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Tragédia em Santa Maria

RS: marcadas novas audiências do processo criminal da tragédia da Kiss

Em setembro, a previsão é ouvir 52 vítimas, entre os dias 5 e 27. Juiz negou pedidos para depoimentos de prefeito, deputado e promotor

20 ago 2013 - 19h21
(atualizado às 19h22)
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O juiz Ulysses Fonseca Louzada, titular da 1ª Vara Criminal de Santa Maria (RS), divulgou nesta terça-feira as datas das novas audiências para ouvir vítimas no processo criminal sobre a tragédia da Boate Kiss. A previsão é que sejam ouvidos 52 sobreviventes listados pelas defesas dos quatro réus da ação. As audiências serão retomadas no dia 5 de setembro. Serão nove dias de depoimentos, até o dia 27. No mesmo despacho, o magistrado negou pedidos para que sejam ouvidos o prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer (PMDB), o deputado estadual Jorge Pozzobom (PSDB) e o promotor Ricardo Lozza.

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As audiências para ouvir vítimas foram marcadas para 5, 10, 11, 12, 19, 24, 25, 26 e 27 de setembro. O número mínimo de depoimentos por dia é quatro, e o máximo, sete. Na retomada, em 5 de setembro, já está previsto para serem ouvidas duas pessoas que trabalhavam na Kiss e a namorada de Kiko Spohr (sócio da boate e réu no processo), Nathália Socal Daronch. Das cinco vítimas previstas para essa data, vítimas deveriam depor no primeiro bloco de audiências, em junho e julho, mas não foram localizadas ou tiveram os horários previamente marcados cancelados, por necessidade.  

As outras 48 vítimas programadas para serem ouvidas em setembro foram listadas pelas defesas dos dois sócios da Kiss, Elissandro Spohr e Mauro Hoffmann, e do vocalista da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos. Porém, nem todas foram aceitas pelo juiz Ulysses Fonseca Louzada.

A defesa de Elissandro, por exemplo, listou 48 vítimas. Dessas, 28 não têm endereço nos autos para serem localizadas para intimação. Por isso, o juiz determinou que o Ministério Público se manifeste a respeito e para que, em um prazo de cinco dias, apresente os endereços das vítimas, caso eles realmente não sejam encontrados nos autos. Outra pessoa listada pelo advogado de Elissandro, Jader Marques, teve o depoimento negado pelo magistrado por não ser vítima, já que, conforme depoimento dado à Polícia Civil, não estava na Kiss no momento do incêndio.

O advogado Omar Obregon, que defende o vocalista da Gurizada Fandangueira, listou 44 vítimas para depor, mas o juiz Louzada acatou apenas 30. Os motivos são por conta de nomes duplicados ou já relacionados por outras defesas ou pelo Ministério Público. Ainda segundo o magistrado, oito pessoas não podem ser consideradas vítimas e uma já foi ouvida no dia 27 de junho.   

Das seis vítimas listadas pelos advogados Mario Cipriani e Bruno Seligman de Menezes, que defendem Mauro Hoffmann, duas já tinham sido indicadas também pelas defesas de Elissandro Spohr e Marcelo de Jesus dos Santos. O defensor Gilberto Weber, que representa o roadie da Gurizada Fandangueira, Luciano Bonilha Leão, não pediu depoimentos de novas vítimas.

O juiz também pediu para que sejam expedidas cartas precatórias para que cinco vítimas sejam ouvidas nas cidades em que estão morando: Uruguaiana (RS), Horizontina (RS), Passo Fundo (RS), Rosário do Sul (RS) e Quaraí (RS). Aguarda-se ainda o retorno sobre os depoimentos de duas vítimas que residem em Florianópolis (SC) e Caxias do Sul (RS).  

Pedidos da defesa do vocalista da Gurizada Fandangueira são negados

Ulysses Fonseca Louzada também se manifestou a respeito de pedidos feitos pela defesa do vocalista da banda. Sobre uma nova perícia na boate, por causa da informação de que foi encontrada querosene no local, a solicitação foi rejeitada, por conta de que a localização da substância foi na parte da frente do teto da boate, sem relação com o incêndio.

Outras manifestações do juiz foram a respeito de pedidos para que fossem ouvidos o promotor Ricardo Lozza, responsável pelo termo de ajustamento de conduta (TAC) assinado por Elissandro Spohr, sócio da Kiss, por causa da poluição sonora. O magistrado, concordando com o MP, não vê necessidade no depoimento do promotor, mas ressalta que, se, mais adiante, vislumbrar-se no processo que a fala de Lozza é importante, ele poderá ser chamado.   

Já em relação aos pedidos para os depoimentos do prefeito Cezar Schirmer e do deputado Jorge Pozzobom, que teriam se reunido com os donos da boate na madrugada de 27 de janeiro, a resposta do juiz também foi negativa. O magistrado sustenta que a defesa do vocalista não indicou as razões para tais depoimentos nem o conteúdo tratado em tal reunião. Além disso, ele não viu relação com as mortes ocorridas por causa do incêndio na Kiss.  

“Nesse ponto, insta salientar que o processo criminal tem seu procedimento bem delineado no Código de Processo Penal e sua função é apurar o fato, nos estritos termos da exordial acusatória, não se revelando tolerável seja palco para discutir questões políticas”, escreveu o juiz a respeito. Louzada também indeferiu o pedido, feito pelo mesmo advogado, para que fossem ouvidos bombeiros que atuaram no combate ao incêndio e no resgate das vítimas, no dia 27 de janeiro.

