

Fonte: Terra
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