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Sagui conforta parceira à beira da morte na mata atlântica

Vídeo foi registrado em floresta no Nordeste do Brasil

16 abr 2014 - 08h11
(atualizado às 16h12)
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Sagui conforta parceira à beira da morte em floresta brasileira
Sagui conforta parceira à beira da morte em floresta brasileira
Foto: BBC News Brasil

Uma equipe de biólogos, entre eles dois brasileiros, filmou o momento em que um sagui macho abraça e cuida de sua parceira à beira da morte. O episódio, considerado inédito pelos especialistas, ocorreu depois que a fêmea caiu acidentalmente de uma árvore em uma zona coberta por mata atlântica no Nordeste do Brasil.

Enquanto ela agonizava, o macho a confortava, enxotando jovens saguis curiosos para saber o que estava acontecendo no local. Pesquisadores se surpreenderam com a demonstração de afeto. Até hoje, cenas semelhantes envolvendo primatas só haviam sido gravadas com chimpanzés e humanos.

Os saguis eram um casal dominante no grupo e estava junto há três anos e meio. Meses após a morte da parceira, o macho abandonou o grupo e nunca mais retornou.

'Cuidado e atenção'

Os detalhes dessa interação extraordinária foram publicados na revista científica , junto com o vídeo registrando o comportamento inédito.

"O cuidado e a atenção com que ele trata sua parceira me deixou espantada", disse à BBC a primatologista brasileira Bruna Bezerra, da Universidade de Bristol, que testemunhou a cena.

Ela e e mais três colegas vinham estudando o mesmo grupo de saguis havia vários anos.

A equipe de pesquisadores acompanhou 12 primatas e suas interações. O grupo era formado por quatro machos adultos, três fêmeas adultas, três jovens e dois bebês.

Enquanto observavam os saguis, os biólogos viram a fêmea dominante do grupo, que apelidaram de F1B, cair de uma árvore e batendo sua cabeça em um objeto no solo.

Ferida gravemente, a fêmea permaneceu deitada no chão agonizando por duas horas e meia antes de morrer.

"O comportamento mais marcante durante esse tempo partiu do macho dominante M1B", afirmou o estudo.

Depois de 45 minutos, o macho percebeu a fêmea estirada no solo.

"Ele foi imediatamente ao encontro dela", disse Bezerra à BBC Nature.

Nesse momento, conta a pesquisadora, o macho deixou para trás os dois bebês do casal em cima da árvore para descer até o chão e abraçar sua parceira. Ele permaneceu ao lado dela por 1h48, acrescentou Bezerra.

Durante o tempo em que a fêmea agonizava em seu leito de morte, ele a abraçou e a farejou. O macho também se manteve alerta, enxotando membros mais jovens do grupo que se aproximavam do corpo de sua parceira.

Conforto à beira da morte

Apesar do ineditismo da cena em saguis, não é a primeira vez que tal comportamento é observado em primatas. Pesquisadores já haviam testemunhado chimpanzés cuidando de outros membros do grupo à beira da morte.

Em um caso, quando uma fêmea foi atacada por um leopardo, um chimpanzé mais velho também manteve os mais jovens afastados do corpo da primata.

Ainda não se sabe o motivo exato pelo qual alguns primatas evitam que membros mais jovens se aproximem de outros agonizando ou mortos. Saguis jovens são conhecidos por cuidar de familiares feridos.

Os pesquisadores destacam que a raridade e a complexidade de tais observações tornam difícil avaliar como primatas percebem a morte. Por exemplo, durante a interação, o macho M1B tentou copular com a fêmea F1B.

Os saguis tendem a usar o sexo para reforçar os laços sociais, tais como outros primatas, como os bonobos.

Enquanto confortava sua parceira, o macho também reproduziu um barulho que serve como uma espécie de alerta para o grupo da aproximação de possíveis predadores, como aves de rapina. Mas nenhum predador estava na área, segundo os biólogos presentes.

Os especialistas não souberam explicar qual aspecto sexual da interação do macho com a fêmea, ou mesmo os sons de alerta produzidos por ele, foram decorrentes da dor ou da natureza estressante da situação.

"A situação estressante pode ser a causa dos comportamentos 'fora de contexto' desempenhados pelo macho", afirmou Bezerra à BBC Nature.

"No entanto, podemos especular que o macho usou esse recurso para tentar obter uma resposta de sua parceira no leito de morte".

Os saguis normalmente vivem durante uma década. O macho e a fêmea observados pelos pesquisadores estavam juntos há aproximadamente três anos e meio. Nesse período, eles tiveram oito filhotes.

Os pesquisadores suspeitam que a fêmea estava grávida de mais filhotes machos quando caiu da árvore e morreu. Momentos antes de morrer, ela teve espasmos musculares.

Três meses depois da morte da parceira, o sagui macho deixou o grupo. Seu destino não é conhecido. "O macho dominante desapareceu após a perda de sua fêmea dominante", disse Bezerra.

"É interessante notar que, em humanos, a mortalidade e a susceptibilidade a doenças tendem a crescer consideravelmente pouco depois da perda de um parceiro de muitos anos. O estresse emocional e o luto contribuem para a deterioração do estado de saúde e da mortalidade de quem ficou só", acrescentou a bióloga.

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