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Comissão do impeachment é instalada com tensão e incerteza sobre qual lado está mais forte

17 mar 2016 - 22h40
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Em semana tensa para Dilma, processo de impeachment voltou a andar
Em semana tensa para Dilma, processo de impeachment voltou a andar
Foto: Ag. Brasil / BBC News Brasil

Mais de três meses após o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), aceitar o pedido de impeachment, teve início nesta quinta-feira o trâmite do processo na Casa.

A demora acabou sendo desfavorável a Dilma Rousseff, dado que o cenário de crise política e econômica se agravou ainda mais neste ano.

Em sessão tensa, com parlamentares oposicionistas e governistas disputando – em um duelo “fora PT” x “golpistas” – quem gritava mais alto, foram escolhidos os 65 deputados da Comissão Especial que emitirá uma parecer a favor ou contra a realização de um julgamento da presidente.

Do lado de fora do Congresso, o dia começou com protestos contra e a favor do governo e terminou com manifestantes a pró-impeachment comemorando no gramado a instalação da comissão.

Após acordo costurado entre os principais partidos, a comissão elegeu à noite o deputado Rogério Rosso (PSD-DF) como seu presidente e Jovair Arantes (PTB-GO) como o relator responsável por redigir o parecer final.

Ambos são de partidos da base aliada do governo, mas são próximos de Cunha, grande adversário de Dilma. Contribui para a escolha dos dois o fato de não terem ainda se manifestado publicamente contra ou a favor do impeachment.

Os 65 deputados eleitos haviam sido previamente indicados pelos líderes partidários, respeitando determinação do Supremo Tribunal Federal. Dessa forma, a eleição podia apenas rejeitar ou referendar esses nomes – a chapa acabou aprovada com apoio de 433 deputados e apenas um voto contra.

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Sessão que instaurou comissão teve "guerra" de gritos entre oposicionistas e governistas
Sessão que instaurou comissão teve "guerra" de gritos entre oposicionistas e governistas
Foto: Ag. Brasil / BBC News Brasil

Essa exigência levou a negociações dentro dos partidos que estão divididos sobre o impeachment, para que as indicações representassem os dois lados da disputa.

Ouvidos pela BBC Brasil, deputados de diferentes partidos, como PMDB, PV, PSB e PSDB, disseram que não está claro ainda para que lado pende a maioria da comissão.

Dentro do governo, o discurso é de que a composição está equilibrada. “Quem quer ter voto não fica contando voto. Temos que trabalhar”, afirmou o líder do PT, José Guimarães (CE), após a eleição dos integrantes.

Parlamentares favoráveis ao impeachment, por sua vez, dizem que têm maioria. “Temos de 35 a 37 votos. Se começou e já está assim, imagina daqui a 30 dias”, disse Rodrigo Maia (DEM-RJ).

O líder do PSOL, Chico Alencar (RJ), diz que “em tese”, considerando os membros indicados pela base do governo, “há uma margem apertada contra o impeachment na comissão”.

“Na prática, porém, com esse ambiente conturbado, partidos saindo do governo, manifestações na rua, vejo uma tendência de que a maioria da comissão vote contra a presidente”, ressaltou o deputado, cujo partido faz oposição ao Planalto, mas defende que Dilma termine seu mandato.

Para aliados de Dilma, Eduardo Cunha protelou início do trâmite na espera de piora no cenário
Para aliados de Dilma, Eduardo Cunha protelou início do trâmite na espera de piora no cenário
Foto: Ag. Câmara / BBC News Brasil

Debandada

A Convenção Nacional do PMDB – principal aliado da administração petista – definiu no sábado que a direção do partido tem 30 dias para decidir se fica ou não no governo. A bancada, que tem oito cadeiras na comissão, indicou cinco parlamentares contrários ao impeachment e três a favor.

Já o PRB, que tem dois votos, entregou o Ministério dos Esportes e anunciou o rompimento com o Planalto após a divulgação, nesta quarta-feira, de gravações de telefonemas entre Dilma e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para adversários do governo e investigadores, um dos diálogos indicaria uma tentativa da presidente de impedir uma possível ação do juiz Sergio Moro, de Curitiba, contra seu antecessor e mentor, o que ela nega.

