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Caso Bruno

Defensor de Bola, Quaresma se diz livre do crack e admite exageros

1 jun 2012 - 10h03
(atualizado às 10h14)
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Ney Rubens
Direto de Belo Horizonte

O advogado Ércio Quaresma surgiu na defesa do goleiro Bruno de Souza ainda antes do atleta ser preso, em 7 de julho de 2010. Assim que a informação de que a ex-amante de Bruno Eliza Samudio havia sido sequestrada e morta foi dada pela polícia, o defensor entrou em cena. Primeiro pelas palavras e expressões fortes proferidas durante as dezenas de entrevistas que concedeu. Depois pelas confusões em que esteve envolvido.

Ércio Quaresma foi advogado de Bruno e hoje defende o ex-policial Marcos Aparecido dos Santos, o Bola
Ércio Quaresma foi advogado de Bruno e hoje defende o ex-policial Marcos Aparecido dos Santos, o Bola
Foto: Ney Rubens / Especial para Terra

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Como na vez que invadiu uma das salas do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) para interromper a entrevista do delegado Edson Moreira e cobrar cópias do processo, que até aquele momento não haviam sido repassadas aos advogados. Até ser chamado à atenção pela juíza Marixa Fabiane porque dormia em audiência e o afastamento da defesa do goleiro depois da suspensão determinada pela OAB-MG, logo após ter revelado que era dependente químico, na época usuário de crack.

Dois anos depois do desaparecimento de Eliza, Quaresma voltou ao caso e segundo ele, recuperado da dependência e pronto para defender seu novo cliente, desta vez o ex-policial Marcos Aparecido dos Santos, o Bola, de quem diz ser amigo pessoal. Bola é acusado de ser a pessoa que estrangulou e depois sumiu com o corpo de Eliza, não sem antes, segundo a polícia, supostamente esquartejá-la e jogar pedaços aos cães que tinha em casa.

Durante mais de uma hora de conversa com o Terra em seu escritório, ele fez um resgate dos principais fatos caso, reconheceu erros, como a superexposição na mídia; falou da dependência química e dos atritos com policiais e a juíza Marixa, que vai presidir o júri popular de Bruno e os outros acusados.

O primeiro dos assuntos foi a conturbada fase de investigação policial. Quaresma chegou a bater boca via imprensa e até pessoalmente com os delegados responsáveis pela apuração. Em um dos seus relatórios, colocou apelidos pejorativos como "paquita" nos delegados Júlio Wilke, Alessandra Wilke, Ana Maria Santos e Édson Moreira que, para ele, impediam naquele momento que os acusados pudessem se defender.

"Houve uma dificuldade por parte da Polícia Civil, por parte do chefe das investigações, de acesso ao inquérito. Isso gerou nossa ação junto à OAB para que eles acompanhassem. Foi tudo muito midiático. Houve um embate midiático que eu hoje fazendo uma reflexão não deveria ter sido levado ao extremo. A denúncia foi oferecida, eu fiquei com o Bruno e cada um dos outros foram para outros advogados. Achei que seria de melhor tom cada um com seu representante, para ser assistido", disse.

Os policiais envolvidos, principalmente o delegado-chefe do DHPP, Édson Moreira, afirmaram na época que Quaresma usava de artifícios para manipular a imprensa e aparecer. Ele negou: "houve uma ocasião em que eu estava no Rio de Janeiro e a Dayanne (ex-mulher do Bruno) foi levada para depoimento. À época minha esposa assistia ao Bruno e à Dayanne, junto com outros advogados, e eles foram impedidos de ingressar no Departamento de Investigação. Essa moça foi levada ao departamento e a ela foi dito que eu preferi estar em um programa de TV. Eu achei interessante participar desse programa porque achava importante reportar o que estava acontecendo pelo lado do Bruno".

