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Human Rights cobra Alckmin e Congresso contra tortura

Relatório da entidade de defesa do direitos humanos listou ao menos 64 casos cometidos por agentes do Estado desde 2010; a maioria, sem qualquer tipo de punição

28 jul 2014 - 12h56
(atualizado em 29/7/2014 às 19h13)
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A organização não-governamental Human Rights Watch encaminhou nesta segunda-feira uma carta ao Congresso Nacional e ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), cobrando ações que combatam e previnam a prática de tortura cometida por agentes do Estado. Por meio de nota, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) afirmou que "não tolera desvios de conduta." 

A ação acontece após a divulgação pela entidade, também hoje, de um relatório no qual aponta haver “fortes indícios” do envolvimento de agentes estatais em pelo menos 64 casos de tortura ou tratamento cruel, desumano ou degradante ocorridos desde 2010. Em 40 dos 64 casos, destacou a HRW, os abusos “constituíram efetivamente tortura”. Em relação ao Congresso, a entidade pretende que, tão logo acabe o recesso parlamentar, no início de agosto, seja priorizada a votação do projeto de lei que determina prazo máximo de 24 horas após prisão em flagrante para presos serem conduzidos à presença de um juiz.

A SSP informou que "todas as denúncias são rigorosamente investigadas e, comprovadas as irregularidades, os responsáveis são penalizados civil e criminalmente.". Segundo a pasta, "entre 2010 e 2014, 1.497 servidores estaduais das áreas de segurança foram expulsos ou demitidos dos respectivos órgãos por desvio de conduta."

O documento constatou que, apesar de essas violações ocorrerem com mais frequência nas primeiras 24 horas da prisão, não é raro presos terem que esperar três meses ou mais para serem conduzidos à presença de um juiz –figura para a qual poderiam denunciar os abusos sofridos.

Dos casos investigados, destacou a entidade, 26 ocorreram em São Paulo, Estado que concentra a maior população carcerária do País. “As autoridades paulistas devem adotar medidas para combater essas violações, como instalar um mecanismo estadual de prevenção e combate à tortura para monitorar casos e padrões desses abusos”, pediu a HRW em carta enviada separadamente a Alckmin.

Casos citam de violência sexual a choques elétricos

O relatório aponta que mais de 150 policiais, agentes penitenciários ou agentes do sistema socioeducativo estiveram envolvidos nos casos analisados em São Paulo, no Rio de Janeiro, no Espírito Santo, na Bahia e no Paraná. “As violações ocorreram em diversas localidades, incluindo nas ruas, no interior de residências, viaturas policiais, delegacias e unidades de detenção, variando de espancamentos severos e ameaças de violência física e sexual a aplicação de choques elétricos, sufocamento com sacos plásticos e violência sexual”, diz trecho do levantamento.

Segundo a diretora da Human Rights Watch Brasil, Maria Laura Canineu, o Brasil vem adotando medidas para combater a tortura, “mas muito mais deve ser feito”.

“Quando pessoas presas têm que esperar meses para serem apresentadas a uma autoridade judicial, é improvável que denunciem abusos sofridos durante a sua abordagem — e, resolvendo fazê-lo, muitas vezes não dispõe dos meios para comprovar os abusos porque marcas físicas já desapareceram”, destacou Maria Laura, em comunicado à imprensa.

Projeto no Congresso

O projeto de lei do Senado nº 554 de 2011, atualmente em análise pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, prevê que pessoas presas em flagrante sejam conduzidas à presença de um juiz no prazo máximo de 24 horas para uma “audiência de custódia.” 

Para a HRW, essas audiências permitirão que vítimas de tortura ou tratamento cruel, desumano ou degradante denunciem abusos imediatamente, enquanto provas ainda estão preservadas, além de contribuir para a exclusão de confissões e outras provas obtidas por meio de tortura de processos criminais, declarou a Human Rights Watch.

Em agosto de 2013, a Presidente Dilma Rousseff sancionou uma lei que criou um Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, composto por 11 peritos com poderes para realizar visitas periódicas a locais de privação de liberdade civis e militares. Em abril de 2014, o Conselho Nacional de Justiça publicou uma recomendação que estabelece normas básicas que devem ser seguidas por magistrados que receberem denúncias fundadas da prática de tortura e tratamento cruel, desumano ou degradante. 

PMs do Caso Amarildo aparecem em relatório

Entre os casos citados pelo relatório, há o dos policiais militares envolvidos no desaparecimento do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, 47 anos, em julho do ano passado, na Rocinha, zona sul do Rio de Janeiro. O documento destacou que os PMs “torturaram vários outros moradores da Rocinha em 2013”. 

“Por exemplo, na véspera da prisão de Amarildo, policiais militares levaram o jovem, X.Z., de 16 anos, ao Centro de Comando e Controle da Rocinha e o ameaçaram com violência sexual, colocaram sua cabeça dentro de um vaso sanitário cheio de fezes e o forçaram a ingerir cera líquida para que revelasse os nomes de traficantes de drogas, conforme relataram os pais do jovem à Human Rights Watch e ao Ministério Público”, diz trecho do relatório.

Impunidade é regra, diz HRW

Outro ponto destacado pela Human Rights Watch no estudo foi a impunidade dos casos de tortura ou tratamento cruel, desumano e degradante por agentes estatais –entre eles policiais, agentes penitenciários e agentes do sistema socioeducativo.

Em relação a isso, a entidade observou que das 122 denúncias de tortura, lesão corporal e maus tratos cometidos entre 1 de janeiro de 2011 e 1 de julho de 2013 e apresentadas à Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo,  nenhuma delas resultou em punições contra os policiais envolvidos. 

“A Justiça Militar do Estado de São Paulo recebeu pelo menos 4.000 casos de suposta prática de lesão corporal por policiais militares entre janeiro de 2011 e julho de 2013. Porém, somente 53 policiais foram condenados pela prática desse crime neste período”, completou o relatório.

O governo de São Paulo ainda não se pronunciou sobre a carta encaminhada pela Human Rights Watch Brasil.

Fonte: Terra
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