Sob esse argumento, o juiz federal Itagiba Catta Preta Neto anulou a nomeação de Lula como ministro-chefe da Casa Civil nesta quinta-feira, logo depois de o petista ter tomado posse. A decisão depois acabou derrubada, mas como outra, proferida no Rio de Janeiro, teve o mesmo resultado, a posse continua suspensa.

“Se o Lula tivesse em condição de exercer a articulação política, poderia reverter isso (a debandada dos partidos do governo). Mas com todo esse quadro de confusão e convulsão, é difícil”, avalia o deputado Chico Alencar.

Início do trâmite do impeachment se dá logo após a divulgação de conversas entre Lula e Dilma
Início do trâmite do impeachment se dá logo após a divulgação de conversas entre Lula e Dilma
Foto: Getty / BBC News Brasil

'Celeridade'

Acusado de atrasar a instalação da Comissão Especial para esperar por uma piora do cenário político-econômico, Cunha voltou a defender nesta quinta-feira “celeridade” no trâmite do impeachment.

Logo após a eleição dos integrantes do colegiado, o 1º secretário da Câmara, Beto Mansur (PRB-SP), entregou no Palácio do Planalto a notificação sobre o início dos trabalhos do grupo.

Com isso, começou a contar o prazo de até dez sessões para que a presidente apresente sua defesa. Depois disso, há um prazo de mais cinco sessões para que seja emitido o parecer.

Em geral, só há sessões na Câmara nas terças, quartas e quintas-feiras, porque nas segundas e sextas os deputados costumam voltar para seus Estados, onde trabalham com suas bases. Isso daria à comissão até cinco semanas para concluir seus trabalhos.

A oposição, porém, diz que vai tentar manter o quórum mínimo necessário para que sejam realizadas as sessões, de 51 deputados, também às segundas e sextas, o que faria os prazos avançarem mais rápido.

Protestos em todo o país têm pedido a saída da presidente
Protestos em todo o país têm pedido a saída da presidente
Foto: BBC Brasil / BBC News Brasil

Independente da conclusão da comissão ao fim desse processo, seu parecer será submetido ao plenário da Casa.

Para que o processo contra Dilma seja aberto, primeiro é preciso que ao menos dois terços dos deputados (342 dos 513) aprovem essa medida; em seguida, a maioria simples dos senadores (ao menos 40 dos 81) deverá referendá-la.

Se isso ocorrer, Dilma fica automaticamente afastada do cargo enquanto é julgada pelos senadores. A presidente só é definitivamente cassada se dois terços (54) dos senadores votarem nesse sentido.

Demora

A análise sobre a abertura do processo de impeachment contra o ex-presidente Fernando Collor (1992) na Câmara levou apenas um mês, enquanto seu julgamento pelo Senado levou outros três.

Para muitos deputados e analistas políticos, Cunha, com o apoio da oposição, agiu para segurar a discussão do impeachment de Dilma, apostando justamente que a deterioração da crise econômica e o avanço da Operação Lava Jato desgastariam ainda mais o governo, aumentando os protestos nas ruas.

Foi exatamente que aconteceu: hoje, as chances de Dilma ser condenada são claramente maiores do que no fim do ano passado, quando o pedido foi aceito.

Cunha poderia ter instalado a comissão no início de fevereiro, assim que acabou o recesso parlamentar. Em vez disso, ele recorreu para tentar modificar a decisão que o STF emitiu em dezembro sobre o rito de impeachment – acabou perdendo o recurso, mas conseguiu adiar em mais de um mês o andamento da análise do processo na Câmara.

“Ele (Cunha) não estava preocupado com o futuro do país, com a economia. Quis acirrar os ânimos para sair da vitrine”, criticou o deputado Julio Delgado (PSB-MG), em referências ao processo que corre contra o peemedebista no Conselho de Ética da Câmara.

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