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Política

Bancada evangélica é 'atravessada por escândalos', diz Jean Wyllys

5 jul 2013 - 07h37
(atualizado às 07h37)
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<p>Segundo o deputado federal Jean Willys (Psol-RJ) a bancada evangélica da Câmara é 'atravessada por escândalos de corrupção'</p>
Segundo o deputado federal Jean Willys (Psol-RJ) a bancada evangélica da Câmara é 'atravessada por escândalos de corrupção'
Foto: Bruno Santos/Terra

Um dos principais defensores dos direitos LGBT no Legislativo brasileiro e da saída do Pastor Marco Feliciano (PSC-SP) da Comissão de Direitos Humanos  da Câmara dos Deputados,  o deputado federal Jean Wyllys (Psol-RJ) afirmou, em entrevista exclusiva ao Terra, que a bancada formada por parlamentares evangélicos no Congresso Nacional é “atravessada por escândalos de corrupção”, e que os membros do grupo ignoraram o clamor popular vindo das ruas nos protestos em todo o País. “Se você for puxar a ficha das pessoas que compõem a bancada, são todas envolvidas com escândalos de corrupção, com alguma questão local em seus Estados.”

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Segundo Jean, o projeto da "cura gay", defendido por Feliciano na CDH, mas derrubado após a pressão popular nas ruas, foi jogado no lixo “e do lixo ele não vai voltar”, nem mesmo após a tentativa de reapresentação por parte do deputado Anderson Ferreira (PR-PE). “O presidente da Casa (deputado Henrique Eduardo Alves, PMDB-RN) disse ontem que enquanto ele for presidente, o projeto não vai, a Mesa Diretora não vai despachar o projeto. O Anderson reapresentou (o projeto) só por uma pirraça e para dar uma satisfação ao mundinho dele, a seita que ele está ligado, que acha que gay tem que ter cura, e com os argumentos mais malucos”, disse. 

“Pego de surpresa” pelos protestos que tomaram as ruas em diversas cidades do País, Jean julga como positiva a ação do Congresso após as manifestações, mas diz não ter certeza se a postura dos políticos e da própria população mudará, mesmo após o êxito no atendimento de algumas demandas. “Gostaria (que mudasse), mas nós temos outros exemplos aí na história. As pessoas foram para as ruas para tirar o (Fernando) Collor e depois elegeram (Paulo) Maluf. Você vê a contradição entre um pleito, que é tirar um cara acusado de corrupção e eleger outro, em São Paulo... Só para entender que nem sempre essa surpresa da manifestação resulta em uma transformação mesmo, em mexer nas estruturas da sociedade."

Leia a íntegra da entrevista:

Terra - Como tem considerado a ação do Congresso frente às demandas da população apresentadas nos protestos em todo o País?

Jean Wyllys - Eu acho que fomos todos pegos de surpresa por essas manifestações, e eu não falo apenas dos representantes eleitos, mas da sociedade em geral. Todo mundo foi pego de surpresa pelas manifestações. São manifestações complexas, não dá para avaliá-las com uma única régua, com uma única medida. São muitas reivindicações apresentadas. Mas, apesar de estarmos todos surpresos, o Congresso Nacional vem se esforçando para ajustar a pauta legislativa às reivindicações. 

Não precisava de manifestações para que isso acontecesse. Eu acho que o Legislativo como representante do povo deveria estar mais em sintonia (com a população). E há vários meios de você estar em sintonia com os anseios do povo, seja pelos meios tradicionais, como a imprensa, a cobertura que a imprensa faz, seja pelas redes sociais, as novas tecnologias da comunicação que lhe põem em relação com o povo. 

Terra - Você acha então que falta atenção por parte dos parlamentares com as demandas?

Jean - Eu acho que falta. Precisou de um grito (popular) para eles acordarem para a ideia de que são representantes. E, se são representantes, precisam estar em sintonia com o que as pessoas estão querendo. 

É claro que esse ajuste é um ajuste sempre precário, porque somos um País de 200 milhões de habitantes, 513 deputados, defendendo os mais diferentes interesses, que vão dos interesses do mercado aos interesses dos movimentos sociais, todos esses interesses legítimos em uma democracia liberal, já que os ruralistas e os banqueiros tem o direito de fazer o seu lobby lá dentro, assim como os movimentos sociais tem o direito de fazer. Então, é uma agenda que está tentando equacionar os interesses desses diferentes grupos e agora há uma pressão difusa nas ruas, de pessoas que foram para as ruas e que não têm um programa, uma reivindicação concreta. 

