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Moradores e lojistas protestam contra desapropriações em SP

Grupo se reuniu em frente à Secretaria de Habitação do Estado contra medida que afeta bairros como Brás e Bom Retiro pela construção de moradias; pasta diz que apenas "áreas ociosas" serão desapropriadas

14 nov 2014 - 15h35
(atualizado às 18h57)
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Aposentada Maria Luiza Carone, 73 anos, e sua filha se consideram traídas
Aposentada Maria Luiza Carone, 73 anos, e sua filha se consideram traídas
Foto: Janaina Garcia / Terra

A aposentada Maria Luiza Carone, 73 anos, está apreensiva. Moradora dos Campos Elíseos (região central de São Paulo) desde que nasceu, ela teme que a casa onde mora com o marido de 75 anos seja perdida para o Estado graças a uma ação de desapropriação para construção de novas moradias. “Me sinto traída. Deixei de votar no PT nessa eleição para o governador esperar e fazer isso com a gente agora? Para onde eu vou se ele me tirar da minha casa?”, indagou.

Assim como dona Maria Luiza, cerca de 70 moradores e comerciantes dos Campos Elíseos e de outros bairros tradicionais do centro da capital, como Santa Cecília, Brás e Bom Retiro, participaram nesta sexta-feira de um protesto em frente à Secretaria de Habitação do Estado, na rua Boa Vista, contra um edital de licitação que prevê parcerias público-privadas (PPPs) para a construção de pouco mais de 14 mil habitações. Destas, 9 mil serão unidades de interesse social, para a faixa de renda mensal de R$ 810 a R$ 4.344, e outras 5.124 serão habitações de mercado popular, destinadas a quem ganha de seis salários mínimos a R$ 8,1 mil ao mês.

Há 35 deles no comércio, o empresário Ali Hassan afirmou que o setor teme recessão
Há 35 deles no comércio, o empresário Ali Hassan afirmou que o setor teme recessão
Foto: Janaina Garcia / Terra

Com faixas e apitos, comerciantes e moradores se queixam de o edital não especificar quais imóveis, exatamente, serão desapropriados pelo Estado para as construções. Com cópias do edital, exibiam as áreas demarcadas nos bairros e se queixavam de uma suposta falta de diálogo por parte do poder público para esclarecer o porquê da medida, e quais imóveis, ao certo, ela afetaria.

A data do protesto teve um alvo: as empreiteiras cujos representantes compareceriam hoje à secretaria para a abertura das propostas. Logo na entrada do prédio, ao lado da recepção, um comunicado avisava que a sessão para a concorrência internacional fora adiada para o próximo dia 10. Segundo a secretaria, caberá às empresas aproveitar “imóveis subutilizados no centro e nas áreas contíguas às linhas férreas, corredores de transporte e grandes avenidas centrais” e construir novas unidades podendo “buscar financiamentos em quaisquer instituições financeiras nacionais ou estrangeiras e instituições multilaterais de crédito”. Ao todo, o projeto tem prazo de implantação de seis anos, e, de concessão, de duas décadas.

A comerciante Noemi Silveira e a filha, Marina, correm o risco de ter a casa desapropriada nos Campos Elíseos
A comerciante Noemi Silveira e a filha, Marina, correm o risco de ter a casa desapropriada nos Campos Elíseos
Foto: Janaina Garcia / Terra

Além da aposentada do Campos Elíseos, a filha dela, a dentista Rosana Carone, de 49 anos, também teme perder a área da clínica onde atende, na Barra Funda (zona oeste). É que o local também aparece nas áreas delimitadas pelo Estado para as desapropriações.

“Trabalho em uma profissão onde se demora anos para construir uma clientela. Tenho minha clínica na Barra Funda há 26 anos; meu marido trabalha nos Campos Elíseos, e agora nós dois nos perguntamos para onde vamos caso essas desapropriações sejam feitas”, disse.

“Querem me tirar de onde eu moro e me pagar um valor com o qual não pago hoje nem um barraco em favela. Não sei para onde ir, e sinto de verdade, morando há 40 anos em São Paulo, que isso é uma ingratidão – trabalhei tanto, também ajudei a cidade que me ajudou, e agora é como se ela estivesse me expulsando”, relatou a comerciante Noemi Silveira, 59 anos –há 23 anos nos Campos Elíseos. 

Dono de confecções e de um restaurante no Brás e no Bom Retiro, o empresário Ali Hassan, 54 anos – 35 deles no comércio –, afirmou que o setor teme recessão caso os imóveis sejam afetados. “Entre Pari, Brás, Canindé e Bom Retiro, a estimativa é que 2 milhões de empregos diretos e indiretos sejam prejudicados caso os imóveis comerciais sejam desapropriados. Querem trazer a periferia para o centro, mas, do jeito que está esse edital, com previsão de apartamentos em cima de shoppings nos andares térreos, vamos é virar inquilinos de ricos, isso sim”, reclamou.

“A gente fica desesperado, inseguro, porque não só tem a nossa fonte de renda, como também emprega muita gente”, comentou Daniel Kim, 27 anos, também empresário do ramo de confecção no Bom Retiro. Boliviano há cinco anos em São Paulo –“cinco anos de trabalho”, ele faz questão de salientar –, Luis Lima, de 29 anos, é empregado em uma confecção.

“Há tanto espaço em outros lados da cidade e querem construir bem no centro? E o desemprego de quem trabalha, como fica?”

Manifestantes protestam em frente à secretaria de habitação do Estado
Manifestantes protestam em frente à secretaria de habitação do Estado
Foto: Janaina Garcia / Terra

Uma comissão de moradores foi recebida pelo secretário-executivo da Casa Paulista, Reinaldo Iapequino. Ficou acertado que, na próxima quarta-feira, o secretário estadual de Habitação, Marcos Penido, conversará com o grupo.

“Tivemos a garantia de que, onde tem moradia e comércio, não haverá desapropriação. Mas queremos isso expresso no edital – como que se demarca uma área toda para fins de desapropriá-la e depois se diz que não vai ser feito isso? Queremos que fique explícito. Além disso, foi algo feito completamente sem consulta popular, o que, por si só, já é um absurdo”, criticou a presidente da associação que representa munícipes afetados por desapropriações em São Paulo, Rosana da Rocha Pinto, 45 anos.

Por meio da assessoria de imprensa, Iapequino informou que o edital prevê a desapropriação “apenas de áreas ociosas” existentes nos bairros afetados – Santa Cecília, Bom Retiro, Pari, Brás e Belém. A não especificação de quantas e quais elas são, justificou o órgão, se deveria a razões estratégicas “para garantir a execução do projeto”.

Fonte: Terra
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