PUBLICIDADE

Em Brasília, 'concurseiros' apoiam as greves dos servidores

14 ago 2012 - 06h12
(atualizado às 11h36)
Compartilhar

A greve que se alastrou por cerca de 30 órgãos federais e deve levar à Esplanada dos Ministérios nesta terça-feira pelo menos mil servidores que pleiteiam aumentos salariais tornou-se assunto recorrente nas rodas de candidatos a cargos públicos. À porta de um dos maiores centros de preparação para concursos em Brasília, o Gran Cursos, estudantes engrossavam o coro dos manifestantes.

Fiscais federais agropecuários protestam em frente ao Ministério da Agricultura, em Brasília
Fiscais federais agropecuários protestam em frente ao Ministério da Agricultura, em Brasília
Foto: Marcello Casal Jr / Agência Brasil

"Se estivesse lá, também faria greve", diz a aluna de pedagogia da Universidade de Brasília (UnB) Cecília de Souza, 22 anos, que busca um cargo técnico no Ministério da Fazenda. Segundo ela, aumentos salariais tendem a motivar os servidores, melhorando a qualidade dos serviços públicos.

"A hora de batalhar é agora", diz Fernando Freitas, 25 anos, que prestará concursos para as polícias Civil e Militar do Distrito Federal. Os dois órgãos têm feito paralisações em prol de melhores condições. "O governo diz que não tem dinheiro, mas abre os cofres para organizar uma Copa do Mundo. O mundo hoje tem um outro olhar sobre o Brasil, a máquina pública não pode ficar obsoleta", afirmou ele à BBC Brasil.

Também em busca de um cargo no setor de segurança pública, Thiago Fassanaro, 29 anos, cita outros argumentos em defesa do movimento. "O crescimento da economia e a ascensão da nova classe média exigem mais serviço público."

Aumento do setor público

Souza, Freitas e Fassanaro integram um grupo cada vez maior de brasileiros que buscam ingressar em carreiras públicas, atraídos pelo aumento de vagas e pelas vantagens concedidas nas últimas décadas ao setor.

Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), durante o governo Lula, 155.534 pessoas foram contratadas em concursos públicos da administração federal, número três vezes maior que os 51.613 ingressantes na gestão de Fernando Henrique Cardoso.

No entanto, de acordo com o órgão, a saída de servidores por aposentadoria fez com que o número de funcionários ativos na administração federal em 2010 (631 mil) ficasse abaixo do pico medido em 1992 (680 mil). Em 2011 e 2012, o número de funcionários se manteve estável.

Segundo o dono do Gran Cursos, José Wilson Granjeiro, cerca de 5 milhões brasileiros prestavam concursos públicos anualmente no início da década de 1990. Em 2011, diz ele, o número subiu para 30 milhões. Nos últimos anos, diz Granjeiro, a concorrência pelas vagas aumentou com a ascensão dos brasileiros mais pobres. Hoje, segundo ele, metade dos que se preparam para concursos públicos pertencem às classes C e D.

O empresário afirma que a procura por cargos públicos também cresce motivada pela crise econômica mundial, que gera maior instabilidade na iniciativa privada. "Eles (os candidatos) querem a certeza do contracheque no fim do mês."

Afinidade

Granjeiro diz que uma enquete entre seus alunos revelou que, ao pleitear cargos públicos, os candidatos buscam, por ordem de importância, estabilidade profissional, salário maior que o do setor privado, benefícios e status conferido pelo posto. Embora a estabilidade continue a ser considerada a principal vantagem do setor, ele afirma que com o aumento da oferta de carreiras públicas, boa parte dos candidatos, ao optar por disputar um concurso, tem levado cada vez mais em conta as afinidades pessoais. "São pessoas predispostas a contribuir com o seu talento para o engrandecimento da administração pública."

Ele diz que esses profissionais se concentram em órgãos que têm implantado gratificações por produtividade e remunerações iniciais mais altas. "A partir de 1995, constituímos verdadeiras ilhas de excelência em órgãos como o Ministério Público Federal, Receita, Polícia Federal, Banco Central, Itamaraty, Magistratura e Advogacia Geral da União."

No entanto, segundo o empresário, ao elevar os salários iniciais das carreiras nobres para torná-las mais atraentes, o governo reduziu a variação entre as remunerações inicial e final desses servidores, gerando queixas entre as categorias. De acordo com cálculo do jornal Folha de S. Paulo, a despesa média mensal com servidores do Executivo saltou de R$ 2.840 per capita, no início da gestão Lula, para R$ 7.690 atualmente, alta de 170% em um período em que a inflação foi de 70%.

"Como o aumento dos salários iniciais foi muito maior do que a inflação, o governo parou de dar recomposição (aos demais servidores) para equilibrar os gastos. Isso mobilizou as grandes categorias", explica Granjeiro.

Regulamentação
Nem todos os candidatos a cargos públicos entrevistados pela BBC Brasil, porém, apoiam as greves. Para o administrador Adriano Prado, 29 anos, que busca cargo no setor financeiro do governo , "é preciso separar o joio do trigo". "Alguns setores têm razão, como professores e profissionais da saúde. Outros já ganham muito bem", argumenta.

Para Adriano Prado, a ausência de regras sobre o direito de greve dos servidores fez a mobilização fugir do controle. Um projeto de lei sobre o tema tramita no Congresso há anos, mas não há sinais de que seja votado num futuro próximo.

BBC News Brasil BBC News Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização escrita da BBC News Brasil.
Compartilhar
TAGS
Publicidade