Afirmou ainda que foi Moreira quem mais se utilizou da grande exposição na mídia para afirmar o crime que, segundo Quaresma, está sustentado por uma versão "fantasiosa" apresentada pelo primo de Bruno, que tinha então 17 anos: "a maneira como é descrita pelo menor, no primeiro depoimento tomado de forma absolutamente ilícita pela polícia do Rio de Janeiro, que gerou o decreto de prisão, que foi empregado meio cruel. Vasculharam a casa do Bola e fizeram análise de solo, raio-x do subsolo, e nada foi encontrado".

"É uma situação delicada. Um dos réus, se não estiver enganado o Flávio (Caetano de Araújo, motorista de Bruno), suportou oito meses de prisão para ser impronunciado. Quem vai pagar esse moço? O que vai restaurar a dignidade dele, da família dele? Dayanne, Fernanda, Wemerson, permaneceram acusados de um crime de homicídio que é sustentado pela acusação de que houve uma orquestração de nove pessoas para matar Eliza Samudio. Corpo esse que até hoje não apareceu, e se quer se sabe se houve o evento morte", disse.

Apesar de não mais defender Bruno, Quaresma ainda sustenta que o goleiro é inocente: "ela (Eliza) esteve em Belo Horizonte, dez dias antes no Rio de Janeiro. Os caseiros do sítio prestam depoimento e dizem que ela estava livre. Perícia foi feita no sitio e não encontraram nada, capilar, material genético. Não encontraram nenhum vestígio de cárcere naquele lugar. Eu vi em um veículo, em uma reportagem, e está inclusive no processo, afirmando que um vizinho viu a Eliza rodando no sitio. É a primeira vez que vejo isso, uma pessoa em cárcere passeando pela piscina, por todo o sítio. Eu já vi isso em novelas, que uma pessoa presa fica livre e solto em volta da piscina".

"Dizem que ela foi levada ao Bola para ser executada juntamente com a criança (o filho de Eliza e Bruno, Bruninho). Cidadão esse que conheço, é meu amigo pessoal, e de uma hora para outra virou o serial killer da cidade. (...) O que causou tanto medo? Foi a cena do evento morte. 'Você vai morrer', disse Eliza quando pedia para não ser mais agredida, segundo Edson Moreira. Pontapés e golpe de gravata e depois o corpo picado, cadê as provas disso?", questionou.

Dependência química

Durante a fase de instrução, já no Fórum de Contagem (MG), uma nova face de Quaresma foi revelada por ele mesmo. Depois de ser supostamente chantageado por uma pessoa que teria um vídeo com ele fumando crack em uma favela, o advogado procurou os jornalistas e confessou o vício. Na época, disse que tomava medicamentos para abstinência, o que provocava sono, tendo, inclusive, dormido durante uma das audiências.

"Eu estava com estresse, tomava medicação e cochilei (no dia). Quando eu vi, acordei, perguntei a juíza se tinha roncado, ele afirmou que sim. Eu pedi desculpas, me expliquei, e afirmei que não repetiria nenhuma pergunta. Eu fiquei por 2 horas perguntando e não repeti nada e foi rechaçada a ineficiência". Por conta da divulgação do vídeo, exibido por uma emissora de televisão, Quaresma foi impedido pela OAB-MG de exercer a profissão por 90 dias. A partir daí iniciou um tratamento e, agora, se diz curado.

"O tratamento que recebi no Tribunal (de Justiça de Minas Gerais) foi de um reconhecimento muito grande. Em todas as câmaras que passei não houve nenhum episódio. Existem colegas que não gostavam de mim, mas quem gostava passou a admirar mais porque eu não saí pela porta dos fundos, eu fui á frente da OAB esclarecer tudo o que feito", disse.

Por fim, desabafou sobre o vício e, principalmente, sobre o tratamento. "Eu vou tomar a liberdade de falar: não chegue perto da droga. Depois da arma nuclear é o composto mais destrutivo. Não há privilégios, ela o torna escravo, destrói valores. Essa substância te torna escravo, e é difícil sair. Tem cura, o crack pode ser vencido". E concluiu: "pretendo continuar trabalhando porque eu nasci advogado".