Imóvel da boate pode ser entregue ao dono

Outra manifestação do juiz diz respeito a ofício do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest), sediado em Santa Maria, que informa a presença de 17 produtos químicos no pó residual que estava na Kiss. Por isso, o MP  e os assistentes de acusação foram intimados para que se manifestem, em cinco dias, sobre a entrega do imóvel em que funcionava a boate ao seu proprietário. Segundo o magistrado, a medida se torna necessárias por conta dos “riscos que a manutenção do prédio de forma inadequada pode acarretar à saúde e ao meio ambiente”. 

Incêndio na Boate Kiss
Na madrugada do dia 27 de janeiro, um incêndio deixou 242 mortos em Santa Maria (RS). O fogo na Boate Kiss começou por volta das 2h30, quando um integrante da banda que fazia show na festa universitária lançou um artefato pirotécnico, que atingiu a espuma altamente inflamável do teto da boate.

Com apenas uma porta de entrada e saída disponível, os jovens tiveram dificuldade para deixar o local. Muitos foram pisoteados. A maioria dos mortos foi asfixiada pela fumaça tóxica, contendo cianeto, liberada pela queima da espuma.

Os mortos foram velados no Centro Desportivo Municipal, e a prefeitura da cidade decretou luto oficial de 30 dias. A presidente Dilma Rousseff interrompeu uma viagem oficial que fazia ao Chile e foi até a cidade, onde prestou solidariedade aos parentes dos mortos.

Os feridos graves foram divididos em hospitais de Santa Maria e da região metropolitana de Porto Alegre, para onde foram levados com apoio de helicópteros da FAB (Força Aérea Brasileira). O Ministério da Saúde, com apoio dos governos estadual e municipais, criou uma grande operação de atendimento às vítimas.

Quatro pessoas foram presas temporariamente - dois sócios da boate, Elissandro Callegaro Spohr, conhecido como Kiko, e Mauro Hoffmann, e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos. Enquanto a Polícia Civil investiga documentos e alvarás, a prefeitura e o Corpo de Bombeiros divergem sobre a responsabilidade de fiscalização da casa noturna.

A tragédia fez com que várias cidades do País realizassem varreduras em boates contra falhas de segurança, e vários estabelecimentos foram fechados. Mais de 20 municípios do Rio Grande do Sul cancelaram a programação de Carnaval devido ao incêndio.

No dia 25 de fevereiro, foi criada a Associação dos Pais e Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia da Boate Kiss em Santa Maria. A associação foi criada com o objetivo de oferecer amparo psicológico a todas as famílias, lutar por ações de fiscalização e mudança de leis, acompanhar o inquérito policial e não deixar a tragédia cair no esquecimento.

Indiciamentos
Em 22 de março, a Polícia Civil indiciou criminalmente 16 pessoas e responsabilizou outras 12 pelas mortes na Boate Kiss. Entre os responsabilizados no âmbito administrativo, estava o prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer (PMDB). A investigação policial concluiu que o fogo teve início por volta das 3h do dia 27 de janeiro, no canto superior esquerdo do palco (na visão dos frequentadores), por meio de uma faísca de fogo de artifício (chuva de prata) lançada por um integrante da banda Gurizada Fandangueira.

O inquérito também constatou que o extintor de incêndio não funcionou no momento do início do fogo, que a Boate Kiss apresentava uma série das irregularidades quanto aos alvarás, que o local estava superlotado e que a espuma utilizada para isolamento acústico era inadequada e irregular. Além disso, segundo a polícia, as grades de contenção (guarda-corpos) existentes na boate atrapalharam e obstruíram a saída de vítimas, a boate tinha apenas uma porta de entrada e saída e não havia rotas adequadas e sinalizadas para a saída em casos de emergência - as portas apresentavam unidades de passagem em número inferior ao necessário e não havia exaustão de ar adequada, pois as janelas estavam obstruídas.

Já no dia 2 de abril, o Ministério Público denunciou à Justiça oito pessoas - quatro por homicídios dolosos duplamente qualificados e tentativas de homicídio, e outras quatro por fraude e falso testemunho. A Promotoria apontou como responsáveis diretos pelas mortes os dois sócios da casa noturna, Mauro Hoffmann e Elissandro Spohr, o Kiko, e dois dos integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha Leão.

Por fraude processual, foram denunciados o major Gerson da Rosa Pereira, chefe do Estado Maior do 4º Comando Regional dos Bombeiros, e o sargento Renan Severo Berleze, que atuava no 4º CRB. Por falso testemunho, o MP denunciou o empresário Elton Cristiano Uroda, ex-sócio da Kiss, e o contador Volmir Astor Panzer, da GP Pneus, empresa da família de Elissando - este último não havia sido indiciado pela Polícia Civil.

Os promotores também pediram que novas diligências fossem realizadas para investigar mais profundamente o envolvimento de outras quatro pessoas que haviam sido indiciadas. São elas: Miguel Caetano Passini, secretário municipal de Mobilidade Urbana; Belloyannes Orengo Júnior, chefe da Fiscalização da secretaria de Mobilidade Urbana; Ângela Aurelia Callegaro, irmã de Kiko; e Marlene Teresinha Callegaro, mãe dele - as duas fazem parte da sociedade da casa noturna.

Fonte: Especial para Terra
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