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Educação alavanca IDH nas grandes cidades, mas qualidade é questionada

25 nov 2014 - 20h44
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Jefferson Puff

Da BBC Brasil no Rio de Janeiro

A desigualdade entre as grandes cidades brasileiras diminuiu nos últimos dez anos, de acordo com um estudo divulgado pelo IPEA, PNUD e Fundação João Pinheiro; sendo que do tripé de quesitos considerados ─ longevidade, renda e educação ─ o último foi o que apresentou maior crescimento em todas as 16 regiões metropolitanas sob análise.

Principal responsável por alavancar o crescimento do IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal) nas grandes cidades, o fator educação é medido pelas instituições com base em dois aspectos: a escolaridade dos adultos já fora do sistema educacional, e a frequência escolar de crianças e jovens às séries corretas com suas idades.

Em São Paulo, região com maior IDHM do país, de 0,794, a educação cresceu 0,131. Já em Manaus, região com menor IDHM do país, o mesmo aspecto teve crescimento de 0,222.

A escala usada pelo índice vai de 0 a 1, sendo que um IDHM entre 0 e 0,499 é considerado como "muito baixo", entre 0,500 e 0,599, "baixo"; entre 0,600 e 0,699, "médio"; entre 0,700 e 0,799, "alto" e entre 0,800 e 1, "muito alto".

Os dados são do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e da Fundação João Pinheiro, a partir de dados dos Censos do IBGE de 2000 e 2010.

Para os autores do estudo, um dos aspectos mais positivos dos resultados é a diminuição do vão entre as duas regiões. Apesar de reconhecer problemas e a manutenção das disparidades, segundo o estudo, o país tem se tornado cada vez menos desigual.

"A tendência é importante. Estamos nesses últimos anos numa rota de redução da desigualdade, e a continuidade dessa trajetória é crucial. Ainda que haja diferenças, o nível de desenvolvimento humano da sociedade brasileira aumentou", avalia Marco Aurélio Costa, economista do IPEA, e um dos autores da pesquisa.

Educação

Ele destaca que dentre os dois fatores analisados para compor o quesito educação, a frequência escolar sem defasagem de série foi a que mais pesou.

"Isso se explica em grande parte pelas políticas públicas de médio e longo prazo que o país vem empreendendo nos últimos anos. Há cada vez mais crianças e jovens dentro das escolas, nas séries corretas para suas idades, e isso é um avanço", diz.

Costa ressalta que os três fatores estão interligados.

"Com mais escolaridade e expectativa de vida, a gente está conseguindo colocar esses brasileiros no mercado de trabalho, para disputar uma boa renda em condições muito melhores do que há 20 anos. É claro que isso não se faz da noite para o dia, é um processo", diz.

Mas para a Mônica Pinhanez, doutora pelo MIT e professora da Escola de Finanças Públicas e Administração Pública da FGV-Rio, é preciso olhar os dados com uma lupa.

"Eu acho que de fato melhorou, não é algo a ser descartado, de forma alguma. Mas precisamos ter um olhar crítico. Com a nova aprovação automática de séries escolares, essas crianças têm mais anos de escolaridade, mas estão aprendendo? A pesquisa não mede de forma qualitativa, se o ensino vai bem ou mal", questiona.

Para ela, é necessário medir se as crianças estão lendo mais e melhor, se conseguem interpretar textos, como se saem em exames como o Enem e o Enade. "O que essas pessoas conseguiram na vida depois do Ensino Médio e da universidade? Que oportunidades estão tendo? Isso também deveria ser levado em conta", acrescenta a professora.

Marco Aurélio Costa admite que "não há um componente de avaliação da qualidade do ensino dentro do cálculo do índice", e reconhece a importância e a relevância disso, mas frisa que o esforço de aumentar a frequência e permanência da população nos bancos escolares é algo a se comemorar.

Metrópoles e futuro

Quanto à desigualdade entre as 16 regiões metropolitanas e mesmo dentro desses centros urbanos, entre os bairros mais ricos e mais pobres, o IPEA diz que a tendência generalizada é de melhora dos índices.

"Em 2000, tínhamos várias Unidades de Desenvolvimento Humano (UDHs, que representam bairros das cidades) com IDHM abaixo de 0,500, no nível muito baixo. Hoje, não temos mais nenhuma, e apenas 2% das UDHs em todas as 16 regiões metropolitanas estão na faixa de 0,600, no nível baixo", diz Marco Aurélio Costa.

Na região do Rio de Janeiro, por exemplo, em sexto lugar no ranking nacional, com IDHM de 0,771 (alto), a diferença entre os bairros de Ipanema, e o Complexo do Alemão, diminuiu. Em 2010, o bairro da Zona Sul tinha IDHM de 0,907 (muito alto), e o aglomerado de favelas da Zona Norte tinha 0,534 (muito baixo). Dez anos depois, os índices subiram para, respectivamente, 0,937 (muito alto) e 0,656 (baixo), embora a desigualdade se perpetue.

"As grandes aglomerações urbanas concentram o que há de mais positivo e também negativo. Há mais prosperidade, cultura, acesso, mas há também sobrecarga de habitação e nos serviços de saúde e transportes. Muitos vêm incham as grandes cidades na busca por obter uma fatia dessa riqueza", diz Mônica Pinhanez, da FGV-Rio.

Para ela, uma análise mais próxima dos dados mostra que o grande desafio do Brasil nas próximas décadas será como avançar mais, e não permanecer numa inércia dos benefícios atingidos até aqui. “Uma das questões certamente será dar mais poder às regiões metropolitanas. Caso possam legislar, elas terão como atrair mais recursos, fortalecendo-se dentro da nossa estrutura de poder”, diz.

Na visão de Jorge Chediak, representante do PNUD no Brasil, "atacar todos os problemas ao mesmo tempo" deve continuar sendo a fórmula para a gradual redução da desigualdade social.

"A criança brasileira hoje já fica quase o mesmo tempo nos bancos escolares que uma criança dos países mais ricos. Há 20 anos, o Brasil era um símbolo da exclusão social. Hoje, é modelo para outras nações em desenvolvimento. Para a ONU, é preciso continuar atacando todas as frentes ao mesmo tempo. Não se pode escolher, e os problemas vão ficando mais complexos, mas, no geral, a tendência é muito positiva”, avalia.

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