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Julgamento do Mensalão

Barbosa condena Dirceu, Genoino e Delúbio por corrupção

3 out 2012 - 18h59
(atualizado às 20h07)
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Gustavo Gantois
Direto de Brasília

O ministro Joaquim Barbosa, relator da ação penal do mensalão, votou nesta quarta-feira pela condenação de oito réus por corrupção ativa, entre eles o ex-ministro José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o ex-presidente do partido José Genoino, além de Marcos Valério. Barbosa dedicou grande parte da sessão, a 31ª sobre o tema no Supremo Tribunal Federal (STF), para falar apenas de Dirceu, por vezes citando a participação de Valério e Delúbio no esquema.

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Na leitura do voto, Barbosa hierarquizou a conduta de cada um dos réus. No primeiro grupo, topo da cadeia de comando, estaria José Dirceu, classificado pelo ministro como "organizador e mandante dos crimes de corrupção ativa". Delúbio e Marcos Valério estariam no segundo escalão. No terceiro grupo, José Genoino ficaria a cargo de negociar com alguns parlamentares, além de ter assinado os empréstimos do PT com o Banco Rural e o BMG. O quarto nível conta com os sócios de Valério, responsáveis pelos repasses de dinheiro aos destinatários finais por meio de suas empresas.

Para justificar a condenação, Joaquim Barbosa relatou uma série de reuniões entre Dirceu, Valério e a cúpula do Banco Rural. A defesa sempre insistiu que os encontros não trataram de empréstimos, mas de interesses comerciais do banco, inclusive sobre uma mina de nióbio em Minas Gerais. O relator leu o depoimento de um atual vice-presidente do Rural, Plauto Gouveia, que negou ter ouvido falar do assunto.

"O conjunto probatório coloca o então ministro da Casa Civil (Dirceu) em posição central da organização e prática, como mandante das promessas de pagamentos de vantagens indevidas aos parlamentares que viessem a apoiar as votações de seu interesse. Entender que Marcos Valério e Delúbio Soares agiram e atuaram sozinhos, nesse contexto de reuniões fundamentais do ex-ministro, é inadmissível", afirmou Barbosa.

Juridicamente, o Supremo se encaminha para uma inovação em matéria penal. Nos Estados Unidos, não é raro réus serem condenados sem uma prova cabal, ficando a cargos dos juízes analisar se os indícios são suficientes para chegar a um veredicto. No Brasil, no entanto, ninguém nunca foi condenado apenas porque não seria crível que determinadas pessoas não estivessem tratando de um assunto quando tudo ao seu redor demonstrava o contrário.

Barbosa narrou passo a passo a relação de Dirceu com Marcos Valério e a cúpula do Banco Rural, e os consequentes repasses de dinheiro a parlamentares. O esquema, segundo o relator, funcionou da seguinte maneira: Dirceu se reuniu com Valério e diretores do Rural e do BMG para tratar dos empréstimos; após esses encontros, os bancos concederam empréstimos às agências de Valério. Esses empréstimos serviram para fornecer o dinheiro que era distribuído aos parlamentares enquanto Delúbio indicava quem deveria receber e Simone Vasconcelos, da SMP&B, tinha uma sala no Banco Rural no Brasília Shopping para entregar os recursos. Nesse meio tempo, Dirceu se reunia com deputados para fechar o apoio ao governo nas votações no Congresso.

Portugal

Após o intervalo da sessão, Joaquim Barbosa retomou a leitura de seu voto insistindo que Dirceu exercia papel de controle sobre todo o esquema. A partir de então, passou a narrar as viagens de Marcos Valério a Portugal. Segundo Barbosa, o empresário apresentou-se a dirigentes e empresários portugueses como representante do governo brasileiro recém eleito.

"Marcos Valério, pequeno e desconhecido publicitário (sic), foi recebido em Portugal pelo presidente do grupo Espírito Santo, com o da Portugal Telecom e com o ministro das telecomunicações. É evidente que nenhum desses executivos precisaria da intermediação de Marcos Valério para agendar interesses de suas empresas com autoridades no Brasil. Pela envergadura das pessoas envolvidas, percebe-se que Marcos Valério falava, de fato, em nome de José Dirceu, e não como um pequeno e desconhecido publicitário (sic) de Minas Gerais. Era, por assim dizer, seu broker (corretor).

Genoino

O ex-presidente do PT José Genoino foi descrito como sendo o principal negociador com o PTB do ex-deputado Roberto Jefferson, delator do mensalão. Segundo Barbosa, apesar de não ter poder de "bater o martelo", que era de Dirceu, Genoino assinou os empréstimos feitos junto ao Rural em nome do PT. Além disso, continuou, transformou a sede do PT, em Brasília, em uma "espécie de central de reuniões entre Valério e Delúbio com deputados que receberam dinheiro".

"Houve colaboração específica de Genoino, que executou o delito de corrupção ativa relativa a Roberto Jefferson, ao negociar montantes que seriam repassados pelo PT. Genoino admite ter repassado empréstimos em nome do Partido dos Trabalhadores, tendo como avalista Marcos Valério, demonstrando assim a proximidade entre eles. Depois das reuniões sempre havia uma ligação ou de Delúbio ou de Genoino para o José Dirceu", narrou Barbosa.

Delúbio

A conduta de Delúbio Soares foi descrita pelo relator como fonte das ordens de pagamento. Era o ex-tesoureiro quem definia quem deveria receber o dinheiro. Segundo Barbosa, as dívidas das agências de Valério tiveram como avalista o PT, que até hoje não teria pago os empréstimos. Foi com esse dinheiro, junto aos montantes desviados do Banco do Brasil e da Câmara dos Deputados, que parlamentares foram cooptados pelo então governo.

"Considero impossível acolher a tese de que Dirceu simplesmente não sabia que Valério vinha efetuando pagamentos em espécie em nome do PT aos líderes da base. José Dirceu detinha o domínio final dos fatos. Em razão do elevadíssimo cargo que exercia a época dos fatos, José Dirceu atuava em reuniões fechadas, jantares, encontros secretos, executando os atos de comando, direção, controle e garantia do sucesso do esquema criminoso executado mediante divisão de tarefas em que as funções de cada corréu encontravam nítida definição", disse.

Barbosa surpreendeu ao votar pela absolvição do ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto. O relator confessou que tem dúvidas quanto a eficácia das supostas gestões de Adauto junto ao ex-deputado Romeu Queiroz (PTB-MG) no recebimento do dinheiro.

"É fato que Queiroz recebeu, sim, os recursos, os R$ 300 mil, mas eu sinceramente não tenho certeza até que ponto a interferência de Anderson Adauto tenha sido decisiva para a concretização deste pagamento", justificou o ministro, que também absolveu Geiza Dias, ex-gerente financeira da SMP&B, do crime de corrupção ativa. Ela já havia sido inocentada pelos ministros, em capítulos anteriores, pelos crimes de formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.

O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.

No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.

Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.

O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.

A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.

Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e do irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.

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Fonte: Terra
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