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Tragédia em Santa Maria

Barreiras de metal foram decisivas para mortes na Boate Kiss, diz laudo

Na rota para a saída da casa incendiada, havia pelo menos quatro barras de ferro com pouco mais de 1 metro de altura

17 mar 2013 - 22h44
(atualizado às 22h55)
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<p>Segundo perícia, barras de metal dificultaram a saída de pessoas que estavam dentro da boate em chamas</p>
Segundo perícia, barras de metal dificultaram a saída de pessoas que estavam dentro da boate em chamas
Foto: Fernando Borges / Terra

Pelos depoimentos de pessoas que sobreviveram à tragédia na Boate Kiss, em Santa Maria (RS), a Polícia Civil já tinha uma ideia de que as barras de ferro existentes na rota de saída da casa noturna dificultaram para que as pessoas deixassem o local. O laudo sobre o incêndio, entregue na última sexta-feira pelo Instituto Geral de Perícias (IGP), confirmou que elas foram decisivas para as mortes.

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Na rota para a saída da casa, havia pelo menos quatro barras de ferro, com pouco mais de 1 metro de altura cada. A que represou o maior número de pessoas ficava atravessada de forma transversal à saída. No desespero para sair, quando a fumaça tomava conta da boate e as luzes se apagaram, muitos frequentadores pararam na barra. "Aquela barra aglomerou as pessoas na saída da boate. Os peritos valorizam essa questão no laudo", diz o delegado Sandro Meinerz, um dos responsáveis pelo inquérito que investiga o caso.

Nos momentos de desespero, a barra transversal foi derrubada, mas muita gente já tinha ficado por ali, pisoteada, antes de conseguir chegar à rua. Havia ainda outras três barras, que atrapalharam a fuga da boate, mas não chegaram a ser tão decisivas como a que ficava atravessada. As outras barras serviam para disciplinar a entrada na boate, a saída da área VIP em direção aos caixas e o acesso para a área de fumantes. Elas eram paralelas ao sentido em que as pessoas se deslocavam.

A perícia também apontou que o fato de a porta de emergência ser junto com a de entrada e saída, o que está em desacordo com a norma 9077/2001 - "Saídas de Emergência em Edifícios" -, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), também contribuiu para a tragédia. Os peritos também constataram a ausência de algumas sinalizações que poderiam ajudar as pessoas a encontrar a saída.

Os laudos - do incêndio, dos extintores e do local - continuam sendo analisados pelos delegados que investigam o caso. Só o do incêndio tem 161 páginas, com 29 quesitos apontados pela Polícia Civil e respondidos pelos peritos. O domingo, por exemplo, foi dia de trabalho para os delegados Sandro Meinerz, Marcos Vianna, Gabriel Zanella e Marcelo Arigony. Ainda não há uma data definida para a conclusão do inquérito, mas não deve ser antes da próxima quarta-feira.

Deputado estadual depôs neste domingo

Além de sobreviventes da Kiss, também foi ouvido na tarde deste domingo o deputado estadual Jorge Pozzobom (PSDB).  Ele foi chamado porque foi até a frente da boate na madrugada de 27 de janeiro e se colocou à disposição da polícia para contar o que viu. Nesta segunda-feira, serão ouvidas pessoas que atuaram no resgate, como policiais do Batalhão de Operações Especiais (BOE) e militares da Base Aérea.

Mais de 20 sobreviventes falaram à Polícia Civil

Durante o final de semana, a Polícia Civil conseguiu ainda mais de 20 depoimentos de sobreviventes da tragédia na Boate Kiss, graças ao mutirão feito no Hospital Universitário de Santa Maria (Husm) para atendimento a pessoas que tiveram contato a fumaça tóxica do incêndio ou resultaram com problemas psicológicos em razão do que aconteceu.

Das 164 pessoas que estavam agendadas para atendimento no hospital, cerca de 50 ainda não tinham aparecido no inquérito que investiga o caso. Para saber se essas pessoas estiveram ou não na Kiss na madrugada de 27 de janeiro, policiais civis foram até o Husm para fazer uma triagem dos casos. O objetivo é chegar o mais próximo possível do número de frequentadores da boate no dia da tragédia, para comprovar que haveria superlotação.