(Elas dizem) Ah, eu acho que o Brasil está uma merda. Tá (sic), está uma merda, mas como é que a gente vai resolver isso? Então, as pautas que foram mais claras eu acho que o Legislativo buscou atender, as que estavam mais claras, mais precisas, (como) a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 37, a corrupção como crime hediondo, a (derrubada da) cura gay, que é também uma agenda muito pedida, acho que é dessa maneira. 

Terra - Você acha que essa é uma reação imediata ou vai fazer efeito mesmo no Congresso?

Jean - Eu não gosto de fazer futurologia, mas eu gostaria que essa mudança fosse de médio e longo prazo. Que ela não se esvaziasse. Eu gostaria que a democracia participativa se ampliasse, não só nas manifestações, mas nos próprios meios que a Constituição dispõe de democracia direta e participativa. 

Gostaria, mas nós temos outros exemplos aí na história. As pessoas foram para as ruas para tirar o (Fernando) Collor e depois elegeram (Paulo) Maluf. Você vê a contradição entre um pleito, que é tirar um cara acusado de corrupção e eleger outro, em São Paulo... Só para entender que nem sempre essa surpresa da manifestação resulta em uma transformação mesmo, em mexer nas estruturas da sociedade.

Eu quero crer que isso aconteça, eu quero crer que os deputados e os senadores se assustaram, e os deputados estaduais e os vereadores se assustaram também, quero crer que eles vão tentar sintonizar suas de acordo com as manifestações, e acho que se o gigante despertou mesmo, que ele não tenha sido um despertar breve. Que seja um despertar mais duradouro, porque essa parte do gigante, a metade do gigante que dormia, esqueceu da outra metade dele que estava acordada, que estava em vigília, que eram os movimentos sociais, que eram os partidos, os sindicatos, as ONGs, que são grupos de pressão que já estão lá no Congresso pressionando, dialogando com a gente.

Terra - Como você tem visto a reforma política proposta pela presidente Dilma Rousseff? Ela irá avançar ou não?

Jean - Não avança. O que a presidenta fez foi dizer que vai convocar um plebiscito para decidir se haverá ou não uma Assembleia Constituinte para fazer uma reforma política. Não acho que vá para algum lugar. Acho que a reforma política, se houvesse boa vontade de fazer uma reforma política mesmo, o governo teria mobilizado sua base para aprovar o relatório do (deputado federal) Henrique Fontana (PT-RS), que era um relatório interessante de reforma política. Agora, é para tentar um anseio popular de participação na democracia através de plebiscito, tentar mostrar serviço... Olha, é um plebiscito para decidir a Assembleia Constituinte, para fazer a reforma política. Com isso, você esvazia o problema, quer dizer, você esvazia a indignação diante do problema. 

Acho que (precisa) uma reforma política urgente, mas não pode ser feito dessa maneira. 

Terra - Falta uma vontade imediata de solução?

Jean - Falta, falta. Tanto do governo, na pressão sobre sua base, como da própria base, que poderia ter feito isso. 

Terra - Qual sua opinião a respeito da tentativa, por parte da bancada evangélica, da reapresentação do projeto da cura gay?

Jean - Eu não quero transformar mais um idiota em estrela nacional. Então, me recusei a falar sobre isso ontem (3) o dia inteiro. A imprensa me ligando e eu disse que não ia falar. Não vou dar holofote para mais um estúpido, idiota, no País, como a gente já fez isso. 

Às vezes nós não sabemos que somos cúmplices das nossas próprias desgraças ao eleger essas pessoas, ao dar uma importância a elas. Então, o projeto da cura gay foi jogado do lixo e do lixo ele não vai voltar. 

O presidente da Casa (deputado Henrique Eduardo Alves, PMDB-RN) disse ontem que enquanto ele for presidente, o projeto não vai, a Mesa Diretora não vai despachar o projeto. 

O Anderson (Ferreira) reapresentou (o projeto) só por uma pirraça e para dar uma satisfação ao mundinho dele, a seita que ele está ligado, que acha que gay tem que ter cura, e com os argumentos mais malucos.

O que mais me incomoda nas pessoas que defendem esse projeto é elas não serem honestas com elas mesmas. Elas dizem que o projeto quer garantir ao homossexual o direito de buscar um tratamento. O homossexual tem o direito de buscar o tratamento, só que o tratamento não existe, porque não existe doença, eles (bancada evangélica) não conseguem entender isso. 

Nenhum homossexual em sofrimento psíquico está proibido de buscar ajuda em um psicólogo. O psicólogo não pode oferecer como ajuda a regressão da homossexualidade dele, porque isso não existe, não é verdadeiro, porque isso é anticientífico. Então, por isso só o projeto não tem que existir. 

