PUBLICIDADE

O nacionalismo getulista e a 2ª Guerra Mundial

22 ago 2014 - 17h04
(atualizado às 17h10)
Compartilhar
Exibir comentários

Desde o ingresso na carreira política até o seu último ato, o suicídio, Getúlio Vargas se mostrou um estrategista preocupado com a soberania nacional e o fortalecimento do País. O jornalista e escritor José Augusto Ribeiro, autor de A Era Vargas (2001), defende que o ex-presidente viveu inspirado pela ideia de unir a independência política do Brasil com a econômica. O autor cita uma passagem de 1906, quando Vargas, então com 24 anos, foi designado pelos colegas da faculdade para elaborar o discurso de saudação ao presidente Afonso Pena, durante visita ao Rio Grande do Sul.

Legado de Vargas sobrevive 60 anos depois de sua morte

Getúlio Vargas 'continua vivo' nas redes sociais

A morte e as polêmicas do estadista gaúcho

Conta Monteiro que Getúlio protestou contra o fato de o País importar produtos industrializados fabricados a partir da matéria-prima que ele mesmo exportava. Era o caso, por exemplo, do minério de ferro usado para construir trilhos, locomotivas e itens metalúrgicos buscados no exterior. Também o Brasil exportava café e importava café solúvel.

No dia 3 de outubro de 1953, o então presidente, Getúlio Vargas, assina a Lei 2.004 que criou a Petrobras
No dia 3 de outubro de 1953, o então presidente, Getúlio Vargas, assina a Lei 2.004 que criou a Petrobras
Foto: Petrobras / Divulgação

Sua proposta, até então inédita, era agregar valor ao produto nacional. Para colocar isso em prática, logo que chegou ao poder, criou a Companhia Siderúrgica Nacional, em acordo firmado com o governo norte-americano, assim como a Vale do Rio Doce, com o intuito de otimizar as exportações, além de lançar a Usina Hidrelétrica de Paulo Afonso, primeira geradora de energia sob controle nacional, que iniciou operações quatro meses após a sua morte.

Para Ribeiro, no entanto, a maior realização de Vargas foi enfrentar e vencer uma campanha violenta instalada contra ele e seu objetivo de criar a Petrobras. “Se ele sacrificou a vida pelas suas realizações, isso se deveu em grande parte ao petróleo”, afirma. O escritor conta que Getúlio foi, por diversas vezes, incitado a desistir da ideia. “Ele não desistiu e nos deu esse presente fantástico que foi o pré-sal”, diz Ribeiro, em referência à recente descoberta de petróleo em águas profundas.

“Getúlio foi responsável por inúmeras medidas regulatórias em setores diversos para os quais não havia regras unificadas nacionais”, concorda o professor Marcelo Steffens, para quem a CSN e a Petrobras foram as obras mais perenes e coerentes por explicitar a genuína preocupação do estadista com a indústria de base nacional.

O pesquisador destaca ainda o interesse do ex-presidente pelo patrimônio artístico nacional, a criação de institutos de regulação em setores diversos da economia, como a produção de café, na agricultura, e até a regulação do funcionalismo público. Foi ele quem proibiu o acúmulo de cargos públicos por um único cidadão e que estabeleceu que a seleção para as vagas aconteceria por concurso público.

“Eu prefiro considerar Getúlio como portador de um projeto de modernização nacional, em muitos momentos autoritária, mas que buscou a integração e a articulação do território e, em especial, reconheceu o papel fundamental do homem brasileiro neste processo. Para Getúlio e seu grupo político e intelectual, o grande problema nacional não era o homem brasileiro, considerado pelos liberais como inapto e fadado ao eterno fracasso, mas como as elites europeizadas e litorâneas mal utilizavam a riqueza nacional natural e humana”, diz.

