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Cientistas encontram padrão nas correntes marinhas

Cientistas encontram padrão nas correntes marinhas

2 out 2009 - 12h23
(atualizado às 14h07)
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Suponha que uma bolha de pesticidas ricos em dioxina tenha sido lançada à baía de Monterey. Ela poderia se dispersar rapidamente no Oceano Pacífico. Mas, horas depois, um derramamento de toxinas da mesma dimensão e no mesmo ponto poderia circular perto da costa, representando grave perigo para a vida marinha.

Sensores perto de Santa Cruz, na Califórnia, tomam medidas de corrente de superfície na baía de Monterey
Sensores perto de Santa Cruz, na Califórnia, tomam medidas de corrente de superfície na baía de Monterey
Foto: The New York Times

As bravias águas de superfície da baía se movimentam de maneira tão caótica que uma pequena variação de lugar ou horário para uma bolha de petróleo, boia ou ser humano que entre na água pode ditar a direção em que será lançada - para o oceano aberto ou rumo à costa?

Mas os resultados não são imprevisíveis. Uma equipe de cientistas que estuda a baía de Monterey desde 2000 descobriu que há uma estrutura que orienta os padrões de dispersão de suas correntes aparentemente aleatórias, e que essa estrutura muda com o tempo.

Com a ajuda de um radar de alta frequência que acompanha a velocidade e direção das águas, e de computadores capazes de executar milhões de cálculos rapidamente, os cientistas descobriram que um arcabouço oculto determina se os objetos são conduzidos ao oceano ou ficam na baía.

Ao longo dos 10 últimos anos, os cientistas realizaram grandes avanços em sua capacidade de identificar e criar imagens dos mecanismos subjacentes ao fluxo do ar e da água, e de prever a maneira pela qual os objetos se moverão em meio a esses fluxos.

Auxiliados por instrumentos capazes de acompanhar em detalhe o movimento de pacotes de fluidos e por computadores de baixo custo mas capazes de calcular grande volume de dados rapidamente, os cientistas identificaram estruturas ocultas além da baía de Monterey, e essas estruturas explicam por que aviões enfrentam turbulências inesperadas, por que o fluxo de ar em torno de um carro torna arrasto e como o sangue flui dos ventrículos cardíacos.

Em dezembro, a revista Chaos vai publicar os resultados da pesquisa em curso para rastrear os esqueletos que se movem por sob os fluxos complexos, conhecidos como "estruturas coerentes de Lagrange".

"Houve uma explosão de interesse por esse campo", disse David Campbell, editor chefe da Chaos, físico e diretor administrativo da Universidade de Boston. "O motivo para que o campo tenha atraído interesse é que os cientistas experimentais agora podem observar o surgimento dessas estruturas".

Os padrões de fluxo fascinam os pensadores há séculos. No século XVI, Leonardo da Vinci desenhou os vórtices que via nas águas dos rios e os vórtices de sangue que imaginava existir na válvula aórtica. Da mesma maneira que os padrões visíveis de fluxo mudam rapidamente, de forma que escapa à nossa capacidade de prever os objetos neles aprisionados, as estruturas de fluxo ocultas também se movimentam e se alteram ao longo do tempo.

O conceito dessas estruturas surgiu como parte da teoria de sistemas dinâmicos, um ramo da matemática usado para compreender fenômenos complicados que mudam com o tempo. A descoberta de estruturas em ampla gama de casos reais demonstrou que elas desempenham papel chave nos complexos e caóticos fluxos da atmosfera e do oceano.

As estruturas são invisíveis porque em muitos casos existem apenas como linhas divisórias entre porções de um fluxo que se movem em velocidades e em direções diferentes. No oceano, o percurso de uma gota de água em queda de um lado de uma estrutura como essa pode divergir do percurso de gota semelhante do lado oposto; elas tenderão a se afastar cada vez mais, com a passagem do tempo.

"Não se trata de algo que possa ser tocado", disse Jerrold Marsden, professor de engenharia e matemática no Instituto de Tecnologia da Califórnia, sobre as estruturas. "Mas tampouco se pode defini-las como puras abstrações matemáticas".

Marsden propõe, como analogia, a linha que divide a porção de uma cidade que foi atingida pelo surto de uma doença daquela que não foi. A linha não é uma rua ou uma cerca, mas ainda assim representa uma barreira física. E, à medida que o surto se expande, a linha muda de posição.

Para localizar as estruturas, os cientistas precisam acompanhar o fluxo mas não pela observação de seu percurso; o necessário é observá-lo da perspectiva das gotículas de água ou moléculas de ar que se movem como parte dele. "É mais ou menos como praticar surfe", diz Campbell. "É preciso encontrar a onda e se mover com ela".

Os estudiosos que pesquisam a baía de Monterey identificaram uma estrutura coerente de Lagrange que age como uma crista móvel que separa a região da baía que envia poluentes rumo ao oceano daquela que os reconduz à baía. Eles observaram suas mudanças de posição durante 22 dias, e concluíram que, se computadas em tempo real, essas tendências poderiam ser usadas para determinar janelas de um dia de duração nas quais os poluentes causariam menos danos ao meio ambiente da baía.

The New York Times
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