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Após nova fuga, jovem leva cama a calçada de Higienópolis

Autoridades do Rio e de São Paulo agora buscam solução para adolescente, que é da região de Nova Friburgo, mas sempre volta ao bairro nobre de São Paulo; Ministério Público prevê internação

15 jan 2015 - 09h01
(atualizado às 09h08)
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Depois de viver na árvore, em uma barraca e até na casa dos moradores, G. levou uma cama para a calçada de Higienópolis
Depois de viver na árvore, em uma barraca e até na casa dos moradores, G. levou uma cama para a calçada de Higienópolis
Foto: Débora Melo / Terra

Aconteceu de novo. Depois de ser levado de volta para casa, em Cachoeiras de Macacu (RJ), o jovem G., 15 anos, fugiu para São Paulo pela quarta vez. Ele, que já morou em cima de uma árvore e dentro de uma barraca na rua Doutor Veiga Filho, no bairro nobre de Higienópolis (zona oeste), dorme agora em uma cama de casal montada na mesma calçada. “Achei essa cama em uma caçamba e trouxe para cá”, conta.

As fugas de G. começaram há cerca de seis meses. Desde então ele passou por abrigos e centros de acolhida, mas sempre acabava retornando à rua. O mesmo acontecia quando voltava para casa, que fica na região de Nova Friburgo (RJ). Em novembro, chegou a ser “adotado” por moradores de Higienópolis, que o receberam em casa em uma espécie de rodízio. Esse “acolhimento informal” terminou no início de dezembro, após ele dizer que queria ficar com a mãe. Na segunda semana de janeiro, porém, o jovem estava novamente de volta a Higienópolis.

G. é hiperativo e, apesar dos 15 anos, tem a idade mental de uma criança. Não sabe ler nem escrever e tem problemas de aprendizagem. A mãe do garoto, a diarista Dulcinéia Gomes, 38 anos, diz acreditar que o melhor para o filho seja a internação. “Não sei mais o que fazer, não tenho mais condição de mantê-lo dentro de casa. Se eu tranco a porta, ele pula a janela. Quando ele põe na cabeça que vai sair, ninguém segura. Ele não aceita limite”, diz. Segundo ela, a última fuga foi motivada por um desentendimento entre G. e um vizinho. “Ele teve uma discussão com um vizinho e se alterou quando eu chamei a atenção dele, disse que iria ‘dar no pé’. Ele não é maltratado dentro de casa”, afirma.

Internação

As autoridades de São Paulo e do Rio de Janeiro tentam agora encontrar uma solução definitiva para G. De acordo com a Promotoria de Justiça da Infância e da Juventude de Nova Friburgo (RJ), após a última fuga, o Ministério Público (MP-RJ) solicitou ao município de São Paulo “que adote, com urgência, as devidas medidas de proteção”, evitando que o adolescente permaneça em situação de risco até seu retorno ao Rio, “quando deverá ser imediatamente encaminhado ao Hospital Municipal para intervenção da equipe de saúde mental”. A previsão é que mãe busque o jovem em São Paulo ainda nesta semana.

Segundo Flariston Silva, coordenador de políticas para crianças e adolescentes da Secretaria Municipal de Direitos Humanos de São Paulo, G. já foi levado duas vezes para centros de acolhida na última semana, mas acabou fugindo. Segundo ele, a situação do jovem representa um “desafio”. “Não existe medida de proteção no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) que se cumpra com ação compulsória, a não ser em uma situação extraordinária, com risco iminente”, continuou. O coordenador afirmou ainda que as equipes da secretaria, do Conselho Tutelar e da Assistência Social já foram orientadas a fazer um acompanhamento diário e buscar novas alternativas para abordar e convencer o adolescente a deixar a rua.

De acordo com o MP-RJ, o caso de G. foi objeto de ação civil pública, visto que “Nova Friburgo não havia garantido ao adolescente o devido tratamento de saúde mental, não havendo sequer diagnóstico preciso de seu estado”. O órgão informou ainda que o município foi condenado a prestar o atendimento, o que não foi possível concretizar “devido às frequentes ‘fugas’ do adolescente para São Paulo”.

Riscos

Para a psicóloga Luciana Sodré Cardoso, que morou em Higienópolis até dezembro e foi uma das mentoras do “acolhimento informal” de G., a internação não seria a melhor opção. “Ele precisa de um tratamento alternativo, onde possa ficar livre, mas, ao mesmo tempo, se relacionando”, disse. “Ele volta sempre para o mesmo lugar porque tem uma limitação de aprendizado e percepção diferenciada das coisas. Ele não tem consciência do que faz, pois, se tivesse, não teria voltado tantas vezes para o mesmo lugar. Ele não sabe do perigo que corre.”

De acordo com Luciana, apesar dos amigos que o acolheram no bairro, o jovem corre riscos em Higienópolis. “Já não jogaram creolina nele?", disse, referindo-se a um ataque à barraca do jovem, em novembro. "Também já chamaram a prefeitura para podar a árvore e, assim, não dar mais sombra. E agora me contaram que estão planejando jogar pó de mico no colchão.”

Fonte: Terra
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