O caso Bruno

Eliza desapareceu no dia 4 de junho de 2010 quando teria saído do Rio de Janeiro para Minas Gerais a convite de Bruno. No ano anterior, a estudante paranaense já havia procurado a polícia para dizer que estava grávida do goleiro e que ele a agrediu para que ela tomasse remédios abortivos. Após o nascimento da criança, Eliza acionou a Justiça para pedir o reconhecimento da paternidade de Bruno.

No dia 24 de junho, a polícia recebeu denúncias anônimas de que Eliza havia sido espancada por Bruno e dois amigos dele até a morte no sítio de propriedade do jogador, localizado em Esmeraldas, na Grande Belo Horizonte. Na noite do dia 25 de junho, a polícia foi ao local e recebeu a informação de que o bebê apontado como filho do atleta, então com 4 meses, estava lá. A então mulher do goleiro, Dayanne Rodrigues do Carmo Souza, negou a presença da criança na propriedade. No entanto, durante depoimento, um dos amigos de Bruno afirmou que havia entregado o menino na casa de uma adolescente no bairro Liberdade, em Ribeirão das Neves, onde foi encontrado.

Enquanto a polícia fazia buscas ao corpo de Eliza seguindo denúncias anônimas, em entrevista a uma rádio no dia 6 de julho, um motorista de ônibus disse que seu sobrinho participou do crime e contou em detalhes como Eliza foi assassinada. O menor citado pelo motorista foi apreendido na casa de Bruno no Rio. Ele é primo do goleiro e, em dois depoimentos, admitiu participação no crime. Segundo a polícia, o jovem de 17 anos relatou que a ex-amante de Bruno foi levada do Rio para Minas, mantida em cativeiro e executada pelo ex-policial civil Marcos Aparecido dos Santos, conhecido como Bola ou Neném, que a estrangulou e esquartejou seu corpo. Ainda segundo o relato, o ex-policial jogou os restos mortais para seus cães.

No dia seguinte, a mulher de Bruno foi presa. Após serem considerados foragidos, o goleiro e seu amigo Luiz Henrique Romão, o Macarrão, acusado de participar do crime, se entregaram à polícia. Pouco depois, Flávio Caetano de Araújo, Wemerson Marques de Souza, o Coxinha Elenilson Vitor da Silva e Sérgio Rosa Sales, outro primo de Bruno, também foram presos por envolvimento no crime. Todos negam participação e se recusaram a prestar depoimento à polícia, decidindo falar apenas em juízo.

No dia 30 de julho, a Polícia de Minas Gerais indiciou todos pelo sequestro e morte de Eliza, sendo que Bruno foi apontado como mandante e executor do crime. Além dos oito que foram presos inicialmente, a investigação apontou a participação de uma namorada do goleiro, Fernanda Gomes Castro, que também foi indiciada e detida. O Ministério Público concordou com o relatório policial e ofereceu denúncia à Justiça, que aceitou e tornou réus todos os envolvidos. O jovem de 17 anos, embora tenha negado em depoimentos posteriores ter visto a morte de Eliza, foi condenado no dia 9 de agosto pela participação no crime e cumprirá medida socioeducativa de internação por prazo indeterminado.

No início de dezembro, Bruno e Macarrão foram condenados pelo sequestro e agressão a Eliza, em outubro de 2009, pela Justiça do Rio. O goleiro pegou quatro anos e seis meses de prisão por cárcere privado, lesão corporal e constrangimento ilegal, e seu amigo, três anos de reclusão por cárcere privado. Em 17 de dezembro, a Justiça mineira decidiu que Bruno, Macarrão, Sérgio Rosa Sales e Bola serão levados a júri popular por homicídio triplamente qualificado, sendo que o último responderá também por ocultação de cadáver. Dayanne, Fernanda, Elenilson e Wemerson também irão a júri popular, mas por sequestro e cárcere privado. Além disso, a juíza decidiu pela revogação da prisão preventiva dos quatro. Flávio, que já havia sido libertado após ser excluído do pedido de MP para levar os réus a júri popular, foi absolvido. Além disso, nenhum deles responderá pelo crime de corrupção de menores.

Fonte: Especial para Terra
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