Negociador em meio à Segunda Guerra Mundial

A habilidade de negociador de Getúlio Vargas apareceu em diversos momentos de seu mandato, em especial nas relações exteriores e, inclusive, durante o período da 2ª Guerra Mundial. O ex-presidente brasileiro foi acusado de apoiar o chamado Eixo Nazifascista, liderado pela Alemanha de Adolf Hitler. Para o escritor José Augusto Ribeiro, isso se deve às constantes relações comerciais entre o Brasil e o país europeu durante o governo Vargas.

O presidente americano Franklin Roosevelt se encontrou com o presidente Getúlio Vargas para acertar o envio de tropas do Brasil para combater na Segunda Guerra Mundial
O presidente americano Franklin Roosevelt se encontrou com o presidente Getúlio Vargas para acertar o envio de tropas do Brasil para combater na Segunda Guerra Mundial
Foto: Reprodução

Na década de 30, os alemães eram fiéis ao algodão brasileiro, assim como grandes compradores do café e do cacau aqui produzidos. Ao mesmo tempo, o governante tinha nos Estados Unidos, líder do grupo dos Aliados, um forte parceiro político e comercial a quem não interessava a aproximação entre Brasil e Alemanha.

Segundo Ribeiro, Vargas soube jogar com a situação para fortalecer as relações comerciais do Brasil. Para ele, o principal ganho da sua estratégia está materializado em Volta Redonda, no Rio de Janeiro, sede da Companhia Siderúrgica Nacional. “Ao perceber a entrada dos alemães na economia do Brasil, Roosevelt (Franklin, então presidente dos Estados Unidos) deu ordem para financiar o projeto siderúrgico brasileiro”, afirma. “Getúlio Vargas conseguiu (a siderúrgica) com a sua habilidade política”, acrescenta. O acordo selou o empréstimo de US$ 100 milhões para o Brasil e, em troca, bases militares norte-americanas foram instaladas no Nordeste brasileiro.

Em 1942, o Brasil ingressou na Segunda Guerra Mundial ao lado das forças que combatiam o nazismo. De acordo com Ribeiro, Vargas rompeu com Hitler muito antes de os EUA o fazerem, reafirmando que não havia ligação brasileira com o Eixo. “Em 1938, ele expulsou o embaixador alemão no Brasil (Karl Ritter)”, menciona.

Juremir Machado também destaca a luta de Vargas contra a influência alemã e lembra que esse fato, inclusive, rendeu a ele alguns desafetos no Brasil. A chave da discórdia está no desmantelamento da seção brasileira do Partido Nazista, a maior do mundo depois da alemã, além da obrigatoriedade de uso da língua portuguesa por imigrantes germânicos no País.

Ao lado dos vencedores

Para o americano R. S. Rose, doutor em Sociologia e pesquisador do Centro de Estudos Brasileiros da Universidade de Washington, o alinhamento de Vargas com o EUA não se deu exatamente pelas razões atribuídas ao ex-presidente.

“Vargas alinhou o Brasil com os Estados Unidos só depois que verificou que os Aliados eram o grupo mais forte dos poderes, se posicionando para o domínio do mundo”, considera. Para Rose, não está claro se Getúlio sabia dos planos norte-americanos para instalar bases no Nordeste. Além disso, a visita de Roosevelt, em 1936, foi um passo importante na política de boa vizinhança para tirar o Brasil da suposta neutralidade - o que, na sua visão, só se confirmaria em 1942, com o afundamento de navios brasileiros na costa por iniciativa de submarinos do Eixo.

Quanto ao apoio do Brasil na Segunda Guerra Mundial, Rose entende que esse pensamento ignora o fato de que uma parcela considerável dos oficiais do Brasil foram contra os Aliados e a favor do Eixo. “Na verdade, o líder da Força Exédicionária Brasileira (FEB), general Mascarenhas de Moraes, foi a terceira escolha para liderar a FEB. Outros oficiais optaram por não apoiar a causa dos Aliados”, conclui.

GHX Comunicação GHX Comunicação
Compartilhar
TAGS
Publicidade
Publicidade