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Polícia

Entrevista: "Não há boicote da PM à política de segurança"

Em entrevista exclusiva, porta-voz da PM e ex-comandante das UPPs do Rio nega que policiais tenham tentado boicotar estratégias de segurança

20 mai 2015 - 12h54
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O atual momento da segurança pública do Rio é o pior dos últimos nove anos. Mesmo com os números do Instituto de Segurança Pública apontando para diminuição do número de homicídios no Estado, a sensação de insegurança na capital e na Baixada Fluminense estão altos - muito altos. Nos últimos dias foram várias mortes em comunidades consideradas pacificadas, traficantes voltando a exibir armas ostensivamente, turistas e moradores atacados a facadas no centro e na zona sul da cidade, como o caso do ciclista Jaime Bold, morto poucas horas depois da entrevista. Sem falar em flagrantes de corrupção policial.

Nesta entrevista exclusiva ao Terra, o porta-voz da Polícia Militar e ex-comandante das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), coronel Frederico Caldas, respondeu a essas perguntas e admitiu: "Já vivemos momentos melhores”.

Qual é a avaliação da Polícia sobre o momento atual da segurança no Rio de Janeiro?

A gente vive um desafio muito grande, principalmente no processo de reestruturação das UPPs, do processo de pacificação. Já vivemos momentos melhores, de maior solidez, mas o momento agora nos preocupa muito por conta de alguns confrontos e conflitos em áreas pacificadas, o que acabou exigindo de nós uma mobilização muito grande. Tem o desafio da Maré, onde a gente está no processo de substituição das Forças Armadas, e esse processo vai ser concluído até 30 de junho e naturalmente toda preparação para os Jogos Olímpicos no ano que vem. Temos uma série de desafios. Por outro lado, também, os indicadores de criminalidade deste primeiro trimestre já apresentam alguns números que são animadores, embora saibamos que estamos distantes de um momento ideal. O rendimento da polícia em números de prisão e apreensão revelam números bons. O que precisa se buscar nesse momento é a estabilidade nas áreas pacificadas, a consolidação que de fato é um desafio muito grande, e resolver o crime de rua, crime utilizando faca, roubo de veículos, roubo de cargas, que é uma questão pontual. Mas já é possível fazer um balanço desses primeiros meses muito favorável, se olharmos os números de 2014, que foi muito complicado. No final de 2014 os números foram muito ruins. Há uma tendência de queda no número de homicídios, o que nos deixa muito otimistas.

Não é exagerado falar em “áreas pacificadas” em um momento de tanta violência? Pode-se citar São Carlos, Fallet, Coroa, Rocinha, por exemplo.

A gente tem que compreender que são 38 UPPs, 250 comunidades em áreas que historicamente foram sempre muito complicadas. Complexo do Alemão, por exemplo, era o quartel general da principal facção de venda de drogas do Rio e hoje temos problemas em três UPPs: Alemão, Fazendinha e Nova Brasília. Temos que aprender que aquilo é uma verdadeira cidade. A Rocinha, a mesma coisa. Era a segunda maior facção do Rio. Hoje tem problemas? Sim. Mas é totalmente diferente do que era antes da ocupação em 2011. É preciso entender os avanços. Problemas persistem, mas é um cenário muito melhor e mais favorável do que anteriormente. Mas não é algo que se resolva apenas com polícia e nem de um dia para o outro. É preciso amadurecer. São necessários investimentos, é necessário que haja crescimento econômico nessas comunidades para tirar esses jovens ociosos do crime. Um desafio muito grande que não passa apenas pela polícia.

Não é assustador ver as imagens da invasão do morro da Coroa por traficantes vindos do Fallet, pela quantidade de traficantes e armamentos pesados em pleno centro da cidade?

É preocupante, mas é preciso destacar as respostas que foram dadas. Naturalmente a população questiona como em áreas de UPP é possível ver cenas como essa. De alguma maneira esse tipo de confronto. Mas é um desafio que temos. Essa disputa vem da questão da droga e é um mercado muito lucrativo. Enquanto o Brasil não resolver a questão da droga, discutir isso de maneira séria, profunda, vamos continuar nesse jogo na tentativa de minimizar o efeito da droga. O Brasil é o segundo país que mais consome drogas, cocaína, no mundo, o que torna esse mercado muito lucrativo. A sociedade tem que decidir, o poder público tem que decidir. Porque é muito injusto imaginar que só a polícia vai resolver esse problema.

Além do problema das UPPs, a polícia enfrenta problemas como o que foi mostrado na mídia com policiais pedindo propina na estrada a caminhoneiros. Como lidar também com isso?

Primeiro lugar: esse caso mereceu de nós uma manifestação de repúdio imediata. Colocamos na nossa página no Facebook. Os policiais estão presos e foi aberto um Inquérito Policial Militar. Naturalmente, sendo uma corrupção por parte de policiais é compreensível que gere indignação tanto quanto gerou em todos nós. O que temos que fazer é demonstrar transparência e dizer que isso não é comportamento comum dos policiais e, quando acontecer, dar o tratamento necessário. Vão responder ao IPM e ao final vão responder a um conselho de disciplina que pode levá-los à expulsão.

Mas quando a população vai começar a sentir uma baixa nessa sensação de insegurança atual?

Na verdade os quatro primeiros meses deste ano já apontam na redução desses indicadores. É claro que os números são uma coisa e outra é a sensação, a percepção que as pessoas têm no dia a dia. Uma coisa está relacionada à outra. À medida que esses números caiam, isso se reflete na população. Isso é um trabalho bem grande que a gente tem feito. Reforçamos os batalhões, são mais 1900 policiais nas ruas. É importante retomar o policiamento nos morros, no centro da cidade, nos centros comerciais. Não tenho dúvida que os próximos meses serão melhores do que os últimos quatro meses.

Vocês têm a sensação de que pode estar acontecendo um boicote à política de pacificação de dentro da corporação? Os últimos casos no Alemão, de uma senhora idosa e um menino de dez anos, e agora os dois mototaxistas no São Carlos, sugerem algo estranho no ar.

Certamente que não. Esse processo já dura mais de seis anos. Ele está bem consolidado na polícia. É impensável imaginar que um policial esteja fazendo isso de propósito. Que um policial dê um tiro em um jovem de 10 anos de propósito. É preciso saber separar o erro policial da ação dolosa. Não tenho a menor dúvida que não há qualquer tipo de boicote a qualquer política de segurança dentro da corporação.

Fonte: Terra
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