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Protestos no Brasil, Turquia e outros países compartilham símbolos

20 jun 2013 - 17h31
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A linguagem e o fuso horário mudam, mas, da Turquia ao Brasil, passando pela Bulgária, o simbolismo dos protestos está cada vez mais parecido.

As máscaras do personagem de quadrinhos inspirado no revolucionário inglês Guy Fawkes e popularizada pelo filme V de Vingança, os capacetes improvisados para enfrentar o gás lacrimogêneo, os cartazes escritos à mão - em desafio ao poder do Estado e à uniformidade do velho comportamento - podem ser vistos em várias cidades.

Além disso, há também a juventude dos manifestantes.

No parque Gezi, em Istambul, por exemplo, antes de a polícia retirar os manifestantes, era possível ver estudantes adolescentes aparecendo todas as tardes, em pequenos grupos, ocupando o que ainda restava do gramado para fazer a lição de casa da escola.

Imagens em São Paulo contam uma história parecida.

Nas duas cidades, pessoas nascidas em uma era pós-ideológica estão usando os símbolos que conseguem agarrar para contar sua história sobre ser moderno, urbano e insatisfeito: a bandeira nacional e a camisa de um time de futebol local são memes comuns em Istambul e na capital paulista.

A dúvida é: para onde será direcionada tanta insatisfação?

Da Europa ao mundo árabe

Na época dos tumultos na Grã-Bretanha e no sul da Europa em 2011, havia respostas mais claras. Uma geração inteira de jovens presenciou o fim de bonanças econômicas: eles provavelmente vão trabalhar além dos 60 anos e sairão da universidade já com dívidas que podem durar a vida inteira.

E, como afirmaram os estudantes americanos durante protestos em 2009, os empregos que vão conseguir quando saírem da universidade provavelmente serão os mesmos trabalhos precários que tinham enquanto estudavam.

Na Grécia, engenheiros altamente qualificados participavam do protesto enquanto trabalhavam como garçons.

Com a Primavera Árabe, parecia diferente para quem olhava de fora: estas economias cresciam rapidamente - no caso da Líbia, espetacularmente rápido.

Mas ali observa-se algo peculiar: esta foi a primeira geração cujas vidas e psicologia foram formadas pelo acesso imediato à tecnologia de informação e às redes sociais. Isso torna muito fácil evitar a propaganda do governo, censura e a imprensa governista.

A televisão estatal egípcia, por exemplo, perdeu toda a credibilidade nos primeiros dias do levante contra o então presidente Hosni Mubarak. Neste mês, quando emissoras turcas turco tentaram ignorar os protestos no país, foram bombardeadas com reclamações.

"Mas a maioria das reclamações veio de pessoas com mais de 35 anos. A juventude não assiste TV e, de qualquer forma, nunca acreditou nos noticiários", disse à BBC um professor de política.

Redes sociais tornam possível organizar protestos rapidamente, reagir à repressão e iniciar uma bem-sucedida guerra de propaganda que faz com que a imprensa tradicional e as máquinas oficiais pareçam tolas.

Ao mesmo tempo, estimulam uma estrutura relativamente "horizontal" dos protestos. A praça Taksim, em Istambul, foi um caso raro por ter um grupo de 60 organizadores; os protestos em São Paulo seguiram o padrão geral de vários grupos organizadores e uma rede amorfa de pessoas que simplesmente escolheram onde iriam participar, o que escrever em seus cartazes e o que fazer.

Por quê?

Em Istambul, alguns dos contatos da reportagem da BBC nos mercados financeiros estavam perplexos e questionavam: por que eles estão protestando quando este é um dos lugares que mais crescem (financeiramente) do mundo?

Nas ruas, a resposta era clara. Em primeiro lugar, muitos dos jovens educados reclamavam que "a riqueza ia para uma elite corrupta"; muitos afirmavam que, apesar de serem médicos, engenheiros civis etc, não conseguiam pagar por moradia.

Mas havia outro motivo: eles sentiam que o governo conservador e religioso do Partido AK estava sacrificando a liberdade.

Um articulista de moda turco, ou seja, não se tratava de um revolucionário, reclamava de uma "hostilidade crescente e insidiosa ao moderno".

E eles viram a ação pesada da polícia no acampamento do parque Gezi como um símbolo dessa falta de liberdade.

Em São Paulo as reclamações eram mais claramente sociais. "Menos estádios, mais hospitais" era a frase vista em um cartaz.

O aumento do preço do transporte público, combinado com a determinação do governo de priorizar os estádios e a infraestrutura em seu entorno, está entre as queixas mais comuns.

E, na semana passada, a reação desproporcional da polícia e relatos de balas de borracha disparadas contra jornalistas fomentaram os protestos.

Em cada caso, os efeitos da ação da polícia são aumentados pela habilidade dos manifestantes em compartilhar suas imagens com o mundo todo.

'Não letais'

E, após 30 anos testemunhando o uso instrumentos "não letais" pela polícia, minha impressão é de que canhões de água e balas de borracha estão levando a polícia do mundo todo mais perto de níveis "quase letais" cada vez menos aceitos pelos manifestantes que vão para as ruas pacificamente.

Apesar de ser uma comparação menor, os protestos na Bulgária, que na quarta-feira forçaram a retirada de um polêmico chefe de segurança do governo, estão associados a questões parecidas com as levantadas em protestos ao redor do mundo.

Não se trata de um grito contra a pobreza, segundo os manifestantes. É contra a corrupção, contra a natureza fraudulenta da democracia e contra uma elite pronta para agarrar parte da riqueza gerada pelo desenvolvimento econômico.

Resumindo, assim como em 1989, quando descobrimos que as pessoas na Europa Oriental preferiam a liberdade individual ao comunismo, atualmente muitos relacionam o capitalismo com elites que nunca são responsabilizadas por nada, com a ausência de representação democrática efetiva e com o policiamento repressivo.

E os eventos recentes mostram que pessoas comuns, sem ideologias, descobriram uma forma de resistir a tudo isso.

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