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Julgamento do Mensalão

Marco Aurélio propõe alteração que tiraria maioria dos réus da prisão

5 dez 2012 - 17h14
(atualizado em 6/12/2012 às 02h03)
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Gustavo Gantois
Direto de Brasília

O julgamento do mensalão foi retomado nesta quarta-feira com uma polêmica proposta apresentada pelo ministro Marco Aurélio Mello. Diante da discussão jurídica sobre o estabelecimento da continuidade delitiva ou do concurso material para as penas estabelecidas aos 25 réus da ação penal, Marco Aurélio acabou reduzindo em pelo menos um terço as punições impostas a 16 dos condenados.

Marco Aurélio defende a aplicação da continuidade delitiva
Marco Aurélio defende a aplicação da continuidade delitiva
Foto: Gervásio Baptista/STF / Divulgação

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Com exceção do núcleo político, no qual José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares tiveram suas penas inalteradas, os demais condenados viram, em sua maioria, uma redução das punições que, na prática, os retirariam do regime fechado para a prisão domiciliar.

A pena para Marcos Valério, por exemplo, seria reduzida de 40 anos, 2 meses e 10 dias para 10 anos e 10 meses - a mesma punição aplicada a Dirceu. Os sócios de Valério Ramon Hollerbach e Cristiano Paz teriam uma pena de 8 anos e 1 mês. O deputado João Paulo Cunha (PT-SP), principal parlamentar condenado no processo, sairia de uma pena de 9 anos e 4 meses para 3 anos, 10 meses e 20 dias. Na prática, sairia do regime fechado para o aberto.

"Apontei que não poderíamos potencializar o entendimento de que temos profissionais do crime e, a partir dessa ótica, afastar a continuidade. Nesses 34 anos de magistratura eu tenho buscado a coerência", justificou Marco Aurélio.

A proposta foi formulada a partir do pedidos das defesas para que penas para crimes da mesma espécie fossem unificadas. O ministro entendeu que crimes contra a administração pública e contra o sistema financeiro poderiam coexistir sob a mesma punição. A exceção seriam as condenações por formação de quadrilha que, segundo o ministro, seriam crimes contra a paz pública.

As penas propostas até agora, que totalizam 280 anos, foram fixadas levando em conta o concurso material, quando o mesmo crime é cometido diversas vezes em ações distintas. Seguindo esse critério, uma pena foi fixada para cada um dos crimes.

No caso da continuidade delitiva, base da proposta do ministro Marco Aurélio, considera-se que o primeiro crime levou ao segundo, e assim por diante. Ou seja, o mesmo crime foi praticado de formas diferentes e continuamente. Assim, aplica-se a pena mais grave, que pode ser ampliada de um sexto a dois terços.

Isso quer dizer que condenados a vários crimes, como Marcos Valério, que foi punido por corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas, ficaria apenas com a pena mais alta desses delitos, no caso a de lavagem de dinheiro. A ela seria acrescida a pena por formação de quadrilha, que não entra na contagem por não ser contra a administração pública.

"Há um princípio muito caro em toda sociedade que se diga democrática que é o princípio do tratamento igualitário. O meu voto pelo menos tem uma virtude, nivela, afastando-se essa discrepância de ter o autor intelectual condenado a 11 anos e o instrumento condenado a 40", disse Marco Aurélio, referindo-se à diferença entre as penas impostas a Marcos Valério e a José Dirceu.

Questionado se via alguma possibilidade de ter sua proposta acolhida pelos outros ministros, Marco Aurélio foi irônico. "Estou muito acostumado a ficar isolado no plenário. Não sei se fico ou se terei alguma solidariedade na minha forma de pensar. Quem sabe se reafirma a máxima dos antigos, a virtude do meio-termo", disse.

A opinião pública também não pareceu importar ao ministro. De acordo com Marco Aurélio, sua "função não é punir exemplarmente, mas punir segundo o arcabouço normativo na interpretação que dou ao arcabouço normativo", completou.

Proposta do ministro Marco Aurélio:

Marcos Valério:

de 40 anos, 2 meses e 10 dias para 10 anos e 10 meses de reclusão em regime fechado

Ramon Hollerbach:

de 29 anos, 7 meses e 20 dias para 8 anos e 1 mês de reclusão em regime fechado

Cristiano Paz:

de 25 anos, 11 meses e 20 dias para 8 anos e 1 mês de reclusão em regime fechado

Rogério Tolentino:

de 8 anos e 5 meses para 8 anos em regime semiaberto

Simone Vasconcelos:

de 12 anos, 7 meses e 20 dias para 5 anos em regime semiaberto

Kátia Rabello:

de 16 anos e 8 meses para 8 anos e 11 meses em regime fechado

José Roberto Salgado:

de 16 anos e 8 meses para 8 anos e 11 meses em regime fechado

Henrique Pizzolato:

de 12 anos e 7 meses para 5 anos e 10 meses em regime semiaberto

Romeu Queiroz:

de 6 anos e 6 meses para 4 anos, 9 meses e 12 dias em regime semiaberto

Valdemar Costa Neto:

de 7 anos e 10 meses para 5 anos e 4 meses de reclusão em regime semiaberto

Pedro Henry:

de 7 anos e 2 meses para 4 anos e 8 meses de reclusão em regime semiaberto

Bispo Rodrigues:

de 6 anos e 3 meses para 3 anos, 9 meses e 15 dias de reclusão em regime aberto

Pedro Corrêa:

de 9 anos e 5 meses para 6 anos e 11 meses em regime semiaberto

João Paulo Cunha:

de 9 anos, 4 meses e 3 dias para 3 anos, 10 meses e 20 dias em regime aberto

Roberto Jefferson:

de 7 anos e 14 dias para 4 anos, 6 meses e 13 dias em regime semiaberto

Vinicius Samarane:

de 8 anos e 9 meses para 5 anos e 9 meses em regime semiaberto

O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.

No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.

Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.

O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.

A então presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.

Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e o irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.

A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.

Fonte: Terra
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