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'Não queremos tirar nada dos brasileiros', diz boliviana

Imigrantes têm sido alvo de preconceito após notícia de que podem participar de programas como o Bolsa Família; concessão do benefício é direito previsto no Estatuto do Estrangeiro

11 dez 2014 - 08h56
(atualizado às 10h30)
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A boliviana Margoth Ibanez Vasquez, 37 anos. Ela mora há 20 anos no Brasil e quer entrar para o programa Minha Casa, Minha Vida
A boliviana Margoth Ibanez Vasquez, 37 anos. Ela mora há 20 anos no Brasil e quer entrar para o programa Minha Casa, Minha Vida
Foto: Débora Melo / Terra

A indignação com que parte dos brasileiros recebeu a notícia de que imigrantes também podem participar de programas sociais como o Bolsa Família revelou, mais uma vez, um lado xenófobo da população. Embora essa possibilidade fosse praticamente desconhecida até então, o benefício já é estendido a estrangeiros residentes no País desde a criação do programa, em 2003, e, segundo o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, 42.091 imigrantes já recebem Bolsa Família no País.

Bolsa Família: 42 mil imigrantes já recebem o benefício 

“Os brasileiros são muito bons, mas eu também vejo muita discriminação, ouço muito ‘não tem casa nem para brasileiro, vai ter para estrangeiro?’. A gente não quer tirar nada de ninguém. Estamos trabalhando e fazendo a nossa parte. Só queremos o que for de nosso direito”, diz a boliviana Margoth Ibanez Vasquez, 37 anos, que mora há 20 anos no Brasil e quer entrar para o programa Minha Casa, Minha Vida – também estendido aos estrangeiros. “Não sabia que imigrante podia participar”, diz ela.

Enquanto o Minha Casa atende famílias com renda de até R$ 1,6 mil mensais, o alvo do Bolsa Família são aquelas em situação de pobreza e extrema pobreza (renda de até R$ 154 por mês por pessoa).  A oferta dos benefícios atende ao Estatuto do Estrangeiro (lei 6.815/1980), que afirma que “o estrangeiro residente no Brasil goza de todos os direitos reconhecidos aos brasileiros”.

<p>O congolês Louison Mbombo, 19 anos (de cinza), trabalha no Centro de Referência e Acolhida para Imigrantes (Crai) de São Paulo e também quer entrar para o Minha Casa, Minha Vida</p>
O congolês Louison Mbombo, 19 anos (de cinza), trabalha no Centro de Referência e Acolhida para Imigrantes (Crai) de São Paulo e também quer entrar para o Minha Casa, Minha Vida
Foto: Débora Melo / Terra

É a certeza de estar indo atrás de um direito que também motiva o refugiado congolês Louison Mbombo, 19 anos, a pleitear acesso ao Minha Casa, Minha Vida. Apesar de gostar na vida do Brasil, ele afirma que o preconceito é uma barreira a ser superada. “No Brasil existe preconceito, mas é um preconceito escondido, porque é crime. Mas tem muito preconceito contra imigrante e negro. Pretendo um dia ser médico aqui, mas será que vão aceitar que eu trate um paciente?”, questiona.

Margoth e Mbombo fazem faz parte do quadro de funcionários do Centro de Referência e Acolhida para Imigrantes (Crai) de São Paulo, que receberá até sexta-feira estrangeiros de baixa renda interessados em aderir ao CadÚnico (cadastro único), que garante acesso ao Bolsa Família, ao Minha Casa, Minha Vida e a outros 13 programas sociais do governo. O mutirão faz parte do 2º Festival de Direitos Humanos da prefeitura, mas o cadastro pode ser feito a qualquer momento nas unidades do Centro de Referência de Assistência Social (Cras) e do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas).

Segundo Cleyton Borges, coordenador do Crai, a contratação de imigrantes garante que a equipe fale até seis idiomas: português, inglês, espanhol, francês, árabe e crioulo haitiano. “Queremos atender todos os imigrantes, independentemente de seu status migratório e de sua nacionalidade”, diz Borges, lembrando que o centro também oferece assistência jurídica e psicológica e cursos aos estrangeiros.

Combate ao trabalho escravo

A boliviana Mery Eliza Apaza Yuyra, 27 anos, foi ao Crai na tarde de terça-feira para se cadastrar no Bolsa Família, mas deve ficar de fora da faixa de renda do programa. Ela conta que tem três filhos com idades entre um mês e quatro anos, nascidos no Brasil, e que o dinheiro que recebe com o marido pelo trabalho em uma confecção não cobre todos os gastos da família. “Temos que pagar aluguel, luz, água, fralda, leite, alimentação. É muito pouco”, diz.

A boliviana Mery Yuyra, 27 anos, quer tentar receber o benefício do Bolsa Família
A boliviana Mery Yuyra, 27 anos, quer tentar receber o benefício do Bolsa Família
Foto: Débora Melo / Terra

Assim como Mery, Margoth nunca passou por situação de trabalho degradante, mas conta que seu marido, também boliviano, sofreu quando chegou ao Brasil. “Ele passou por essa dificuldade. Trabalhava em uma confecção clandestina”, diz Margoth.

De acordo com Guilherme Otero, assessor da coordenação de politicas para imigrantes da Secretaria de Direitos Humanos da Prefeitura de São Paulo, a inclusão de estrangeiros em programas sociais é fundamental para diminuir a vulnerabilidade dos grupos. “Eles chegam ao País sem trabalho, não falam português e não conhecem a legislação brasileira. Isso tudo os deixa em situação vulnerável e eles acabam caindo em condições análogas à escravidão. Então, políticas como essas contribuem para que fiquem menos vulneráveis e possam pensar melhor antes de aceitar qualquer oferta de trabalho.”

Segundo Otero, o dever da coordenação da secretaria é "promover os direitos da população imigrante que está vivendo no Brasil". "Ao contrário do que muita gente acredita, os imigrantes contribuem para a dinamização da economia, são empreendedores e pagam impostos como qualquer um."

 
Fonte: Terra
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