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Em um ano, Jogos de 2016 vão de 'mais atrasados' a 'andando nos trilhos'

29 abr 2015 - 13h50
(atualizado em 30/4/2015 às 11h11)
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Júlia Dias Carneiro

Renato Sette Camara / Prefeitura do Rio
Renato Sette Camara / Prefeitura do Rio
Foto: BBC Mundo / Copyright

Da BBC Brasil no Rio de Janeiro

Um ano após puxão de orelha, preparativos olímpicos passaram no teste mais recente; essa foto foi tirada em abril deste ano

Há exatamente um ano, reverberava como uma bomba a declaração do vice-presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI) John Coates que, durante um fórum na Austrália, disse que os Jogos do Rio eram os "mais atrasados" que já tinha visto.

Foi a mais contundente de uma série de críticas e notícias de atrasos nos preparativos para 2016 naquele mês de abril, incluindo a decisão do COI de enviar um emissário – logo chamado de "interventor" – para auxiliar na coordenação dos preparativos no Rio.

Um ano depois do puxão de orelha, os preparativos para 2016 passaram no teste da última Convenção Internacional da SportAccord – que congrega as entidades de esportes olímpicas e não-olímpicas e teve seu encontro anual em Sochi, na Rússia, na semana passada.

Essa é a imagem de um lado das arenas do Parque Olímpico em maio de 2014

O tom mudou, e o bombardeio deu lugar a elogios como os proferidos pelo presidente da Associação das Federações Olímpicas Internacionais (Asoif), Francisco Ricci Bitti – que, no ano passado, dissera tratar-se "da situação mais crítica de uma preparação nos últimos 20 anos, pelo menos".

Em Sochi, Bitti mostrou otimismo, dizendo que a situação no Rio está "totalmente diferente". Nem todos os problemas estão resolvidos, afirmou, mas houve um progresso "significativo" e os próximos jogos vão ser "especiais".

O que tanto mudou de um ano para cá?

Prazos, diplomacia e 'fator Copa'

De acordo com as autoridades ouvidas pela BBC Brasil, além de progresso concreto nas construções e do fato de todas as instalações esportivas estarem no prazo – ainda que alguns bastante apertados –, esforços de comunicação, uma certa diplomacia e o "fator Copa" ajudaram a aumentar a confiança no Rio.

Christophe Dubi, diretor executivo do COI, conta à BBC Brasil que o tom geral em Sochi era de que os preparativos "haviam entrado nos trilhos", o que atribui a uma série de avanços.

"O progresso nas instalações esportivas ajudam a explicar a mudança de humor", afirma Dubi.

As obras em Deodoro eram o principal ponto de preocupação no ano passado. Embora o complexo vá sediar provas de 11 modalidades esportivas, as obras ainda nem haviam sido licitadas. A construção enfim teve início em julho de 2014 e, de acordo com a Empresa Olímpica Municipal, está no prazo.

Vista aérea da Vila dos Atletas, em dezembro de 2013

E o avanço das obras em abril de 2015

Além de Deodoro, porém, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, considera que a Copa foi outro fator decisivo para virar o jogo.

"Deodoro realmente estava muito atrasado, e a gente conseguiu recuperar o passo. Mas além disso há um ceticismo, ou havia, naquele momento, em relação à capacidade do Brasil de sediar grandes eventos", afirma.

"Aí veio a Copa, que o Brasil realizou com muito sucesso. As coisas funcionaram, o país funcionou, a vida girou."

Acalmar ânimos

O fato de previsões pessimistas sobre o Mundial não terem se confirmado ajudaram a acalmar os ânimos olímpicos, acredita Paes.

O panorama no Parque Olímpico também mudou. Se no ano passado havia pouco para se ver – e era preciso explicar que a maior parte das estruturas prontas eram as subterrâneas – hoje as instalações esportivas estão bastante avançadas. As arenas que abrigarão as provas de basquete, judô e esgrima, por exemplo, serão entregues no terceiro trimestre.

"O cenário mudou completamente, as obras do Parque Olímpico saíram do chão, as obras estão no prazo", diz Mario Andrada, diretor de comunicação do Comitê Rio 2016, que participou das apresentações em Sochi.

Depois do "alerta" do COI, ele diz que o comitê fez "o dever de casa" em dois níveis: além do avanço nas obras em si, houve um esforço diplomático para aprimorar as relações com as federações de esportes – de conversar, informar, responder às preocupações.

"Isso é parte do jogo. Além de correr para entregar os locais e montar os eventos-teste, diplomacia é uma parte integrante do que as pessoas esperam que a gente entregue. A gente ainda não tinha essa percepção", diz Andrada.

