PUBLICIDADE

Polícia

Chacina de Unaí: acusado diz que fazendeiro foi mandante dos crimes

29 ago 2013 - 15h05
(atualizado às 15h05)
Compartilhar
Exibir comentários

O empresário Hugo Alves Pimenta disse à Justiça Federal que foi o fazendeiro Norberto Mânica quem encomendou a contratação de pistoleiros profissionais para assassinar os três auditores fiscais do Trabalho e o motorista do Ministério do Trabalho, no crime conhecido como Chacina de Unaí. O depoimento foi prestado ao tribunal do júri iniciado esta semana em Belo Horizonte para julgar três dos oito réus no processo judicial sobre o caso.

saiba mais

Os assassinatos ocorreram em 28 de janeiro de 2004, na cidade de Unaí (MG), e os acusados dos crimes começaram a ser julgado na última terça-feira. Em sua página na internet, o Ministério do Trabalho classifica o episódio como um "dos mais bárbaros atos contra o combate pelo Estado à supressão de direitos trabalhistas no Brasil". O depoimento do empresário foi prestado na quarta-feira.

Pimenta responde pelo crime de homicídio doloso triplamente qualificado e está colaborando com a Justiça em troca do benefício da delação premiada. Já Norberto Mânica, além de homicídio qualificado, também responde pelos crimes de resistência e frustração de direito trabalhista.

Pimenta e Norberto Mânica estão entre os oito acusados de participação no homicídio dos fiscais do Trabalho Eratóstenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares e Nelson José da Silva, além do motorista Aílton Pereira de Oliveira. Os quatro foram emboscados e mortos a tiros durante uma fiscalização de rotina na zona rural da cidade mineira.

Esta semana estão sendo julgados Rogério Allan Rocha Rios, Erinaldo de Vasconcelos Silva e William Gomes de Miranda. Acusados de executar o crime, os três estão detidos desde 2004 em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte. Segundo a acusação, os três foram contratados por Francisco Elder Pinheiro, que morreu em janeiro deste ano, aos 77 anos de idade.

Segundo o Ministério Público Federal (MPF), um mês antes do assassinato, Norberto Mânica recebeu uma multa milionária por infringir a legislação trabalhista. "Com a execução do único auditor fiscal do Trabalho lotado na região, Norberto Mânica pretendeu assegurar a execução desses outros crimes (fiscais e trabalhistas)', aponta a acusação. Entre os outros crimes praticados pelo fazendeiro estariam fraude a direitos trabalhistas, pagamento de salários abaixo do valor mínimo legal estipulado, retenção de carteiras de Trabalho e falta de registro dos seus empregados.

Acusados divididos em grupos

Os oito acusados foram divididos em dois grupos, o dos que já estão presos em caráter preventivo - e que estão sendo julgados esta semana - e o dos que respondem ao processo em liberdade. O segundo grupo de réus deve ir a julgamento no dia 17 de setembro. Além de Norberto Mânica e de Hugo Pimenta, estão entre os que respondem ao processo em liberdade José Alberto de Castro (empregado de Pimenta) e Humberto Ribeiro dos Santos. A expectativa é que o fazendeiro Antério Mânica, irmão de Norberto, também vá a julgamento no mesmo dia.

Ontem, segundo dia da sessão de julgamento dos três primeiros réus, os trabalhos começaram às 9h20 e prosseguiram até por volta das 23h, com uma breve pausa para almoço durante o dia. Hugo Pimenta depôs na condição de réu colaborador, escolhido pela acusação. Apontado pelo Ministério Público Federal como "testa de ferro de Norberto Mânica", o empresário narrou detalhes de como os acusados tentaram encobrir os crimes. E confirmou a existência do elo identificado pela Polícia Federal entre Norberto Mânica e os três executores do crime.

Outros depoimentos

Também prestaram depoimento na condição de testemunhas de acusação, o delegado e atual chefe do Departamento de Investigação de Homicídios e Proteção à Pessoa da Polícia Civil mineira, Wagner Pinto de Souza, e o investigador da Polícia Civil João Alves de Miranda. Foram ouvidas ainda quatro testemunhas de defesa de Rios, um dos réus. Uma delas foi o próprio irmão, Paulo Rodolfo Rocha Rios, que garantiu que, no dia do crime, o réu estava em Salvador, comemorando o aniversário do pai de sua então namorada, Rosedalva Gonçalves.

Convocada a depor, Rosedalva também disse que Rios esteve no churrasco de aniversário de seu pai. Não foram, contudo, apresentadas até o momento fotos que confirmem que Rios esteve presente à comemoração, fato explorado pela acusação. As outras duas testemunhas de defesa, o porteiro Jorge das Neves, e um amigo de Rios, Ademir de Souza Mota, reiteraram que o acusado estava em Salvador no dia dos crimes. Os trabalhos foram retomados essa manhã. 

 

Chacina em Unaí

No dia 28 de janeiro de 2004, os fiscais do trabalho Eratóstenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares e Nelson José da Silva e o motorista Aílton Pereira de Oliveira foram emboscados em uma estrada de terra, próxima de Unaí, enquanto faziam visitas de rotina a propriedades rurais. O carro do Ministério do Trabalho foi abordado por homens armados que mataram os fiscais à queima-roupa, atados aos cintos de segurança. A fiscalização visitava a região por conta de denúncias contra trabalho escravo. Em memória das vítimas da chacina, o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo é celebrado em 28 de janeiro.

Sete meses após a chacina, em 30 de agosto de 2004, o Ministério Público Federal em Minas Gerais (MPF-MG) denunciou oito pessoas pelos homicídios: Norberto Mânica, Hugo Alves Pimenta, José Alberto de Castro, Francisco Elder Pinheiro, Erinaldo de Vasconcelos Silva, Rogério Alan Rocha Rios, Willian Gomes de Miranda e Humberto Ribeiro dos Santos. 

A investigação prosseguiu com relação à participação de outros suspeitos. Considerado um dos maiores produtores de feijão do País, o fazendeiro e prefeito da cidade à época, Antério Mânica, e seu irmão, Norberto Mânica, eram alvos frequentes de fiscalizações para coibir exploração de trabalhadores rurais. Em 20 de setembro de 2004, Antério foi denunciado como mandante dos homicídios pela Procuradoria Regional da República da 1ª Região (PRR1).

Por duas vezes, Antério Mânica foi eleito prefeito de Unaí. A primeira foi em 2004, meses depois do crime. O gestor de Unaí chegou a ser preso em 2007, mas conseguiu a liberdade por meio de habeas corpus. Mesmo após as acusações, foi reeleito em 2008.

Apesar da rapidez na apuração e acusação dos envolvidos, nove anos depois, o caso ainda não foi a julgamento pelo Tribunal do Júri, em razão, principalmente, dos recursos interpostos por alguns dos acusados. Em fevereiro de 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a remessa imediata dos autos à Seção Judiciária de Minas Gerais para julgamento dos réus presos. O processo chegou à 9ª Vara Federal de Belo Horizonte no mês de maio. No entanto, em janeiro deste ano, a juíza declarou-se incompetente para a condução do processo. 

Agência Brasil Agência Brasil
Compartilhar
Publicidade
Publicidade