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Segundo médicos, Hawking viveria poucos anos; hoje ele faz 70

8 jan 2012 - 09h28
(atualizado em 10/1/2012 às 15h03)
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Aos 17 anos, então na Universidade de Oxford, Stephen Hawking começou pela primeira vez a se interessar por esportes e se aventurou no remo. Após três anos, ele começou a se sentir mais "atrapalhado" e caía facilmente - aparentemente sem razão. Aos 21 anos, quando já era pesquisador na Universidade de Cambridge, seu pai decidiu leva-lo ao médico da família, que, por sua vez, o encaminhou a um especialista. Hawking passou por exames em um hospital e os médicos disseram que seu caso era incomum, sem cura e que tenderia a piorar com o tempo. Era a esclerose lateral amiotrófica (ELA), doença que tirou ao longo dos anos seus movimentos.

Hawking experimenta a sensação de gravidade zero durante voo da Nasa, em 2007
Hawking experimenta a sensação de gravidade zero durante voo da Nasa, em 2007
Foto: AP

O físico ganhou prestígio no mundo acadêmico devido a suas pesquisas sobre o Big Bang (que deram suporte à teoria) e, principalmente, suas teorias sobre os buracos negros - que explicam entre outras coisas, como esses fenômenos emitem radiação (chamada hoje de radiação Hawking). Ao grande público, Hawking apareceu a partir de livros que explicam as principais teorias físicas e participações em séries de TV. Neste domingo, ele completa 70 anos de idade.

Ao receber o diagnóstico da doença, Hawking ouviu dos médicos que ele teria apenas dois anos de vida pela frente. O físico disse que foi um choque. Ele não teria tempo sequer de terminar sua pesquisa de doutorado. O máximo que poderia fazer para combater a doença era tomar algumas vitaminas.

Em seu site pessoal, Hawking relata o que pensava na época: "Como pôde isso acontecer comigo? Como eu posso terminar assim?". Mas foi ainda no hospital que ele mudou. "No entanto, enquanto eu estava no hospital, eu tinha visto um menino que eu conhecia vagamente morrer de leucemia, na cama ao lado da minha. Não foi uma boa visão. Claramente, havia pessoas que estavam em situação pior do que a minha. Pelo menos, a minha condição não me fazia sentir doente. Sempre que me sinto inclinado a sentir pena de mim mesmo, eu me lembro daquele menino", diz.Hawking diz que sua vida antes da doença era muito chata. Mas depois que foi diagnosticado, decidiu fazer algo bom antes de morrer. "Mas eu não morri. Na verdade, apesar de haver uma nuvem escondendo o meu futuro, eu descobri, para a minha surpresa, que eu estava gostando da vida mais do que antes. Eu fazia progresso na minha pesquisa, e eu fiquei noivo de uma garota chamada Jane Wilde". Hawking se separou e casou novamente. Ele tem três filhos e três netos.

A doença

A esclerose lateral amiotrófica (ELA) se origina de uma predisposição genética, como Parkinson ou Alzheimer, e afeta a medula espinhal - o resultado é a falta de força. "É um problema que afeta os movimentos, a força. E os músculos começam a atrofiar, inclusive os músculos que precisamos para respirar (...) chega um momento que o pulmão não inspira mais, e é necessária respiração artificial", diz Pedro Schestatsky, neurologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, professor da pós-graduação de medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e pesquisador de distúrbios do movimento. Os pacientes, afirma o professor, morrem por insuficiência respiratória. O mal é incurável.

"É cada vez mais comum (pacientes que sobrevivem mais tempo à doença) porque houve muito desenvolvimento de aparatos respiratórios. Houve desenvolvimento também de medicamentos que retardam a doença. Mas (quando Hawking foi diagnosticado) não havia remédio e não tinha a respiração (mecânica)", diz Schestatsky.

No caso de Hawking, afirma o professor, surpreende ainda o fato de ele ter desenvolvido a doença muito jovem, com 21 anos - a maior parte dos pacientes apresenta sintomas após os 50 anos. O médico afirma que o britânico tinha uma ELA de lenta evolução, o que o ajudou a sobreviver.

Enfrentando a doença

O físico diz que até 1974 ele conseguiu se alimentar e sair da cama sozinho, mas a coisa começou a piorar. Em 1985, ele sofreu com uma pneumonia que o levou a uma traqueostomia e à perda da fala. Sua condição piorou e começou a receber ajuda de enfermeiras 24 horas por dia, graças ao apoio de fundações que conheciam seu caso.

