PUBLICIDADE

Alteração da certidão de óbito do pai emociona filho de Herzog

26 set 2012 - 16h08
Compartilhar
Ivo Herzog administra, atualmente, o Instituto Vladimir Herzog, em São Paulo. Na foto, com o pai, em 1966.
Ivo Herzog administra, atualmente, o Instituto Vladimir Herzog, em São Paulo. Na foto, com o pai, em 1966.
Foto: Instituto Vladimir Herzog / Divulgação
Natália Pithan

Há quase 40 anos lutando para que a morte de Vladimir Herzog fosse devidamente esclarecida, a família do jornalista finalmente conseguiu legitimar a versão que defende desde 1975. Na última segunda-feira, uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo comprovou e reconheceu as certezas da família sobre as causas da morte de Vlado.

De acordo com a resolução, o atestado de óbito de Herzog será retificado fazendo constar que sua "morte decorreu de lesões e maus-tratos sofridos em dependência do II Exército - SP (Doi-Codi)", e não mais suicídio. Para o filho do jornalista e diretor do Instituto Vladimir Herzog em São Paulo, Ivo Herzog, o parecer constitui um resultado histórico. "Devemos lembrar que este processo foi levado pela Comissão da Verdade, que muito vem sendo criticada. Nós, família Herzog, estamos muito felizes e emocionados com esta decisão", comentou.

Para o amigo Paulo Markun, autor do livro "Meu Querido Vlado", a insistência da família, a pressão dos jornalistas, a coragem de advogados e de dois juízes mudaram o final dessa história. Ele conta que, na ocasião da morte do colega de TV Cultura, os chefes do Doi-Codi reuniram alguns poucos jornalistas que estavam presos e tentaram convencê-los de que Herzog era um agente da KGB que se suicidara pra não confessar. "Apresentaram uma história maluca, em que a direção do clandestino Partido Comunista seria feita por gente acima de qualquer suspeita, como um governador e um cardeal. Nenhum de nós acreditou", relatou.

Markun afirmou, ainda, que a versão do suicídio de Herzog foi mantida a mando do general Geisel graças a um inquérito policial-militar encomendado para confirmar o fato. "O documento tinha requintes de absurdo, como a foto que mostrava o corpo de Vlado com as pernas dobradas, pendurado numa grade onde ninguém conseguiria se enforcar", declarou.

A versão oficial, na época, foi refutada pelos movimentos sociais de resistência à ditadura militar. Uma semana após a morte do jornalista, em outubro de 1975, cerca de oito mil brasileiros participaram de uma missa ecumênica organizada por D. Paulo Evaristo Arns, pelo reverendo James Wright e pelo rabino Henri Sobel.

Três anos mais tarde, no dia 27 de outubro de 1978, o processo movido pela família do jornalista revelou a verdade sobre a morte de Herzog. A União foi responsabilizada pelas torturas e pela morte do jornalista. Foi o primeiro processo vitorioso movido por familiares de uma vítima do regime militar contra o Estado.

A deliberação do juiz Márcio Martins Bonilha Filho, da 2ª Vara de Registros Públicos do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concede um importante precedente para que outras famílias torturadas pelo mesmo sofrimento possam fazer justiça. "Ela abre as portas para que os que perderam gente querida naquela época sigam o mesmo caminho e possam ter um documento que recupere a verdade sobre o destino daquela gente", afirmou Ivo. "O atestado de óbito afinal reescrito prova que a verdade tarda, mas aparece", concluiu Markun.

Investigação

Em junho deste ano, o Brasil alegou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, entidade da Organização dos Estados Americanos (OEA), que a Lei da Anistia impede que se abra no País uma investigação sobre a morte do jornalista, ocorrida em 1975.

O Brasil foi obrigado a se pronunciar oficialmente sobre o caso após parentes do jornalista e organizações de direitos humanos terem encaminhado a denúncia à Comissão Interamericana, em 2009. O pedido de investigação foi feito por quatro entidades que atuam na defesa de direitos humanos no Brasil. Elas querem que o País investigue o caso, processe e puna os responsáveis pela morte do jornalista.

No documento de resposta, o governo brasileiro diz que criou a Comissão Nacional da Verdade para apurar casos de violações aos direitos humanos ocorridos na ditadura militar e que o caso de Vlado poderia ser incluído na comissão. Na sequência, a família Herzog solicitou à comissão a retificação do atestado de óbito, que foi aceita por unanimidade pelos membros.

Fonte: Terra
Compartilhar
TAGS
Publicidade