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Julgamento do Mensalão

Barbosa condena 9 réus por lavagem e absolve Ayanna

10 set 2012 - 14h55
(atualizado às 20h49)
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Fernando Diniz
Direto de Brasília

Ao analisar a terceira "fatia" do mensalão, o relator do processo, Joaquim Barbosa, votou nesta segunda-feira pela condenação de nove réus pelo crime de lavagem de dinheiro. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou que os acusados de integrar os núcleos publicitário e financeiro do mensalão agiram como um grupo organizado para dissimular a origem do dinheiro movimentado pela quadrilha. Como a ex-vice-presidente do Banco Rural Ayanna Tenório foi absolvida da acusação de gestão fraudulenta na fase anterior do julgamento, Barbosa decidiu por não condenar a ré também nesta etapa.

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Nesta fase do julgamento, correspondente ao capítulo quatro da denúncia, os ministros do STF julgam a acusação de crime de lavagem de dinheiro contra Marcos Valério e seus sócios - Cristiano Paz e Ramon Hollerbach -, as funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias, o advogado de Valério, Rogério Tolentino, além dos réus do Banco Rural - Kátia Rabello, José Roberto Salgado, Ayanna Tenório e Vinícius Samarane.

Segundo Barbosa, os réus atuaram na fraude da contabilidade de empresas ligadas a Valério, na simulação de empréstimos do Banco Rural e do BMG e em procedimentos para encobrir a movimentação dos montantes repassados ao esquema. "Não há como negar que os réus, dolosamente, em uma divisão de tarefas própria de um grupo criminoso organizado, além de fraudar as contabilidades das pessoas jurídicas ligadas a Marcos Valério também atuaram na simulação de empréstimos bancários, em mais uma etapa real de simulação da origem e ocultação de valores", disse.

O Banco Rural, que segundo o relator cometeu 46 lavagens de dinheiro, teria omitido de órgãos de controle os reais sacadores de valores nas agências do banco, permitindo a retirada de quantias na boca do caixa por pessoas que portavam cheques endossados pela SMP&B, agência de Marcos Valério. "Há nos autos até mesmo e-mails informando quem é a pessoa que ia receber o dinheiro, embora 'oficialmente' o Banco Rural informava ao Banco Central e ao Coafi que a quantia era sacada pela própria SMP&B", ressaltou o ministro.

Embora reconheça que possam vir a receber penas menores, Barbosa afirmou que há provas para condenar Simone Vasconcelos e Geiza Dias pela operacionalização dos saques do mensalão. "Não há como prosperar a tese de Simone e Geiza Dias que, por serem apenas empregadas da SMP&B, somente teriam agido por ordem dos sócios sem qualquer conhecimento da ilicitude", disse, lembrando que Simone ia pessoalmente a agências do Banco Rural para distribuir recursos do valerioduto para parlamentares.

'Valério mentiu'

Barbosa foi enfático ao criticar a mudança do depoimento de Marcos Valério sobre o suposto repasse de dinheiro ao PP, por meio da corretora Bônus Banval. Para lavar o dinheiro da remessa, Rogério Tolentino, advogado das empresas de Marcos Valério, teria contraído um empréstimo de R$ 10 milhões junto ao banco BMG. "Marcos Valério mentiu em seu interrogatório ao afirmar que o suposto empréstimo teria sido repassado em sua totalidade à 2S Participações (também vinculada a Marcos Valério) e à SMP&B, deixando de mencionar os valores repassados à Bonus Banval", disse.

O relator desqualificou o Certificado de Depósito Bancário (CDB) da DNA Propaganda, dado como garantia para Tolentino contrair o empréstimo. Para Barbosa, o CDB não passou de uma simulação da origem dos R$ 10 milhões, que seria fruto de desvio do fundo Visanet, ligado ao Banco do Brasil. "O CDB não passou de um mecanismo fraudulento usado por Tolentino e pelos dirigentes do banco", disse.

Reuniões com Dirceu

Ao analisar as acusações contra a dona do Banco Rural, Kátia Rabello, Barbosa citou reuniões entre a banqueira e o então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, considerado pelo Ministério Público como o chefe do mensalão. Barbosa afirmou que Kátia sabia que os empréstimos fraudulentos dados a empresas de Valério tinham como reais beneficiários pessoas indicadas pelo ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares.

"Parece bastante revelador que Kátia Rabello tenha participado de reuniões com o ex-ministro da Casa Civil. Mais revelador ainda era o fato de que Marcos Valério era quem agendava essas reuniões, agindo como intermediário entre o governo e o Banco Rural", disse.

O relator afirmou que o Banco Rural omitiu de 55 dos 78 registros o destinatário dos saques, contrariando orientações do Banco Central. Entretanto, uma prestação de contas da instituição financeira para a quadrilha teria ajudado a identificar os recebedores. "Neste contexto, os rudimentares e informais registros feitos pelo BR acerca dos reais recebedores, além de ocultados pelo banco como pode, tinham como principal finalidade prestar contas à quadrilha, acerca das quantias milionárias entregues', afirmou.

Já condenados por gestão fraudulenta, Kátia Rabello, José Roberto Salgado e Vinícius Samarane poderiam também ser enquadrados por lavagem de dinheiro, opinou Barbosa. "Com efeito, os denunciados, ao dolosamente simulares empréstimos com o Banco Rural, incorreram tanto no crime de gestão fraudulenta, tanto no crime de lavagem de dinheiro", argumentou.

Ayanna absolvida

Apesar de considerar Ayanna Tenório culpada, o relator Joaquim Barbosa decidiu absolvê-la pelo crime de lavagem de dinheiro por não haver crime antecedente, fundamental para a tipificação do delito. Barbosa votou pela condenação da ex-vice do Banco Rural por gestão fraudulenta na fase anterior do julgamento, mas foi vencido.

"Entendo que ela não só tenha conhecimento do crime antecedente de lavagem de dinheiro, como chegou a participar dele", disse. "A decisão proferida pelo Banco Central confirmada em última instância pela via administrativa, robustece ainda mais meu conhecimento sobre o assunto. Todavia, o Plenário do STF ao apreciar no item inco absolveu Ayanna Tenório contra meu voto. Salientando não haver prova de que ela tivesse conhecimento, não vejo como prosperar a imputação de lavagem de dinheiro, a não ser que o plenário mude seu entendimento", ressaltou.

O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.

No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.

Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.

O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.

A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.

Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e do irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.

A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.

Fonte: Terra
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