Hawking conta que antes da operação sua fala estava ficando pior e somente as pessoas mais próximas ainda conseguiam entendê-lo. Ele produzia artigos ditando para sua secretária e proferia palestras com a ajuda de um "tradutor" que repetia suas palavras mais claramente.

Uma nova voz

Foi um especialista em computadores da Califórnia, Walt Woltosz, quem levou a solução ao britânico. Woltosz enviou à Inglaterra um programa de computador que ele havia criado. O software sintetiza voz a partir de palavras selecionadas em uma tela, simplesmente piscando o olho. David Mason, de Cambridge, adaptou o sistema a um computador portátil acoplado à cadeira de rodas de Hawking.

O pesquisador diz que a mudança o permitiu falar melhor do que antes da operação. "Eu posso controlar até 15 palavras por minuto. Eu posso falar o que escrevi, ou salvar em disco. Posso, então, imprimir, ou usar o que ficou para trás e falá-lo (o texto) frase por frase. Usando este sistema, eu escrevi um livro e dezenas de artigos científicos. Eu também tenho dado muitas palestras científicas e populares. Todas elas foram bem recebidas."

Fama

Hawking recebeu prêmios e medalhas durante toda a carreira, que começou com defesas da teoria do Big Bang e continuou com estudos sobre os buracos negros. Entre 1979 e 2009, ocupou a cadeira lucasiana - que já foi de Isaac Newton e de Paul Dirac - de Cambridge (a tradição de Cambridge manda que o ocupante deixe esse posto antes dos 67 anos). Ele continua ativo nas pesquisas no Departamento de Matemática Aplicada e Física Teórica e é diretor de pesquisa do Centro de Cosmologia Teórica, criado pelo próprio Hawking.

Em 1988, Hawking lançou seu primeiro livro para o público em geral, em parceiro com o pesquisador do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) Leonard Mlodinow: Uma breve história do tempo. O sucesso foi enorme e levou a uma série de livros populares escritos por Hawking, alguns em parceria com Mlodinow.

Hoje, Hawking certamente é o cientista mais famoso do planeta. Um documentário do Channel 4 mostra pilhas de cartas que ele recebe de fãs, muitas com teorias que vão de viagens no tempo a invasões alienígenas. Em um programa da também britânica BBC, o teórico é chamado de personalidade global. "Ele é uma das pessoas mais famosas do planeta. Talvez o único verdadeiro cientista celebridade", diz a TV, enquanto mostra ruas cheias durante uma passagem do físico em uma universidade espanhola.

Hawking se tornou tão pop que apareceu em seriados de TV - como Os Simpsons e Star Trek: The Next Generation (Jornada nas Estrelas: A Nova Geração, no Brasil).

"Ele é um especialista que sabe comunicar, uma coisa que outros especialistas não conseguem ou não se interessam - em saber comunicar. Mesmo que não seja algo deliberado", diz Lígia Campos de Cerqueira Lana, pesquisadora de doutorado sanduíche na École des Hautes Études en Sciences Sociales (Paris) e na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

"Ele sabe o que fala. E ele também tem talento. É uma diferença que tem com esses personagens públicos que aparecem e somem. (...) Eles são descartáveis, é como se eles não tivessem talento suficiente para permanecer. O Stephen Hawking está ali porque ele tem talento", afirma a pesquisadora.

"Uma terceira coisa (que explica sua fama): ele é um modelo de superação. Apesar de estar imobilizado, de ter uma série de dificuldades, ele supera isso e consegue continuar trabalhando. Uma das coisas que buscamos no personagem público é o reconhecimento (...) é como se quando a gente olhasse para uma figura pública, a gente buscasse alguns modelos que sejam conhecíveis para nós como sendo algo potencialmente bons", diz Lígia, que pesquisa como as celebridades ascendem à fama.

"O Stephen Hawking, do jeito dele, não é só como uma bunda grande, só uma voz bonita. Ele está numa cadeira de rodas, não consegue falar direito, mas tem uma presença midiática", afirma.

Para Lígia, a existência de um cientista celebridade é muito importante, pois abre portas para que outros pesquisadores levem a ciência ao grande público. "O sucesso de um especialista é muito positivo. Os cientistas não podem ter medo de falar com as pessoas. A ciência tem que voltar para o senso comum, não pode ficar na torre de marfim dos laboratórios", diz a pesquisadora.

Fonte: Terra
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