"Hoje, você não tem mais federações se perguntando – 'o que está acontecendo no Rio?' Elas estão sendo mais informadas e todos estão mais satisfeitos", diz Christophe Dubi.

Mas nem em todas áreas há avanços, e a Baía de Guanabara é hoje o caso mais emblemático.

Na semana passada, o presidente da Federação Internacional de Vela (Isaf, na sigla em inglês) ameaçou não realizar competições dentro da baía caso medidas não fossem tomadas rapidamente para limpar o corpo d’água, descrito por velejadores como "um esgoto a céu aberto".

Cinco raias estão previstas para as Olimpíadas, três dentro da baía e duas fora, em mar aberto. Em entrevista à agência de notícias AP, Fox disse que, se não houver melhora, apenas as raias de fora seriam usadas, e que entidades da vela estão "frustradas" com a morosidade do governo do estado.

Centro de canoagem e slalom, em Deodoro - a foto é de setembro de 2014, um mês após o início das obras

E o mesmo local em foto de março de 2015

O Comitê Rio 2016 sempre disse não haver um "plano B" para a baía. Mas Mario Andrada afirma que as declarações de Fox sinalizam uma mudança de posicionamento da federação – que, no entanto, ainda foi manifestada apenas à imprensa.

Caso a federação faça um pedido oficial neste sentido, ele será considerado em duas instâncias antes de ser motivar uma ação concreta. Terá que ser primeiro discutido na próxima reunião periódica de revisão de projetos – que ocorre nos dias 20 e 21 de maio; e depois analisado, e aprovado ou não, na próxima visita da Comissão de Coordenação do COI para a Olimpíada de 2016 (Cocom) ao Rio, em agosto.

"Se tudo isso for aprovado, a gente vai elaborar um plano B", afirma. "E depois virá ainda a longa discussão sobre se o plano B será usado ou não."

Evento-teste

A visita do Cocom coincide com o próximo evento-teste para vela, e se as coisas correrem bem como no ano passado, pode ser que seja esta a pá de cal na discussão, diz Andrada.

"Mas é fato e não dá para esconder que a baía não está sendo limpa. Neste atual governo (estadual), foram suspensos todos os trabalhos de ecobarreiras e ecoboats", afirma Andrada, referindo-se aos dois mecanismos que vinham sendo adotados para reduzir a quantidade de lixo flutuante na baía, e agora estão sendo reformulados.

A falta de medidas para aprimorar o saneamento e reduzir a poluição da água afeta não apenas na baía como também a Marina da Glória, a Lagoa de Jacarepaguá – que margeia o Parque Olímpico – e a Lagoa Rodrigo de Freitas, como se viu na brutal mortandade que deixou toneladas de peixes expostos neste mês.

Há ainda cronogramas apertados para algumas instalações olímpicas e grandes obras de infraestrutura urbana – notadamente a linha 4 do metrô, que ligará a zona sul do Rio à Barra da Tijuca (e por extensão ao Parque Olímpico) e será aberta apenas em junho de 2016, ainda assim em fase de testes (sem operar em horários de pico) e com uma de suas estações (a Gávea) fechada para ser inaugurada apenas seis meses após os jogos.

A foto da esquerda é do campo de golfe em junho de 2014 e a da direita é de março de 2015

Há ainda a preocupação de que os desdobramentos da Lava Jato, que envolve algumas das maiores empreiteiras do país, tenha impacto sobre o andamento das obras olímpicas. A Queiroz Galvão, envolvida no escândalo, acendeu o alarme ao demitir cerca de 70 operários das obras do Complexo de Deodoro.O prefeito Eduardo Paes, porém, minimiza os riscos.

"Somos muito otimistas de que isso (os desdobramentos da Lava Jato) não tenha impacto. Aqui não tem Lava Jato. As obras são feitas com seriedade, no prazo e no custo", disse o prefeito na sexta-feira passada, quando apresentava a evolução das obras urbanas no pacote de projetos considerados de legado para a cidade.

Para além das obras e prazos, Christophe Dubi, do COI, chama atenção para o engajamento com os jogos que aumenta agora que o processo de venda de ingressos começou – e dois milhões já foram pedidos –, os eventos-teste se aproximam, os detalhes do percurso que a tocha olímpica fará por 250 cidades brasileiras no ano que vem são acertados.

"Temos tido todo esse foco em planejamento e construção, mas aos poucos vamos poder sentir e tocar os jogos, e o clima de celebração começa a chegar", diz Dubi.

Colaborou Renata Mendonça, da BBC Brasil em São Paulo

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