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Capital cultural, 2/3 de SP não tem teatro e cinema

Dado é do Mapa da Desigualdade divulgado pela Rede Nossa São Paulo; maioria dos 96 distritos não tem espaço cultural

19 mai 2015 - 14h39
(atualizado em 27/5/2015 às 14h42)
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A fama de capital cultural que atrai o ano todo a São Paulo turistas do Brasil e do mundo está longe de equivaler a uma distribuição igualitária de espaços de cultura pela cidade. Dos 96 distritos que a capital de quase 12 milhões de habitantes possui, dois terços não possuem nenhum centro ou casa cultural, teatro ou cinema – estruturas cuja concentração em bairros do chamado centro expandido não vem se alterando ao longo dos últimos cinco anos.

A constatação é do Mapa da Desigualdade em São Paulo, documento realizado desde 2009 na cidade pela ONG Rede Nossa São Paulo e que teve uma atualização divulgada nesta terça-feira pela entidade. Os números se referem ao ano de 2014 e têm por base informações fornecidas pelas secretarias municipais e estaduais e por órgãos do governo federal.

Indicadores de desigualdade em SP divulgados hoje pela Rede Nossa São Paulo
Indicadores de desigualdade em SP divulgados hoje pela Rede Nossa São Paulo
Foto: Janaina Garcia / Terra

Entre os equipamentos e espaços culturais, por exemplo, o levantamento apontou maior índice de desigualdade em relação à quantidade de salas de cinema por grupos de 10 mil habitantes: enquanto na Barra Funda (zona oeste) são 9,48 salas dentro dessa proporção, no Sacomã (zona sul), esse índice fica em 0,040 – quase 240 vezes de diferença. Ao todo, só em relação às salas de cinemas, eram 344 na capital, ano passado, para uma população de 11.453.996 habitantes.

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O índice de desigualdade apontado pelo mapa também foi alto em relação à distribuição de salas de teatro – municipais, estaduais, federais e particulares, por grupos de 10 mil habitantes: há uma diferença superior a 150 vezes da média de 5,97 identificadas na República (região central), diante do mínimo de 0,04 novamente no Sacomã – fora os 51 distritos onde não existe nenhuma sala. Em 2014, eram, ao todo, 272 salas de teatro pela capital.

O Sacomã aparece ainda com menor quantidade de centros culturais, casas e espaços de cultura – 0,04 –, enquanto o distrito da Sé, no centro, com 3,62 espaços em média, aparece no extremo oposto, uma diferença mais de 91 vezes. Em toda a cidade, ano passado, eram 95 desses espaços.

Para o coordenador executivo da Rede Nossa São Paulo, Mauricio Broinizi, os indicadores do mapa, de forma geral, “têm variado muito pouco” desde 2009
Para o coordenador executivo da Rede Nossa São Paulo, Mauricio Broinizi, os indicadores do mapa, de forma geral, “têm variado muito pouco” desde 2009
Foto: Janaina Garcia / Terra

Maior desigualdade em SP é sobre livros/habitante

Apesar de não entrar diretamente na infraestrutura desses espaços culturais, o acervo de livros para os públicos adulto e infanto-juvenil nos 96 distritos foi o fator de maior desigualdade levantado pelo estudo. Aqui, a Rede Nossa São Paulo tomou por base a referência de dois livros per capita colocada pela Unesco como meta por habitante. No estudo, considerou-se a equação entre o número total de livros disponíveis em bibliotecas municipais dividido pela população com mais ou menos de 15 anos.

Na Sé, por exemplo, a média de 16,28 livros por habitante coloca o distrito no topo dos que mais têm acervo de livros para adultos, contra 0,001 no Capão Redondo (zona sul), fora os 36 distritos com indicador zero. A desigualdade nesse item atingiu quase 12 mil vezes de diferença do maior para o menor; entre o acervo infanto-juvenil, ela ficou em 586 vezes na comparação entre 9,88 livros por habitante do distrito da Consolação (área central) para os 0,017 do Capão, fora os 37 distritos com indicador zero.

Por outro lado, o Mapa identificou uma diminuição da desigualdade em relação à demanda atendida em creches da cidade. Esse tópico, por sinal, foi um dos únicos a trazer bairros da periferia paulistana no topo de demanda mais atendida – no caso, Guaianases, na zona leste, com 80,67% de matrículas efetuadas em relação ao total de inscritos. O percentual mais baixo, de 23,53%, ficou na Sé.

A percentagem de domicílios em favelas foi outro indicador forte de desigualdade apontado pelo estudo: 49,59% na Vila Andrade (zona sul) e 0,081% em Pinheiros (zona oeste), fora os 11 distritos (parte deles, na região dos Jardins) sem nenhuma favela. Com isso, o fator de desigualdade foi de mais de 610 vezes do distrito com menos para o com mais domicílios em favelas.

"Alertamos prefeitura e Estado sobre desigualdade", diz ONG

Para o coordenador executivo da Rede Nossa São Paulo, Mauricio Broinizi, os indicadores do mapa, de forma geral, “têm variado muito pouco” desde 2009 no sentido de diminuição da desigualdade na capital. “É como se a cidade não tivesse tido ainda a decisão política de levar os investimentos públicos para as áreas que realmente necessitam. Temos alertado prefeitura e governo sobre isso; o Plano Diretor (aprovado na Câmara ano passado) identifica onde esses investimentos são mais necessários, mas para os próximos 15 anos. E as políticas que deveriam estar em curso?”, indagou.

Segundo Broizini, os pesquisadores se surpreenderam com a disparidade verificada nos distritos não apenas em relação à infraestrutura da área de cultura, como a demanda atendida em creches – maior na periferia que na região central.

O secretário de Direitos Humanos da Prefeitura de SP, o ex-senador Eduardo Suplicy, foi o representante do prefeito Fernando Haddad (PT) no evento
O secretário de Direitos Humanos da Prefeitura de SP, o ex-senador Eduardo Suplicy, foi o representante do prefeito Fernando Haddad (PT) no evento
Foto: Janaina Garcia / Terra

“A diferença de emprego entre homens e mulheres pode ajudar a explicar a questão das creches: têm aumentado a escolaridade e a participação delas no mercado de trabalho, e essa ascensão, combinada com um avanço histórico dos índices de emprego entre 2011 e 2014, indica a enorme solicitação de vagas para crianças de zero a três anos. Mesmo assim, cerca de 50% da demanda, em média, é atendida, e esse é um problema gravíssimo”, destacou.

Presidente da Rede Nossa São Paulo, Odeb Grajev questionou, sobre o acervo de livros na capital: “Será tão difícil as bibliotecas abrirem sábado à tarde e domingo em São Paulo? Há sete anos que pedimos isso para a prefeitura”, disse.

Pelo poder público, esteve presente o ex-senador e secretário municipal de Direitos Humanos, Eduardo Suplicy, que prometeu levar os dados ao prefeito Fernando Haddad (PT) e ao secretariado, além da presidente Dilma Rousseff (PT) – com quem espera ter uma audiência até 21 de junho, aniversário dele. “É necessário que todos nós, secretários, prefeito, vereadores tenhamos consciência de onde falta mais desse tipo de infraestrutura”, resumiu Suplicy.

Fundador do Instituto Chão conversa com o Terra:
Fonte: Terra
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