Cachoeira intermediou acordo entre Delta e Perillo, diz revista
14 jul2012 - 20h58
(atualizado em 16/7/2012 às 20h57)
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A análise de diálogos interceptados contidos em um relatório sigiloso da Polícia Federal fez com que a corporação concluísse que, assim que assumiu o governo de Goiás, no ano passado, Marconi Perillo (PSDB) e a empreiteira Delta fecharam um "compromisso", com a intermediação do bicheiro Carlinhos Cachoeira. Para que a Delta recebesse em dia o que o governo de Goiás lhe devia, a construtora teria de pagar Perillo. O primeiro acerto envolveria a casa do governador. O empresário Walter Santiago teria pagado R$ 2,1 milhões pela casa - R$ 100 mil seriam para Fiúza, assessor de Perillo, R$ 500 mil para Perillo, e R$ 1,5 milhão, para o bicheiro. Perillo recebeu três cheques de Cachoeira, em nome de laranjas. As informações são da revista Época.
Segundo a PF, a direção nacional da Delta tinha conhecimento do acerto e autorizou os pagamentos. De acordo com a publicação, a negociação também envolveu Wladmir Garcez, amigo do governador e ex-presidente da Câmara Municipal de Goiânia, e Cláudio Abreu, ex-diretor da Delta no Centro-Oeste. A Delta afirma que Abreu agia sozinho e, em nota, disse não ter conhecimento da apresentação de fatura da empresa ao governador, nem da visita de Garcez ao Palácio para resolver assuntos da empreiteira. Perillo não deu esclarecimentos à Época, afirmando já ter respondido à imprensa.
Acusado de comandar a exploração do jogo ilegal em Goiás, Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, foi preso na Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, em 29 de fevereiro de 2012, oito anos após a divulgação de um vídeo em que Waldomiro Diniz, assessor do então ministro da Casa Civil, José Dirceu, lhe pedia propina. O escândalo culminou na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Bingos e na revelação do suposto esquema de pagamento de parlamentares que ficou conhecido como mensalão.
Escutas telefônicas realizadas durante a investigação da PF apontaram diversos contatos entre Cachoeira e o senador Demóstenes Torres (GO), então líder do DEM no Senado. Ele reagiu dizendo que a violação do seu sigilo telefônico não havia obedecido a critérios legais, confirmou amizade com o bicheiro, mas negou conhecimento e envolvimento nos negócios ilegais de Cachoeira. As denúncias levaram o Psol a representar contra Demóstenes no Conselho de Ética e o DEM a abrir processo para expulsar o senador. O goiano se antecipou e pediu desfiliação da legenda.
Com o vazamento de informações do inquérito, as denúncias começaram a atingir outros políticos, agentes públicos e empresas, o que culminou na abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista do Cachoeira. O colegiado ouviu os governadores Agnelo Queiroz (PT), do Distrito Federal, e Marconi Perillo (PSDB), de Goiás, que negaram envolvimento com o grupo do bicheiro. O governador Sérgio Cabral (PMDB), do Rio de Janeiro, escapou de ser convocado. Ele é amigo do empreiteiro Fernando Cavendish, dono da Delta, apontada como parte do esquema de Cachoeira e maior recebedora de recursos do governo federal nos últimos três anos.
Demóstenes passou por processo de cassação por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética da Casa. Em 11 de julho, o plenário do Senado aprovou, por 56 votos a favor, 19 contra e cinco abstenções, a perda de mandato do goiano. Ele foi o segundo senador cassado pelo voto dos colegas na história do Senado.
"Por favor, me deem a oportunidade de provar minha inocência. Não acabem com a minha vida, nem me deixem disputar outra eleição em 2030", pediu o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) na tribuna do Senado, em uma última tentativa de salvar seu mandato
Foto: Geraldo Magela / Agência Senado
"Alguém disse 'diga-me com quem andas e direi quem és'. Cristo andava com Judas, portanto isso é bobagem. Cada qual pague pelo que fez. Se Carlos Cachoeira cometeu crimes, cana nele. A culpa é dele, não é minha", disse Demóstenes
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil
"O rádio de Cachoeira é o maior advogado que tenho", defendeu-se Demóstenes Torres na tribuna, ao criticar sua condenação por ter usado um rádio celular recebido do contraventor Carlinhos Cachoeira
Foto: Geraldo Magela / Agência Brasil
"Eu sou pai do Ministério Público", disse o senador Demóstenes Torres ao destacar sua trajetória como procurador de Justiça
Foto: Antonio Cruz / Agência Brasil
"Foram três anos de um senador da República gravado indevidamente, ilegalmente", disse o advogado de Demóstenes Torres, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay
Foto: Geraldo Magela / Agência Senado
"Qualquer parlamentar pode mentir quando discursa. No entanto, é um direito de qualquer outro parlamentar não acreditar na mentira do colega e pedir a sua punição", disse o senador Humberto Costa (PT-PE), relator do processo por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética
Foto: Antonio Cruz / Agência Brasil
"Quem julga somos nós. Mas quem condena é o seu passado", declarou Humberto Costa a Demóstenes Torres
Foto: Geraldo Magela / Agência Senado
"O senador Demóstenes adotou conduta incompatível com o decoro parlamentar, ferindo de morte a dignidade do cargo e a ética que se impõe aos parlamentares", disse o senador Pedro Taques (PDT-MT), relator do processo na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ)
Foto: Geraldo Magela / Agência Senado
"Conduta moral e decoro parlamentar não é um favor que fazemos à sociedade. É o dever-ser do parlamentar", disse Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) representante do partido que ingressou com representação contra Demóstenes Torres no Conselho de Ética
Foto: Geraldo Magela / Agência Senado
"Em vez de os reis levarem os ladrões ao paraíso, os ladrões são os que levam consigo os reis ao inferno", afirmou Randolfe Rodrigues, citando Padre Antônio Vieira, religioso e escritor português que viveu no século XVII
Foto: Geraldo Magela / Agência Senado
"O sentimento é de frustração. Estamos aqui constrangidos, muito constrangidos", afirmou a senadora Ana Amélia (PP-RS), ao destacar que a votação da cassação de Demóstenes Torres não era um momento "confortável, prazeroso, alegre"
Foto: Geraldo Magela / Agência Senado
"Senti em meu coração o peso da traição e vi-me, no alto dos meus 30 anos de carreira pública, enganado", afirmou o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) sobre a decepção após ter discursado a favor de Demóstenes Torres quando surgiram as primeiras denúncias
Foto: Geraldo Magela / Agência Senado
"No Brasil, pode-se roubar à vontade, que nada acontece", afirmou o senador Mário Couto (PSDB-PA), ao usar a palavra na sessão para questionar onde estava a moralidade da Casa quando aprovou mudança na lei de licitações destinada a "esconder as despesas da Copa do Mundo"
Foto: Geraldo Magela / Agência Senado
"Não pergunte", respondeu o senador e ex-presidente da República Fernando Collor (PTB-AL) ao ser questionado sobre a sensação de ser cassado
Foto: Geraldo Magela / Agência Senado
"É uma página virada dentro do Senado", finalizou o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP)