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RJ: 'musa' dos Black Blocs critica Veja e questiona fama de 'sex symbol'

Terra conversou com Emma, jovem que surgiu como representante nas redes sociais da ala feminista do grupo Black Blocs, que tem tomado a dianteira das manifestações em todo o País

20 ago 2013 - 08h43
(atualizado às 10h02)
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<p>Sorridente, ela disse não entender o fato de que seus olhos claros, esverdeados, possam ter o poder de torná-la uma espécie de sex symbol das manifestações</p>
Sorridente, ela disse não entender o fato de que seus olhos claros, esverdeados, possam ter o poder de torná-la uma espécie de sex symbol das manifestações
Foto: Daniel Ramalho / Terra

Olhos claros, rosto encoberto. Fama de namoradeira, discurso político afiado. No universo negro, sem trocadilhos, dos Black Blocs, ela surgiu como representante nas redes sociais da ala feminista do grupo que tem tomado à dianteira das manifestações em todo o País. “Não sou feminista, as pessoas confundem muito”, tratou logo de avisar. Há cerca de duas semanas, ao contar um pouco de sua trajetória em entrevista para a Mídia Ninja, órgão independente que se tornou a voz dos ativistas, ficou ainda mais conhecida pelo fato também de ter o nome da famosa anarquista do século XX, a lituana Emma Goldman, que, com seus artigos e atitude anticapitalistas, foi a referência do movimento na época, na América do Norte. 

A jovem Emma, simples assim, sem maiores detalhes de sua vida pessoal, é uma manifestante de 25 anos, do Rio de Janeiro, que virou o rosto da capa da revista Veja para ilustrar uma extensa reportagem  sobre os Black Blocs, movimento que tem fama de arruaceiro e de enfrentamento para com a Polícia Militar.

“Usaram uma foto minha sem a minha autorização. Foi surpreendente para mim”, esclareceu em entrevista na qual o Terra foi autorizado a participar, junto com integrantes da Mídia Ninja, em plena avenida Delfim Moreira, no Leblon, próximo ao apartamento onde vive o governador fluminense Sérgio Cabral (PMDB), o grande alvo das manifestações no Rio de Janeiro. Emma é integrante do Ocupa Cabral, movimento que há 23 dias acampa no local para pedir a renúncia de Cabral. 

Totalmente arredios a entrevistas para o que chamam de “grande mídia sensacionalista”, os jovens de ambos os movimentos costumam convocar assembleia para decidirem se concedem ou não entrevista para um determinado órgão de imprensa. “A gente até acredita no jornalista, no profissional, mas a gente sabe que quando ele levar aquele material para dentro da redação eles vão ser manipulados”, disse Emma, em sua opinião. 

Com o Terra, a situação não foi diferente. O repórter fotográfico Daniel Ramalho foi "aprovado" e teve acesso ao encontro marcado e gravado para que Emma apresentasse sua fúria, recheada de argumentos, para com o seu perfil publicado pela Veja. “Eles provavelmente pegaram esse depoimento do Mídia Ninja e cataram umas frases avulsas. Essa questão da manipulação tendenciosa é que eu me sinto sacaneada (sic). E fico bem irritada, pois eu fico imaginando quem é que está por trás disso, qual é a intenção real disso, quem é que está mandando?”, opinou a jovem. 

“Eu não me sinto ofendida, até porque a gente conhece o histórico político da Veja e se a gente for analisar todas as pessoas que foram execradas pela revista até que eu estou num hall bem bacana. E eu acho que ser ridicularizado pela Veja significa que a gente está certo. Se eu recebesse qualquer tipo de apoio ou aprovação, sinceramente, iria desfazer esse acampamento e começaria tudo do zero”, completou. 

A publicação em nenhum momento diz que conversou com Emma, e usa informações, de fato, do que foi dito na entrevista anterior ao Mídia Ninja, para reunir informações como, por exemplo, que a jovem saiu de casa aos 16 anos para viver numa favela e que chegou a trabalhar num banco, antes de abandonar o emprego “por desobediência civil”. Ela publicará em sua página pessoal no Facebook uma carta aberta a Veja na qual repudia o tom do artigo. E esclarece que a camisa vermelha da foto “é a bandeira da Paraíba” e que o grupo “não tem estoque grande de roupa preta, nenhuma loja de rock resolveu patrocinar os Black Blocs”, ironizou.

Para a manifestante, a fama repentina junto com sua foto espalhada, inclusive, em outdoors pelo País pode, no final, acabar sendo considerado “um favor para mim com toda essa visibilidade, porque se eu sofrer qualquer tipo de tentativa de agressão e homicídio, as pessoas já sabem quem é a Emma. E se tentarem algo, isso pode ser estopim para uma revolta ainda maior”. “Eu temo, sim, pela minha vida, temo pela minha família, mas isso não vai me cercear. Não vou sair do Ocupa Cabral, e não vou deixar de ir às manifestações”, disse ainda. 

Ativismo político x ‘namoradeira’

Se não esclareceu nome e sobrenome, Emma, ao menos, repercutiu a fama repentina tratando logo de desmentir o que considerou uma série de boatos que vêm surgindo a seu respeito. “Tem gente dizendo que eu estou fazendo vídeo de inscrição para o Big Brother Brasil. Outros que eu vou posar para a Playboy. Se eu for realmente começar a ficar paranoica com essa gente vai começar a dizer, eu vou parar para me preocupar só com isso e vou parar de fazer coisas extremamente importantes aqui dentro”, justificou. 

Sorridente, ela disse não entender o fato de que seus olhos claros, esverdeados, possam ter o poder de torná-la uma espécie de “sex symbol” das manifestações. “Eu achei muito engraçado o fato das pessoas terem começado a me fazer muitos elogios, me chamando de linda, e bonita. Com uma máscara! Como as pessoas conseguiram associar a isso se eu estou coberta? Claro que tem a questão dos olhos, mas tem outras meninas de olhos claros aqui na ocupação. Isso é uma bobagem”, explicou. 

“Eu tenho vaidade de cuidar do cabelo (por exemplo). Isso me foi imposto de certa forma e é difícil me desvincular disso. Posso dizer que não teve tratamento melhor do que permanecer ocupada numa via pública. Não tem como você ter controle disso, e você está preocupada com coisas muito mais importantes”, esclareceu ainda sobre se é vaidosa ou não sem ter um lugar certo para tomar banho e fazer suas necessidades básicas - ela também participa da ocupação na Câmara Municipal de Vereadores contra a presidência e relatoria da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Ônibus. 

Ela tratou também de deixar claro “que as mulheres que estão na ocupação não ficam lavando a louça, enquanto os homens ficam preparando a parte pesada. Pelo contrário. As mulheres têm tido uma voz muito mais respeitada e ouvida do que muitos homens aqui.”

Outra fama não menos polêmica que recaiu sobre Emma é a de “namoradeira”. O Terra não presenciou a manifestante com nenhum ativista, mas alguns relatos, entre eles da própria Veja, dão conta de que a jovem estaria desfrutando bastante de seus momentos de lazer em plena avenida Delfim Moreira.  

“De forma nenhuma isso seria algo ruim, eu sou realmente namoradeira e acho triste as pessoas que não fazem esse tipo de coisa. Sem ter a oportunidade de troca de fluidos, pensamentos e energias. Nos sete primeiros dias eu não tinha me relacionado com ninguém e isso tinha me deixado bastante estressada. Aí consegui um companheiro para trocar carinho. O afeto aqui sempre vai ser celebrado”, justificou, sem pudores. Afinal de contas, Emma conta que sempre preferiu ser direta e reta. “Eu estou cagando para o que as pessoas vão dizer.”

Protestos contra tarifas mobilizam população e desafiam governos de todo o País

Mobilizados contra o aumento das tarifas de transporte público nas grandes cidades brasileiras, grupos de ativistas organizaram protestos para pedir a redução dos preços e maior qualidade dos serviços públicos prestados à população. Estes atos ganharam corpo e expressão nacional, dilatando-se gradualmente em uma onda de protestos e levando dezenas de milhares de pessoas às ruas com uma agenda de reivindicações ampla e com um significado ainda não plenamente compreendido.

A mobilização começou em Porto Alegre, quando, entre março e abril, milhares de manifestantes agruparam-se em frente à Prefeitura para protestar contra o recente aumento do preço das passagens de ônibus; a mobilização surtiu efeito, e o aumento foi temporariamente revogado. Poucos meses depois, o mesmo movimento se gestou em São Paulo, onde sucessivas mobilizações atraíram milhares às ruas; o maior episódio ocorreu no dia 13 de junho, quando um imenso ato público acabou em violentos confrontos com a polícia.

A grandeza do protesto e a violência dos confrontos expandiu a pauta para todo o País. Foi assim que, no dia 17 de junho, o Brasil viveu o que foi visto como uma das maiores jornadas populares dos últimos 20 anos. Motivados contra os aumentos do preço dos transportes, mas também já inflamados por diversas outras bandeiras, tais como a realização da Copa do Mundo de 2014, a nação viveu uma noite de mobilização e confrontos em São PauloRio de JaneiroCuritibaSalvadorFortalezaPorto Alegre e Brasília.

A onda de protestos mobiliza o debate do País e levanta um amálgama de questionamentos sobre objetivos, rumos, pautas e significados de um movimento popular singular na história brasileira desde a restauração do regime democrático em 1985. A revogação dos aumentos das passagens já é um dos resultados obtidos em São Paulo e outras cidades, mas o movimento não deve parar por aí. “Essas vozes precisam ser ouvidas”, disse a presidente Dilma Rousseff, ela própria e seu governo alvos de críticas.

Fonte: Terra
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