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Julgamento do Mensalão

Professor: semelhanças entre mensalão e Collor soam como agouro

1 ago 2012 - 21h05
(atualizado em 3/8/2012 às 16h11)
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Gustavo Gantois
Direto de Brasília

Exatos 6.448 dias separam os dois maiores julgamentos já registrados na história política brasileira. Nas palavras de advogados que acompanharam tanto o julgamento do ex-presidente Fernando Collor de Mello, em dezembro de 1994, quanto o processo contra os 38 réus do mensalão, cujo julgamento começa nesta quinta-feira no Supremo Tribunal Federal (STF), as semelhanças entre os dois casos merecem uma análise detalhada. As coincidências "soam até como agouro" para o cientista político Paulo Kramer.

Dirceu é acusado de organizar esquema que desviou R$ 100 milhões e Collor teria recebido US$ 5 milhões
Dirceu é acusado de organizar esquema que desviou R$ 100 milhões e Collor teria recebido US$ 5 milhões
Foto: José Cruz/Fabio Pozzebom / Agência Brasil

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No caso de Collor, que já havia deixado o governo sob um impeachment dois anos antes, a acusação era apenas de corrupção passiva, quando um funcionário público recebe vantagem indevida. A Procuradoria-Geral da República (PGR) afirmava que o ex-presidente teria utilizado contas fantasmas para receber quase US$ 5 milhões diretamente de empresas ligadas a PC Farias. Em sua defesa, Collor argumentou que o dinheiro era fruto de restos de gastos de campanha. Ao longo do processo, alterou sua versão e afirmou que os recursos foram obtidos junto a um empréstimo no Uruguai.

No mensalão, a PGR acusa o ex-ministro José Dirceu de corrupção ativa e formação de quadrilha por ter montado um esquema de desvio de dinheiro público, estimado em mais de R$ 100 milhões, utilizando empresas ligadas ao empresário Marcos Valério. O dinheiro serviria para comprar o apoio de parlamentares para que votassem a favor do governo.

Unidos em uma única versão, Dirceu e o ex-presidente do PT José Genoino afirmam que o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares teria feito empréstimos em nome de Valério para pagar dívidas de campanha do partido e de outras legendas coligadas, rechaçando qualquer ilação de compra de votos.

"Os fatos são tão parecidos que as versões se confundem. O Collor recebeu um dinheiro que disse ser sobra de campanha e depois virou empréstimo. Os mensaleiros dizem que receberam dinheiro de empréstimo para pagar dívidas de campanha", afirma Paulo Kramer, professor da Universidade de Brasília (UnB).

O Supremo Tribunal Federal absolveu o ex-presidente, por cinco votos a três, por falta de provas, mesmo diante da imensa pressão popular e da mídia pela sua condenação. No caso atual, a defesa dos acusados também insiste em dizer que não há provas de crime contra os réus, apenas de delito eleitoral. "Não vejo o porquê de o Supremo julgar de forma diferente agora", afirma Alberto Zacharias Toron, advogado do deputado João Paulo Cunha (PT-SP).

As defesas de alguns dos réus do mensalão vão utilizar o mesmo argumento durante o julgamento. Uma das razões para a absolvição de Collor foi porque a PGR não conseguiu comprovar a existência do chamado ato de ofício.

De acordo com o Código Penal, uma pessoa pratica o crime de corrupção passiva quando recebe vantagem indevida. No caso do ex-presidente, apesar da comprovação de que tenha recebido uma vantagem, a acusação não conseguiu provar que ele adotou alguma providência que favorecesse o Esquema PC, o que configuraria o ato de ofício.

Pelo menos três advogados utilizam esse argumento, entre eles Luiz Francisco Corrêa Barbosa, que defende o presidente do PTB, Roberto Jefferson, delator do mensalão. Em suas alegações finais, entregues ao Supremo, Barbosa cita nominalmente o caso de Collor, afirmando que a PGR não conseguiu provar a existência de ato de ofício na acusação de corrupção passiva imposta a Jefferson.

"Quando para formular pedido de condenação no crime de corrupção passiva, louva-se a referência a opinião isolada e, citando parte do acórdão na Ação Penal nº 307-DF Caso Collor, diz que na configuração dessa infração é prescindível ato de ofício, que, aliás, não indicou na sua denúncia, praticando ou deixando de praticar", afirma o advogado na defesa.

Outra semelhança entre os casos diz respeito aos ministros que atuaram e atuarão nos julgamentos. Há 17 anos, dois deles não votaram. Marco Aurélio Mello, primo de Collor, fora indicado ao Supremo pelo ex-presidente e preferiu não julgar o parente. Francisco Rezek, que fora ministro das Relações Exteriores, também evitou problemas e declarou-se impedido.

No mensalão, há questionamentos sobre a participação do ministro Dias Toffoli. Ex-advogado do PT e subordinado a José Dirceu na Casa Civil na época das denúncias, Toffoli poderia declarar-se impedido de participar do julgamento. No entanto, ele votou em todas as decisões do caso no STF até agora. Outro motivo para suscitar dúvidas entre os advogados é a participação de sua namorada, Roberta Rangel, na defesa de um dos réus, o ex-deputado Professor Luizinho.

O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.

No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.

Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.

O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.

A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.

Fonte: Terra
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