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Por transparência, aplicativo 'segue' policiais de UPP

18 out 2013 - 05h11
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Ao sair para o patrulhamento diário, o celular do policial filma tudo o que acontece a sua volta. O vídeo é transmitido ao vivo para uma central de comando ou acessado posteriormente para verificar ocorrências.

O novo mecanismo para acompanhamento de atividades policiais é um simples aplicativo para smartphones que está sendo desenvolvido para aumentar a transparência nas atividades das Unidades de Polícia Pacificadora - as UPPs estabelecidas nas favelas do Rio.

O celular com o aplicativo é colocado em um bolso na altura do peito dos policiais, com a câmera virada para a frente, e capta áudio e vídeo durante a patrulha. O aplicativo é acionado no próprio celular ou remotamente, de uma central de comando.

A ferramenta, desenvolvida em conjunto pela Polícia Militar do Rio e o Instituto Igarapé, uma organização sem fins lucrativos, está sendo testado desde maio com policiais de UPPs, em comunidades como a Rocinha e Complexo do Alemão.

"O aplicativo vai permitir gerar uma imagem em tempo real e acompanhar a localização do policial durante o patrulhamento", explica o coronel Frederico Caldas, novo comandante das UPPs.

"Isso envolve duas questões fundamentais: primeiro, o apoio, se o policial estiver em situação de emergência; e a fiscalização, acompanhando se ele esta cumprindo o roteiro combinado e, se houver alguma incidência, podendo verificar mais tarde o que aconteceu."

Caso Amarildo

Batizado provisoriamente de smart policing, ou "policiamento inteligente", o aplicativo busca aproveitar os recursos básicos de smartphones, como câmera, GPS, internet e sensores, para dar subsídios à política de segurança pública do Rio.

Pesquisador-chefe do Instituto Igarapé, Robert Muggah explica que o objetivo é aumentar a transparência nas atividades policiais e promover sua accountability - expressão que não existe no Brasil mas se refere à necessidade de uma pessoa ou instituição prestar contas e se responsabilizar por suas ações.

A ferramenta se somaria a um esforço mais amplo do governo do Rio de "pacificar" a polícia com as UPPs, diz Muggah, aludindo à reputação da corporação pelo uso excessivo de força e pela violência empregada em operações em favelas.

O aplicativo começou a ser desenvolvido em janeiro, mas o desaparecimento do pedreiro Amarildo na Rocinha, em julho, é um exemplo de sua utilidade.

Amarildo sumiu em 14 de julho após ter sido levado à sede da UPP na comunidade para "verificação". A polícia afirma que ele foi liberado após sair da sede da UPP, mas câmeras de segurança que poderiam confirmar a informação não estavam funcionando.

O inquérito da Policia Civil sobre o caso, concluído no início do mês, pede o indiciamento de dez PMs pelo sumiço de Amarildo, incluindo o major Edson Santos, que comandava a UPP da Rocinha na época. Os agentes são acusados de tortura seguida de morte e ocultação de cadáver, mas negam envolvimento.

O caso estremeceu a confiança dos cariocas nas UPPs, que vêm sendo implantadas desde 2008 e hoje têm em 34 unidades, abrangendo 8,6 mil policiais.

Proteção

O aplicativo está sendo desenvolvido com ajuda do Google Ideas e será lançado no fim de outubro em Nova York no congresso "Conflito em um Mundo Conectado" ("Conflict in a Connected World"), de soluções tecnológicas para intermediar conflitos.

Em novembro, começa uma fase de testes em maior escala, com até cem policiais em duas UPPs - na Rocinha e em outra ainda a ser confirmada. A expectativa é de que o app comece a ser usado regularmente no ano que vem.

"A tecnologia é muito importante porque permite que atuemos com mais inteligência e sejamos mais precisos", diz Caldas.

Os vídeos captados podem proteger cidadãos em caso de ações policiais truculentas, mas também resguardar policiais de acusações que não procedem.

"A ideia é aumentar a responsabilização da polícia por suas atividades no dia a dia, mas isso também pode funcionar como uma camada de proteção aos policiais", diz Muggah.

Com ambas as partes sendo filmadas, o monitoramento contribua para acalmar os ânimos em casos de conflito evitar que eles se exacerbem e se tornem violentos.

Brasil, África do Sul e Quênia

Embora esteja sendo testado inicialmente no Rio, o smart policing está sendo concebido também para forças de segurança da África do Sul e do Quênia.

Em setembro, parceiros do projeto em Nairóbi e na Cidade do Cabo e do Google Ideas estiveram no Rio para discutir a aplicação do modelo nos outros países, visitando a UPP da Rocinha para conhecer a realidade local e compará-la com a de seus países.

Mads Frilander, diretor da Danish Demining Group no Quênia, afirma que a polícia e a população do país historicamente têm uma relação tensa, exacerbada por casos de má conduta policial mas também por altos índices de criminalidade.

Em ambos os países, há vontade política para usar mais tecnologia na área de segurança, mas o aplicativo terá que se adequar às realidades locais. O software será livre e poderá ser usado em outros países e por grupos de outras áreas.

No Rio, está sendo estudada uma forma de "borrar" o rosto dos moradores das comunidades e proteger sua privacidade. Os vídeos armazenados no celular serão criptografados, acessíveis apenas em uma central de comando.

Outras funções estão tendo novos usos descobertos. O detector de movimento que avisa se o policial está parado foi pensado como um alerta para casos de PMs baleados - mas já esta sendo imaginado como um delator de sonecas para caso de policiais dormindo em serviço.

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