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Pesquisa: usuários de crack criam estratégia contra exclusão

22 jul 2009 - 15h33
(atualizado às 17h28)
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Alguns usuários de crack desenvolveram estratégias para lidarcom o vício e, ao mesmo tempo, não ficar excluídos em guetos como a Cracolândia, em São Paulo, apontam as pesquisas da psicofarmacólogada Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Solange Nappo,que estuda a droga desde 1992.

A pesquisadora acredita que as associações do crack com outras drogas lícitas e ilícitas feitas por essas pessoas amenizam os principais efeitos colaterais: a psicose e a fissura (desejo compulsivo de consumir a substância).

"Quando o crack surgiu, eles não misturavam com nada para não perder o efeito. Hoje em dia, eles abrem mão de parte desse efeito prazeroso para não sentir o outro efeito que é tão lastimável", disse Solange.

Apesar dos efeitos ainda incertos sobre a saúde com a mistura deoutros elementos ao crack, essas pessoas conseguem trabalhar e conviver com a família, afirma a pesquisadora. "Alguns têm obtido sucesso, não se sabe a que preço. Mas têm obtido sucesso porque estão vivos e inseridos nasociedade."

De acordo com a pesquisadora, essas estratégias podem ser estudadas para que seja desenvolvido um modelo de redução de danos. Ela explicou que o combate as drogas ocorre em três etapas: prevenção, o tratamento e redução de danos para os dependentes em estágio avançado.

"Ele, o viciado em estágio avançado, vai usar a droga de qualquerforma. Então, vamos tentar reduzir os danos desse uso para queele não seja banido da sociedade, para que não se exponha a riscos e não morra", assinalou Solange.

A abordagem da redução de danos pode, segundo a pesquisadora, incentivar o usuário a abandonar a droga aos poucos. Na Cracolândia, a Organização Não Governamental (ONG) É de Lei realiza um trabalho para evitar a transmissão de doenças como HIV e hepatite por meio do uso de crack.

O cachimbo de madeira foi o primeiro insumo distribuído para usuários de crack com o objetivo de incentivar o não compartilhamento do instrumento. Normalmente, os viciados constroem modelos artesanais de metal, que queimam a boca, causando feridas, e podem transmitir doenças quando compartilhado com outras pessoas.

"O cachimbo serviu como um cartão de visitas", disse o coordenador do projeto de redução da ONG É de Lei, Thiago Calil, sobre o início da sua atuação na Cracolândia.

Segundo Calil, a redução de danos é uma proposta de "fomentar o autocuidado" entre os usuários de droga, sem tentar necessariamente impedir o uso da substância.

"Se você usa crack, é bom saber que é uma prática que pode deixá-lo vulnerável e que é importante você aprender a se cuidar", diz o panfleto distribuído nas ruas do centro de São Paulo pela ONG.

Calil destacou que essa linha de atuação é reconhecida internacionalmente e também pelo Ministério da Saúde. A redução de danos, enfatizou, é umaestratégia mal compreendida e pouco aceita por muitos setores da sociedade. Ele lembrou que foi diversas vezes abordado e até revistado por policiais enquanto realizava o trabalho nas ruas do centro.

Por causa das reclamações dos próprios usuários, ONG parou de distribuir os cachimbos de madeira. Eles se queixavam que a madeira dificultava a rapagem da "borra", resíduo da droga que fica nas paredes do cachimbo. Atualmente são fornecidas piteiras de silicone, panfletos e protetorlabial a base de manteiga de cacau.

A ONG É de Lei também costuma ouvir os usuários para definir a sua atução.Os panfletos e o restante do material distribuído pelo ONG, por exemplo, foram elaborados com base em sugestões dos dependentes de crack.

Agência Brasil Agência Brasil
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