Sem vetos, Dilma sanciona lei sobre vítimas de violência sexual
Nova legislação trata da “profilaxia de gravidez”, ponto considerado polêmico por entidades religiosas, que se mobilizaram ao pedir o veto presidencial
Após uma série de reuniões com ministros envolvidos no assunto, a presidente Dilma Rousseff sancionou nesta quinta-feira a lei que obriga hospitais que fazem parte do Sistema Único de Saúde (SUS) a prestar atendimento emergencial a vítimas de atendimento de violência sexual. Dentre os dispositivos está polêmica envolvendo a adoção da pílula do dia seguinte.
“Esse projeto ao ser sancionado transforma em lei a política que já é estabelecida em portaria do Ministério da Saúde, que garante tratamento humanizado, respeitoso, a qualquer vítima de estupro”, explicou o ministro da Saúde, Alexandre Padilha.
“É exatamente um projeto que além de prestar um apoio humanitário essencial a uma mulher que foi vítima de uma tortura, ele permite que ela não passe por um segundo sofrimento, que é a prática do aborto legal”, acrescentou o ministro da Secretaria Geral, Gilberto Carvalho.
A proposta aprovada pelo Congresso Nacional no último dia 4 lista uma série de serviços que deverão ser oferecidos pela rede pública de saúde. Dentre elas estão amparo médico, psicológico e social, facilitação do registro da ocorrência e encaminhamento ao órgão de medicina legal e às autoridades especializadas com informações que podem ser úteis à identificação do agressor e à comprovação da violência sexual.
Dilma manteve dois incisos que provocaram reação de grupos religiosos, em especial a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). O mais importante é o que fala em profilaxia da gravidez, que segundo o governo, seria a adoção da pílula do dia seguinte para evitar a gestação da vítima. Para a Igreja, o método já seria considerado abortivo.
Ex-seminarista e ainda interlocutor importante da Igreja Católica, Gilberto Carvalho mostrou-se assertivo sobre a importância da nova legislação. “Os dados que nos vêm da Organização Mundial de Saúde sobre a prática e a maneira como a portaria do Ministério da Saúde, mais do que isso, a regulamentação que nós vamos fazer, o tipo de medicamento, o prazo que pode ser usado, ou seja, até 72 horas depois do incidente, faz com que tiremos da nossa cabeça qualquer dúvida sobre o caráter não abortivo dessa pílula, desse medicamento”, disse.
Outro artigo combatido pelos grupos religiosos é o que estabelece o “fornecimento de informações às vítimas dos direitos legais e de todos os serviços sanitários disponíveis”. Um dos direitos já previstos à vítima de estupro é a possibilidade da realização do aborto em qualquer estágio da gestação. No argumento contrário à nova lei, a CNBB alega que esse tipo de informação prestada pelos hospitais poderia induzir à escolha do aborto. Eles defendem que apenas delegacias forneçam esse tipo de informação.
A lei será publicada no Diário Oficial de amanhã e passa a valer em 90 dias, porque ainda precisa de regulamentação.
Governo envia novo projeto para corrigir “imprecisões técnicas”
De acordo com o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, dois pontos sancionados apresentam “imprecisões técnicas” que serão corrigidas por meio de outro projeto de lei que vai tramitar no Congresso Nacional. O primeiro é o que define violência sexual como sexo sem consentimento. Para o governo, a definição exclui o caso de crianças que com menos de 14 anos, que não são aptas a dar consentimento.
O outro ponto é o que suprime o termo “profilaxia de gravidez”. Segundo a mensagem presidencial, a expressão “não é a mais adequada tecnicamente e não expressa com clareza que se trata de uma diretriz para a administração de medicamentos voltados às vítimas de estupro”. O termo a ser utilizado, segundo a proposta do governo, é “medicação com eficiência precoce para prevenir gravidez resultante de estupro”, que restringe a prática especificamente à pílula do dia seguinte.