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Julgamento do Mensalão

Barbosa não ameaça julgamento ao acumular funções, diz criminalista

9 ago 2012 - 18h40
(atualizado às 21h32)
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Para o advogado criminalista e professor de direito penal René Ariel Dotti, não há perigo de anulação do julgamento do mensalão. A hipótese, levantada pelo advogado Luiz Flávio Gomes em artigo publicado ontem pelo jornal Folha de S.Paulo, foi contestado nesta quinta-feira por Dotti. Ao contrário de Gomes, Dotti considera que o ministro Joaquim Barbosa não atuou como "investigador" ao autorizar a produção de provas contra os acusados. Assim, ele não estaria acumulando as figuras de investigador e juiz no Supremo Tribunal Federal (STF), o que seria coibido pela jurisprudência internacional.

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"Na verdade, o juiz, em casos como esse, apena autoriza determinado tipo de prova. Ele não executa prova. Claro que somente ele poderia autorizar, porque, sendo prerrogativa de deputados, o caso tem de correr no STF - e tem de ser sorteado um relator. Esse relator tem a necessidade de atender pedidos para a investigação, sejam pedidos da Polícia Federal ou do Ministério Público. Ele aprecia esses pedidos e, ao atendê-los, não está se comprometendo com o resultado da prova - assim como acontece todos os dias com os juízes que decretam prisão preventiva, que não ficam impedidos de julgar", argumenta o professor.

Segundo Dotti, é prerrogativa do relator do processo" autorizar ou rejeitar as provas solicitadas. Além disso, sugere o advogado, mesmo que Barbosa se encontrasse em desacordo com as orientações da jurisprudência internacional, o julgamento seguiria blindado. "Não existe instância superior com força de anular uma decisão do Supremo. Trata-se de um órgão que representa a soberania do País. Nenhum outro órgão pode interferir. Claro que existem Cortes (internacionais), mas elas servem para fins consultivos, e não executivos", afirma.

Sobre o desenrolar do julgamento, Dotti diz acreditar que tem havido ampla liberdade tanto para a acusação quanto para a defesa. "Não vejo nenhum vicio. Confio muito na experiência e na sensibilidade dos ministros." Ainda assim, o advogado considera que o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, deveria ter requerido o impedimento do ministro Dias Toffoli, que advogou pelo PT no passado.

"Ser indicado pelo presidente (Luiz Inácio Lula da Silva) para assumir a função não o impede de julgar causas. A nomeação é feita em função de merecimento e notório saber jurídico. O fato de o presidente indicar não significa que ele não possa julgar casos contra o governo. Mas o caso do Toffoli é diferente: ele agiu como advogado do partido. A atuação dele é suspeita. Não sei por que razão o MP não arguiu a suspeição. Foi uma omissão do MP, que é parte e tem direito de arguir." Evitar atrasos ao julgamento foi a justificativa alegada por Gurgel para não ter solicitado o impedimento de Toffoli.

Cuidadoso ao julgar o mérito das alegações que vêm sendo feitas no STF, Dotti se limita a ponderar que os réus podem ser condenados sem que o convencimento dos ministros se dê por meio de provas irrefutáveis. "A pessoa pode ser condenada não só por prova direta, mas por indícios. Em muitas circunstâncias não é possível obter uma prova, por exemplo, da confissão do crime ou mesmo testemunhal, digamos, de quem assistiu ao crime. A Justiça, nesses casos, se vale de indícios", completa.

O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.

No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.

Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.

O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.

A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.

Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e do irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.

O presidente do STF, ministro Carlos Ayres Britto, na sexta sessão do julgamento
O presidente do STF, ministro Carlos Ayres Britto, na sexta sessão do julgamento
Foto: José Cruz / Agência Brasil
Fonte: Terra
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