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Leitura rápida de DNA pode ajudar no tratamento de câncer

10 mar 2010 - 18h49
(atualizado às 18h59)
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Pesquisadores da Universidade Johns Hopkins desenvolveram uma maneira de monitorar o progresso do tratamento de câncer de um paciente usando uma nova técnica de sequenciamento rápido, ou decodificação, de grandes quantidades de DNA.

No processo, eles sacudiram a doutrina postulada por livros acadêmicos, que afirmam que todos possuem uma única versão do DNA em suas mitocôndrias, as máquinas fornecedoras de energia dentro de cada célula. Além das mutações no DNA encontrado em pacientes de câncer, até mesmo pessoas saudáveis apresentaram diversas variantes em seu DNA mitocondrial, embora em grande parte em pequenas proporções.

A descoberta, relatada na edição atual da Nature, é parte de um programa do doutor Bert Vogelstein, Kenneth W. Kinzler e colegas para monitorar a presença de células cancerosas por meio de fragmentos de DNA mutante dispersos no sangue. Essa abordagem estava fora de questão até o desenvolvimento, alguns anos atrás, de métodos de sequenciamento de grandes quantidades de DNA a um baixo custo.

Uma célula se torna cancerosa quando os genes que interrompem o crescimento desenfreado são sabotados por mutações. Quando as defesas anticâncer da célula são destruídas, o caos genético se instaura, com a ocorrência de mais mutações e rearranjos de DNA em grande volume nos cromossomos.

Se esses pedaços de DNA modificado pudessem ser identificados na corrente sanguínea de um paciente, eles serviriam como um marcador direto e sensível do câncer. Um cirurgião poderia checar se removeu com sucesso todo o tumor, e os quimioterapeutas poderiam monitorar o sucesso de qualquer tratamento, conduzindo testes para constatar o reaparecimento de células cancerosas.

Mas considerando todo o dano genético existente na célula cancerosa, não se sabe ao certo qual tipo de dano seria o melhor marcador da presença de um tumor. No mês passado, Rebecca J. Leary e o doutor Victor E. Velculescu, colegas de Vogelstein, relataram que conseguiram detectar com confiança rearranjos de DNA através do sequenciamento de fragmentos de DNA no sangue.

Os rearranjos de DNA são exclusivos de células cancerosas, o que faz deles um marcador muito específico. Mas o teste de cada paciente exigia o sequenciamento de bilhões de unidades de DNA ao custo de US$ 5 mil.

Vogelstein, Yiping Le, Nickolas Papadopoulos e outros colegas exploraram outro possível marcador de células cancerosas: o do DNA mitocondrial. As mitocôndrias são antigas bactérias que foram escravizadas há muito tempo com o intuito de gerar energia para as células maiores. Elas se localizam fora do núcleo que contém o principal genoma humano, e, como podem existir milhares delas em cada célula, seu DNA é particularmente fácil de ser detectado.

A equipe de Vogelstein descobriu que mais de 80% dos tipos de câncer tinha mutações em seu DNA mitocondrial. Essas mudanças são fáceis de identificar porque o genoma do DNA mitocondrial é muito pequeno ¿ apenas 16 mil unidades - em comparação a três bilhões de unidades do genoma no núcleo da célula.

O método que seus colegas relataram no mês passado é mais meticuloso, já que é provável que o rearranjo aconteça em todas as células cancerosas do corpo do paciente. Mas ele exige o sequenciamento de todo o genoma do paciente. O teste de DNA mitocondrial é menos caro e tão sensível que uma mutação pode ser detectada a partir de uma amostra muito menor de sangue.

Ambos os métodos estão na fase de pesquisa e dependem de uma redução ainda maior do custo do sequenciamento de DNA antes de serem considerados para tratamentos clínicos. Mas Vogelstein disse que os marcadores de câncer com base em DNA poderão se tornar um diagnóstico melhor do que os métodos atuais, que dependem da detecção de proteínas ligadas ao câncer. "Não há dúvida, sob o ponto de vista da pesquisa, de que essa abordagem tem potencial para monitorar os pacientes e os tumores de maneira melhor do que a abordagem convencional", ele disse.

Michael Melner, diretor do programa científico da American Cancer Society, disse que a organização tinha "grande interesse" em métodos baseados em DNA para monitorar o câncer e que a análise de DNA mitocondrial de Vogelstein era a mais completa até agora.

Enquanto examinava pacientes para detectar mutações relacionadas ao câncer no DNA mitocondrial, a equipe da Johns Hopkins percebeu que havia muito mais variação no DNA mitocondrial do que a esperada em pessoas saudáveis ¿ sete de oito pessoas possuíam pequenas proporções de variantes de DNA mitocondrial além do tipo principal.

Ao testar os familiares, eles confirmaram, como esperado, que nenhuma mitocôndria do pai havia passado para os filhos. Acredita-se que a mitocôndria do esperma seja destruída após penetrar no óvulo. Algumas variantes foram detectadas nas mães dos pacientes, por isso devem ter sido herdadas através do óvulo. O corpo parece ter algum sistema para eliminar mutações que surgem no DNA mitocondrial, para que a maioria das pessoas tenha um único tipo dominante, mas evidentemente o sistema não é completamente eficiente.

A equipe de Vogelstein descobriu que a proporção de DNA mitocondrial variante em pessoas saudáveis tende a mudar bastante em diferentes tipos de tecido do corpo. Isso, eles observaram, poderia levar um analista forense a não identificar a relação de duas amostras de diferentes tecidos do mesmo indivíduo. Eles sugerem que a amostra de um suspeito deva ser do mesmo tipo do tecido, seja cabelo ou sangue, da evidência encontrada.

Terry Melton, chefe-executiva da Mitotyping Technologies, uma companhia de análises forenses de State College, Pensilvânia, disse que era de conhecimento geral entre analistas forenses o fato de que indivíduos muitas vezes têm mais de um tipo de DNA mitocondrial, sendo que o cabelo é o tecido de maior variedade - cerca de 12% das amostras de cabelo têm mais de um tipo de DNA mitocondrial.

Se duas sequências de DNA mitocondrial diferem por uma única unidade, as diretrizes atuais exigem que o analista considere a comparação inconclusiva. "Embora isso possa resultar numa exclusão falsa, é mais importante que não resulte numa inclusão falsa, uma posição jurídica adequadamente conservadora", Melton disse.

Mas as descobertas da Johns Hopkins podem incentivar os laboratórios forenses a fazer mais testes nesses casos para descobrir o que realmente acontece, ela disse.

Tradução: Amy Traduções

The New York Times
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