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Há 10 anos, sonho brasileiro de autonomia espacial era destruído

Brasil conta com profissionais capacitados e consegue realizar operações complexas, porém faltam investimentos para obter independência espacial

22 ago 2013 - 08h18
(atualizado às 09h42)
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<p>Ignição de um dos motores do foguete em 2003 deixou 21 pessoas mortas, entre técnicos e engenheiros</p>
Ignição de um dos motores do foguete em 2003 deixou 21 pessoas mortas, entre técnicos e engenheiros
Foto: Agência Brasil

Uma década depois do acidente que destruiu o terceiro protótipo do Veículo Lançador de Satélites (VLS) brasileiro e vitimou 21 pessoas no Centro de Lançamento de Alcântara, a Agência Espacial Brasileira (AEB) ainda não tem dinheiro suficiente para lançar o foguete que alçaria o País à autonomia espacial. 

De acordo com o presidente da AEB, José Raimundo Braga Coelho, o projeto precisa ainda de R$ 178,4 milhões para ser finalizado. Neste ano, o VLS-1 conta – até agora – com apenas R$ 16,329 milhões garantidos, de R$ 45,7 milhões prometidos no Plano Nacional de Atividades Espaciais.

Com a escassez de recursos, o cronograma do Programa Nacional de Atividades Espaciais (2012-2021), revisado em janeiro de 2013, terá atrasos. O projeto previa para este ano o voo tecnológico XVT-01, veículo também chamado VSISNAV, com apenas os dois primeiros estágios ativos. E já para 2015, o lançamento da quarta versão do VLS-1, com carga útil de até 250 quilos em órbita de até 700 quilômetros.

Segundo Coelho, a perspectiva de desfecho para essa história está bem mais distante. “Há expectativa de que sejam realizados, em 2014 e em 2015, testes com o VLS-1. Nesses lançamentos, será verificada uma série de componentes, como rede de controle, serviço, telemetria e as interfaces com as redes pirotécnicas da nova torre”, explica. “O lançamento final de qualificação do VLS-1 está previsto para 2017”.

Atrasos no projeto geram críticas de especialistas. “O programa do VLS já andava devagar demais. Com o gravíssimo acidente que ocorreu com o foguete ainda em terra, houve uma pausa enorme”, afirma o astrônomo Naelton Mendes de Araújo, da Fundação Planetário da Cidade do Rio de Janeiro. “Mesmo assim, 30 anos é muito tempo. A parte eletrônica de navegação de bordo com seus microcomputadores e sensores é crítica. Isso sem falar no controle de ignição do propelente, que foi a fonte de problemas até aqui.”

“Somente com a conclusão do Projeto VLS-1, culminando com o lançamento do V04, é que teremos realizado integralmente os sonhos daqueles homens que dedicaram suas vidas ao projeto”, destaca o tenente-coronel Alberto Walter da Silva Mello Junior, atual gerente do VLS-1 e chefe da Coordenadoria de Projetos Espaciais do Instituto de Aeronáutica e Espaço. “É o mais próximo que estamos de um ciclo completo relativo ao desenvolvimento de veículos lançadores nacionais.”

Segundo ele, cerca de R$ 150 milhões foram aplicados “efetivamente” no VLS-1 até hoje, 30 anos depois do início das pesquisas. “Temos que lembrar que, nesta área estratégica, praticamente não há transferência de tecnologia. Temos que reinventar a roda. Fazer isso sem motivações político-militares e sem recursos financeiros não é nada fácil”, pondera Araújo.

Importância

O veículo lançador é um sonho antigo. Seu princípio data da década de 1980, com a intenção do País de adentrar um clube espacial seleto, que domina o ciclo das tecnologias de foguetes e satélites. A ideia significa, na prática, ter a capacidade de produzir e colocar em órbita, a partir de seu território, um satélite com tecnologias nacionais. Considerando o BRIC (Brasil, Rússia, Índia, China), apenas o Brasil está de fora. 

Atualmente, para lançar um satélite, o País contrata o serviço de outra nação. Ou seja, fica sujeito à disponibilidade, à conveniência e aos custos de fornecedores. O preço depende de vários fatores, incluindo a massa e a órbita que se pretende alcançar. Satélites geoestacionários, de comunicação, podem custar entre US$ 15 mil a US$ 30 mil por quilograma. Assim, os valores do lançamento vão de US$ 100 milhões a US$ 220 milhões.

Em Alcântara, o Brasil possui um Centro de Lançamento com posição privilegiada, devido a sua proximidade com a Linha do Equador - o que pode reduzir os custos em 30%. O País também domina a construção e montagem de satélites, alguns em parceria com outros países. Só falta colocá-los em órbita.

Assim, além de economizar, o Brasil poderia vender o serviço de lançamento para outros países. Esse mercado movimenta cerca de US$ 170 bilhões por ano. Mas, antes, é necessário o comprometimento de recursos.

Sem dinheiro, com atrasos

O gerente do VLS-1 resume a situação do projeto: “Temos profissionais capacitados, treinados e respeitados mundialmente; possuímos o domínio da tecnologia e exportamos foguetes suborbitais; sabemos como realizar operações espaciais complexas e possuímos um centro de lançamento invejável por sua localização e funcionalidade. No entanto, todo projeto de alta tecnologia envolve desenvolvimentos e capacitações industriais dispendiosas. Sem fluxo de recurso adequado, o cronograma físico atual não poderá ser seguido, implicando novos atrasos”. 

Araújo concorda: “Não basta vontade para entrar no ‘clube espacial’. É preciso persistência e investimentos a longo prazo, em formação de pessoal e desenvolvimento de equipamentos. Sem unir esforços contínuos de militares, de universidades, de políticos e da indústria, não haverá foguete brasileiro nos próximos anos”.

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