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Polícia

Pichação expõe desigualdade social de SP, diz 'New York Times'

29 jan 2012 - 15h55
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A cruzada das autoridades paulistanas contra a "poluição visual", que inclui o banimento de outdoors e a demolição de edifícios abandonados, se entrelaça com um conflito social mais profundo deixado à mostra por uma forma de expressão que não encontra igual em outras cidades: a pichação. A constatação é do jornal americano The New York Times, que em sua edição dominical afirma que os jovens que se armam de tinta preta e latas de spray estão tomando parte em uma luta contra o sistema, representado pela paisagem que a sociedade tenta manter higienizada.

"Praticamos uma guerra de classes, e há baixas na guerra. Somos comparados a barbáros, e talvez haja alguma verdade nisso", afirma Rafael Guedes Augustaitiz, 27 anos, praticante do que o periódico americano cita como um "alfabeto concebido para a invasão urbana".

Segundo o jornal, a pichação reflete a decadência do meio urbano e as profundas divisões de classe que definem a São Paulo de quase 20 milhões de habitantes. As assinaturas deixadas em muros, arranha-céus, monumentos e prédios públicos seriam um "lembrete" das "mazelas sociais" que o crescimento econômico brasileiro até aqui não conseguiu resolver - e que, segundo o jornal, podem estar se acentuando.

A reportagem do NYT afirma que os brasileiros ficaram "arturdidos" neste mês diante dos conflitos de moradores do bairro Pinheirinho, em São José dos Campos (SP), com a Polícia Militar, que cumpria no local ordem judicial de reintegração de posse. De acordo com o texto, o protesto contra o prefeito Gilberto Kassab (PSD) na última semana no centro de São Paulo foi uma reação à violência observada no Pinheirinho e nas ações de "limpeza" da Cracolândia.

"É positivo ver outros reagindo com indignação contra nossa elite. Corremos riscos para lembrar a sociedade que, para começar, esta cidade já é uma agressão visual e hostil a qualquer pessoa que não seja rica", diz Djan Ivson Silva, pichador de 27 anos.

Ainda que o graffiti paulistano seja respeitado como uma arte de rua, acabando inclusive exposto em galerias internacionais, a pichação permanece de fora dessas convenções. "Eles fazem edifícios parecerem grotescos e muros parecerem repugnantes", afirma Telma Sabino, uma secretária de 45 anos.

Por outro lado, a pichação chama a atenção de acadêmicos, que identificaram que a forma de expressão difere daquelas derivadas do graffiti colorido da Nova York dos anos 1970. A herança seria, antes, a tipografia pela qual são reconhecidas bandas de rock como Iron Maiden, adeptas de letras góticas e runas vikings. Para os pichadores, diz o jornal, o graffiti é uma forma "menor" de expressão por ser facilmente cooptada pela cena artística comercial.

Para o espanto dos paulistanos que repudiam a pichação da sociedade que "derrama poucas lágrimas" diante das mortes dos pichadores que se arriscam para deixar a sua marca, afirma o jornal, a prática começa a ser abraçada pelo meio artístico estrangeiro. Uma gangue chegou a ser convidada para a Bienal de Arte Contemporânea em Berlim. O lavador de carros Luiz Henrique do Vale Salles, 40 anos, discorda dos curadores berlinenses. Ele era pago para lavar muros pichados. "Como limpador da bagunça deles, eu me sentia horrível."

Fonte: Terra
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