No sábado, 16 sobreviventes do incêndio foram ouvidos no hospital, em duas salas cedidas pela direção da instituição. Outras cinco pessoas depuseram na 1ª Delegacia de Polícia Civil, no centro de Santa Maria, onde estão concentradas as investigações da tragédia.

No domingo, após contatos feitos por telefone com pessoas que foram buscar atendimento no mutirão, outras quatro pessoas depuseram no inquérito do caso. Para conseguir esses 25 frequentadores que estavam na Kiss, policiais civis trabalharam em regime de plantão tanto no sábado quanto no domingo, no Husm e na 1ª DP.   

Sócio da Kiss dará depoimento nesta segunda

Na fase final do inquérito que investiga a tragédia, um dos depoimentos mais importantes será tomado nesta segunda, às 14h, na Penitenciária Estadual de Santa Maria. Elissandro Callegaro Spohr, o Kiko, um dos sócios da Boate Kiss, será ouvido novamente. Ele já depôs em 27 de janeiro, mesmo dia da tragédia, mas ainda restam algumas dúvidas que a Polícia Civil quer sanar.

Entre os temas de que os delegados do caso pretendem abordar no depoimento de Kiko, estão algumas contradições entre o primeiro depoimento dele e os que foram dados posteriormente por testemunhas relacionadas à boate. Um deles é saber mais sobre a participação na administração da casa noturna do outro sócio, Mauro Hoffmann, o Maurinho, que, assim como Kiko, está preso preventivamente na Penitenciária Estadual.  

O certo é que Kiko não ficará em silêncio. Ele faz questão de depor, segundo o advogado dele, Jader Marques. O defensor esteve na tarde deste domingo na penitenciária para acertar alguns detalhes do depoimento com seu cliente. Marques disse que o tempo foi curto para passar os detalhes de todos os depoimentos dados no inquérito para Kiko, pois ele só teve acesso integral a eles na última quinta-feira. "Pelo tempo, meu cliente não teve como tomar conhecimento de cerca de 80 depoimentos", disse o advogado.

Incêndio na Boate Kiss

Na madrugada do dia 27 de janeiro, um incêndio deixou mais de 240 mortos em Santa Maria (RS). O fogo na Boate Kiss começou por volta das 2h30, quando um integrante da banda que fazia show na festa universitária lançou um artefato pirotécnico, que atingiu a espuma altamente inflamável do teto da boate.

Com apenas uma porta de entrada e saída disponível, os jovens tiveram dificuldade para deixar o local. Muitos foram pisoteados. A maioria dos mortos foi asfixiada pela fumaça tóxica, contendo cianeto, liberada pela queima da espuma.

Os mortos foram velados no Centro Desportivo Municipal, e a prefeitura da cidade decretou luto oficial de 30 dias. A presidente Dilma Rousseff interrompeu uma viagem oficial que fazia ao Chile e foi até a cidade, onde prestou solidariedade aos parentes dos mortos.

Os feridos graves foram divididos em hospitais de Santa Maria e da região metropolitana de Porto Alegre, para onde foram levados com apoio de helicópteros da FAB (Força Aérea Brasileira). O Ministério da Saúde, com apoio dos governos estadual e municipais, criou uma grande operação de atendimento às vítimas. 

Quatro pessoas foram presas temporariamente - dois sócios da boate, Elissandro Callegaro Spohr, conhecido como Kiko, e Mauro Hoffmann, e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos. Enquanto a Polícia Civil investiga documentos e alvarás, a prefeitura e o Corpo de Bombeiros divergem sobre a responsabilidade de fiscalização da casa noturna.

A tragédia fez com que várias cidades do País realizassem varreduras em boates contra falhas de segurança, e vários estabelecimentos foram fechados. Mais de 20 municípios do Rio Grande do Sul cancelaram a programação de Carnaval devido ao incêndio.

No dia 25 de fevereiro, foi criada a Associação dos Pais e Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia da Boate Kiss em Santa Maria. A intenção é oferecer amparo psicológico a todas as famílias, lutar por ações de fiscalização e mudança de leis, acompanhar o inquérito policial e não deixar a tragédia cair no esquecimento.

Fonte: Especial para Terra
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