Fux rejeita intolerância e vota por reconhecimento de união gay
5 mai2011 - 15h14
(atualizado às 18h05)
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Laryssa Borges
Direto de Brasília
O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu nesta quinta-feira o reconhecimento legal de parceiros gays no regime de uniões estáveis e, ao votar no processo em que a Corte analisa a possibilidade de garantia de direitos civis para parceiros homossexuais, disse que relações entre pessoas do mesmo sexo também são consideradas entidades familiares.
O Supremo analisa dois processos que poderão selar o reconhecimento de direitos civis para homossexuais e abrir caminho para a garantia, por casais gays, de práticas como a adoção, o recebimento de herança e pensão e o direito de tornarem-se dependentes em planos de saúde e de previdência.
Nos processos a serem analisados, os magistrados discutem, entre outros, a abrangência do artigo 226 da Constituição, que prevê que "para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar" e do artigo 1723 do Código Civil, que reconhece como família "a união estável entre o homem e a mulher".
"A união homoafetiva enquadra-se no conceito de família. A pretensão é que se confira juridicidade a essa união homoafetiva para que eles (homossexuais) possam sair do segredo, sair do sigilo, vencer o ódio e a intolerância em nome da lei", observou Luiz Fux.
Com sua opinião, coincidente com a do relator, Carlos Ayres Britto, dois dos dez ministros que deverão opinar nos processos já se manifestaram de forma favorável ao reconhecimento de direitos civis a casais gays. O plenário é composto por 11 integrantes, mas o ministro José Antonio Dias Toffoli deve se declarar impedido, uma vez que atuou como advogado-geral da União (AGU) no caso e deu, no passado, parecer sobre o processo.
"A Constituição Federal brasileira conspira em favor dessa equalização da união homoafetiva em relação à união estável. A homossexualidade é um traço da personalidade, não é uma crença, não é uma ideologia e muito menos uma opção de vida. Se ela é um traço da personalidade, isso significa dizer que ela caracteriza a humanidade de uma determinada pessoa. Homossexualidade não é crime. Então por que o homossexual não pode constituir uma família? O homossexual não pode por força de duas questões abominadas pela nossa Constituição: a intolerância e o preconceito", disse o ministro Luiz Fux em seu voto.
Ele lembrou ainda que é papel do Poder Judiciário "suprir lacunas" caso o Congresso Nacional, responsável por criar leis, não tenha garantido legalmente direitos civis aos gays. "Nós somos governo. Se o legislador não faz, compete ao tribunal suprir essa lacuna", declarou, observando haver a necessidade de uma "conquista emancipatória dos homoafetivos".
"A Constituição Federal, quando consagrou a união estável, ela positivamente não quis excluir a união homoafetiva. Talvez o legislador constitucional tenha entendido até desnecessário. Há uma liberdade sexual consagrada como cláusula pétrea", completou Fux, perfazendo o placar parcial de dois ministros em favor do reconhecimento dos direitos a parceiros do mesmo sexo.
Veja como votou cada ministro sobre união estável gay
Foto: Carlos Humberto - STF / Divulgação
Carlos Ayres Britto: Relator do caso, em seu voto, realizado na terça-feira, ele defendeu a garantia de uniões estáveis para casais gays e disse que a preferência sexual de cada indivíduo não pode ser utilizada como argumento para se aplicar leis e direitos diferentes aos cidadãos. Ressaltou o direito à intimidade sexual de cada um, a ampliação do conceito de família para além do par homem-mulher e defendeu uma "concreta liberdade" para os casais homossexuais
Foto: STF / Divulgação
Luiz Fux: Primeiro a votar após suspensão do julgamento, o ministro foi a favor do reconhecimento legal de parceiros gays no regime de uniões estáveis. O ministro afirmou que a Constituição Federal permite o reconhecimento de casais gays como entidades familiares e lembrou que é papel do Poder Judiciário "suprir lacunas" caso o Congresso Nacional, responsável por criar leis, não tenha garantido legalmente direitos civis aos homossexuais
Foto: Carlos Humberto - STF / Divulgação
Cármen Lúcia: Baseou sua defesa ao reconhecimento de direitos civis a casais gays no cumprimento do direito à liberdade, cláusula pétrea da Constituição. Condenou "atos de covardia e violência" contra minorias, como os impostos aos casais homossexuais, e observou que o Direito constitucional discutido no Supremo tem também por objetivo combater "todas as formas de preconceito"
Foto: Carlos Humberto - STF / Divulgação
Ricardo Lewandowski: Afirmou que as uniões homoafetivas devem ser reconhecidas pelo Direito, "pois dos fatos nasce o direito". Fez a ressalva de que a Constituição faz referência apenas a uniões estáveis entre homens e mulheres, mas observou que isso não significa que "a união homoafetiva não possa ser identificada como entidade familiar apta a receber proteção estatal"
Foto: Carlos Humberto - STF / Divulgação
Joaquim Barbosa: Votou a favor do reconhecimento legal de parceiros gays no regime de uniões estáveis, e admitiu que o Direito não foi capaz de acompanhar as mudanças e criações de novos perfis familiares. O ministro disse ainda que não há na Constituição "qualquer alusão ou proibição ao reconhecimento jurídico das uniões homoafetivas". "Todos, sem exceção, tem direito a uma igual consideração", afirmou
Foto: Carlos Humberto - STF / Divulgação
Gilmar Mendes: Também favorável ao reconhecimento de uniões estáveis para parceiros gays, disse que a decisão garante um "modelo mínimo de proteção institucional como instrumento para evitar uma caracterização continuada de crime, de discriminação". No entanto Evitou afirmar em que proporção a decisão da maioria afetaria na prática os direitos dos casais gays
Foto: Felipe Sampaio - STF / Divulgação
Ellen Gracie: Ressaltou que reconhecimento de direitos aos casais homossexuais coloca o Brasil entre países mais avançados do mundo. "Uma sociedade decente é uma sociedade que não humilha seus integrantes. O tribunal lhes restitui o respeito que merecem, reconhece seus direitos, restaura sua dignidade, afirma sua identidade e restaura sua liberdade", disse a ministra
Foto: Felipe Sampaio - STF / Divulgação
Marco Aurélio Mello: Lembrou que anualmente cerca de 100 homossexuais são assassinados no Brasil por conta de sua orientação sexual e disse que o reconhecimento de direitos civis a parceiros do mesmo sexo fortaleceria o Estado democrático de Direito. "O Brasil está vencendo a guerra desumana contra o preconceito, o que significa fortalecer o Estado democrático de Direito. O livre arbítrio também é um valor moral relevante", declarou
Foto: Felipe Sampaio - STF / Divulgação
Celso de Mello: Decano do STF, Mello buscou separar a religião de direitos que devem ser garantidos pelo Estado e opinou que nenhum cidadão pode ser privado de seus direitos por ser homossexual, sob pena de estar inserido em um regime de leis "arbitrárias e autoritárias". "Ninguém, absolutamente ninguém pode ser privado de seus direitos nem sofrer quaisquer restrições de ordem jurídica por motivo de sua orientação sexual", disse
Foto: Felipe Sampaio - STF / Divulgação
Cezar Peluso: Opinou que a Constituição Federal não exclui em seus artigos "outras modalidades de entidade familiar". "Seria imperdoável que eu tentasse acrescentar alguma coisa, sobretudo em relação a essa postura consensual da Corte em relação à condenação de todas as formas de discriminação e contrárias não apenas ao nosso direito constitucional, mas à raça humana", resumiu o presidente do STF, confirmando a unanimidade do julgamento