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Política

Educadores: teste aplicado em Tiririca não prova alfabetização

12 nov 2010 - 18h07
(atualizado às 22h04)
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Thais Sabino
Direto de São Paulo

Escrever o próprio nome, palavras ditadas e ler um texto não testa a alfabetização, e o conhecimento necessário para a realização da prova pode ser adquirido em menos de um mês. Segundo a professora de português Rosimara Vianna, o que um exame deste tipo checa é a "decodificação". Ela se refere ao exame feito na última quinta-feira pelo deputado federal eleito Francisco Everardo Oliveira Silva (PR-SP), o Tiririca, que comprovou no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de SP que sabe ler e escrever.

Tiririca fez um teste no Tribunal Regional Eleitoral para comprovar alfabetização
Tiririca fez um teste no Tribunal Regional Eleitoral para comprovar alfabetização
Foto: Levi Bianco / Futura Press

"A aquisição dos códigos, reconhecimento das letras, juntar letras e formar sílabas e sílabas para fazer palavras e frases não significa que ele entende os códigos, ele decodifica", disse a professora. De acordo com Rosimara, quando a criança aprende a ler, ela reconhece as palavras, as lê separadamente, mas não sabe contar o que leu após terminar um texto, não existe compreensão. A pessoa reconhece, mas não absorve.

"No caso do Tiririca, queremos um legislador que saiba argumentar, entender os projetos de lei, compreender e formar uma opinião a respeito", afirmou ela. Para provar o nível de alfabetização dele, o teste aplicado pelo TRE-SP na última quinta-feira é insatisfatório. O ideal, para a professora, seria pedir ao candidato para redigir uma autobiografia, ou transmitir os próprios pensamentos para o papel.

"Escrever o que uma pessoa dita é fácil, basta conhecer o alfabeto. Produzir um texto, somente quem é alfabetizado consegue. Redigir um texto ditado depois de 30 dias de aula ele consegue", disse Rosimara Viana.

Além disso, segundo o professor do núcleo de educação da Universidade de Brasília (UnB), especializado em alfabetização de adultos, Renato Hilário dos Reis, "quando se aprende rápido não há a consolidação do aprendizado, a tendência é a pessoa desaprender e voltar ao que era". O professor afirmou que, pela lei, alguém que redige um texto de cinco linhas já é considerado alfabetizado.

"É um conhecimento superficial e mecânico, isso o teste prova se a pessoa sabe ou não, o problema é que a pessoa olha para as palavras, mas não sabe o que querem dizer", disse Reis. Para ele, a situação está distante da alfabetização. "É preciso constituir um conceito político no sujeito, alfabetizá-lo para tornar possível que ele saiba escrever sobre o seu conceito historio e produzir um texto."

Promotor vai pedir novo teste para Tiririca

O promotor de Justiça Eleitoral da 1ª Zona de São Paulo, Maurício Antonio Ribeiro Lopes, vai entrar com um mandado solicitando um novo teste de alfabetização para Tiririca. Em nota, o promotor afirmou que o TRE impediu o Ministério Público (MP) de demonstrar que teriam ocorrido os crimes de falsidade ideológica e falsificação de documento na declaração de escolaridade entregue por Tiririca na candidatura.

O presidente do TRE-SP, desembargador Walter de Almeida Guilherme, afirmou que Tiririca leu e escreveu durante um teste realizado na manhã da última quinta-feira. O magistrado explicou que ele passou por um ditado com um trecho de um parágrafo recolhido do livro Justiça Eleitoral: Uma Retrospectiva, edição de 2005, página 51. "A promulgação do Código Eleitoral, em fevereiro de 1932, trazendo como grandes novidades a criação da Justiça Eleitoral", escreveu Tiririca, segundo o TRE. Ele também foi submetido a um teste de leitura e interpretação com manchetes do Jornal da Tarde como "Procon manda fechar loja que vende produto vencido" e "O tributo final a Senna".

Semi-analfabeto consegue se candidatar

Mesmo após apresentar diploma de formação no 4º ano do Ensino Fundamental, o candidato a vereador em Januária (MG), Wanderley Frederico Paulo Teixeira (PMN), foi submetido a um teste pelo TRE em agosto de 2008. Teixeira teve problemas ao realizar o teste oral e escrito aplicado pelo TRE. Por causa dos erros de grafia e dicção foi considerado semi-analfabeto. No entanto, a decisão do juiz foi favorável à candidatura de Teixeira.

Segundo o TRE-SP, não existe uma regra de como a prova que testa o nível de alfabetização do candidato deve ser. Cada tribunal tem livre escolha no desenvolvimento do teste, apesar disso, eles costumam seguir um padrão: leitura e redação de texto ditado. O caso do candidato a vereador de Ibirama (SC), Severino Ancini, em 2004, foi parecido. Ele também possuía diploma de alfabetização e, no entanto, foi submetido a um teste no TRE. A decisão caracterizou a escrita e leitura do vereador como "lastimável" e "precária". Porém, como ele conseguiu realizar a prova, não teve a candidatura cassada.

Candidatos cassados

Em setembro de 2008, o candidato a vereador em São Paulo, Ademir Gomes de Almeida, foi barrado pelo TRE. Apesar de saber escrever o próprio nome, Almeida não conseguiu redigir um texto ditado no tribunal. Na decisão, o juiz Paulo Alcides, relator, afirmou que "o teste de aferição realizado pelo recorrente está a demonstrar, de forma categórica, que ele não possui domínio, sequer rudimentar, da leitura e da escrita e sabe apenas escrever seu nome."

O registro da candidata a vereador em Campos de Jordão (SP) Diva dos Santos da Silva também foi cassado após ela não conseguir ler o texto apresentado no exame para comprovar se era alfabetizada e também por ela ter dificuldade em redigir as palavras ditadas.

Mesmo após ser suplente, o candidato a vereador em Peruíbe (SP) Carlos Pereira dos Santos foi submetido ao teste de alfabetização. Segundo a decisão do tribunal, os erros ortográficos ao escrever o texto ditado comprovaram que ele não possuía nível suficiente de alfabetização para exercer o cargo. A candidatura de Santos foi cassada em setembro de 2008.

O candidato a vereador de Embu-Guaçu (SP), Edvaldo Santos de Jesus, apesar de apresentar comprovante de ter cursado o 2º ano do Ensino Fundamental, foi reprovado na prova escrita aplicada pelo TRE da cidade. Por conta disso, foi impedido de se candidatar em setembro de 2008.

Fonte: Especial para Terra
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