A gente não tem que dar importância, porque o presidente da Casa se comprometeu que não vai fazer tramitar o projeto e porque a gente não tem de ter mesmo uma nova liderança nacional homofóbica e fundamentalista. Chega. Já temos dois aí. 

Terra - O enfrentamento do Feliciano como presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara acabou?

Jean - O Feliciano tem legalidade. Ele chegou (à presidência) legalmente. Ele não tem legitimidade. A gente tirou a legitimidade dele muito com base em uma estratégia minha. Eu que propus essa estratégia. A gente não vai brigar por aquilo que a gente não vai ter. O ideal é que ele saísse da presidência. Ele não vai sair da presidência por orgulho pessoal, por orgulho do partido dele, pelos acordos que foram feitos na base aliada... Ele não vai sair. 

Então, o que nos resta? É sair da comissão e tirar a legitimidade da comissão. Porque, se a gente permanece, ela continuaria legítima com um presidente dessa natureza. Como eles têm ampla maioria na Comissão de Direitos Humanos, toda proposição seria derrotada com legitimidade. Então eu falei: vamos sair. E a gente saiu, e criou a Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Humanos e (nós) criamos a Subcomissão de Cultura, Direitos Humanos e Minorias.

Isso foi um baque tão grande para eles, que o João Campos (PSDB-GO), que é o autor do projeto da cura gay, entrou com uma representação na Mesa Diretora pedindo a extinção da subcomissão. Eles ficaram mordidos, porque a gente tirou a legitimidade, tirou o espaço político de discussão sobre os direitos humanos. 

Terra - A cura gay foi derrubada após os protestos nas ruas. Logo na sequência, Feliciano criticou a derrubada do projeto e ele foi reapresentado por outro parlamentar da bancada evangélica. Na sua opinião, falta à bancada evangélica a percepção de algumas demandas da população?

Jean - Eles ignoram esse grito. Eles têm o mundo deles, eles falam para um nicho e eles preferem falar para esse nicho do que ouvir, do que se considerar um representante eleito de uma nação plural e, mais importante, pautar sua atuação político no princípio da laicidade, e não nas suas convicções religiosas. Acho que ninguém deveria estar lá para falar a partir de suas convicções religiosas. Mas eles falam. E a obsessão pelos homossexuais, sobretudo o João Campos, que mais tem proposição contra a cidadania LGBT, e ele é talvez até pior que o Marco Feliciano, porque o Feliciano gosta de holofote, e o João não necessariamente gosta de holofote e age nos bastidores.

O João Campos e o Eduardo Cunha (PMDB-RJ) que fazem a articulação e que propõem (projetos contra a cidadania LGBT). 

Terra - O Feliciano disse que a bancada evangélica voltará mais forte em 2015. Isso te preocupa de alguma forma?

Jean - Não me preocupa. Eu não fico preocupado mesmo. Primeiro tem uma fantasia totalitária, a ideia de que (os evangélicos) vão tomar o País. O grito que eles fizeram na Esplanada dos Ministérios, que foi um fracasso, fracasso em relação ao que eles planejaram, claro, (tinha) muita gente, mas, em relação ao que eles planejavam... Disseram que iam botar mais de 500 mil pessoas na Esplanada dos Ministérios e botaram 40 mil. Fracasso então. Mas os gritos eram todos "vamos tomar o Brasil, vamos fazer um presidente da República..." Fantasia totalitária todo mundo tem e ele (Feliciano) tem a sua fantasia de que vai voltar com uma bancada de 180 deputados...

Eu acho difícil, porque ele divide esse eleitorado com outras pessoas. Não é um eleitorado só dele. E ainda que seja só dele, que ele tenha uma votação expressiva, ele vai tirar voto de outras pessoas, não necessariamente quem vai acompanhar ele em uma votação, nem sempre serão evangélicas. São pessoas do partido (PSC), mas podem não ser evangélicas. 

Ainda que venha 180 deputados evangélicos. Nós somos 513. Ainda assim, será uma bancada expressiva, mas será minoria. 

Mesmo a bancada evangélica hoje, ela não é um bloco monolítico. Ela não age de maneira unitária. Eles (parlamentares evangélicos) se unem na temática da cidadania LGBT. Todos são contra. Mas, eles se dividem em outras pautas. É uma bancada atravessada por escândalos de corrupção, se você for puxar a ficha das pessoas que compõem a bancada, são todas envolvidas com escândalos de corrupção, com alguma questão local em seus Estados. 

Fonte: Terra
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