Americana fotografa opinião da Rocinha sobre 'pacificação'
Usando cartazes e tampando os rostos, moradores responderam à pergunta: você prefere a comunidade antes ou depois da UPP?
A fotógrafa e assistente social norte americana Margaret Day foge ao estereótipo do “gringo” que chega ao Rio para tomar caipirinha no canudinho de frente para o mar. O motivo de encanto de Margaret passa longe disso e atende, entre outros, pelo nome de Favela da Rocinha, onde viveu por nove meses entre 2011 e 2014, entre idas de vindas a Nova York, sua cidade natal. Depois de presenciar a ocupação da comunidade pelas forças de segurança, com a instalação da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), em 2011, ela resolveu dar voz aos moradores e realizou um ensaio fotográfico chamado “The Residents Speak – Os Moradores Falam”.
O resultado do ensaio, feito para marcar os três anos de ocupação, em novembro de 2014, salta aos olhos. Dos 21 moradores que toparam responder à pergunta: “Você prefere a Rocinha antes ou depois da instalação da UPP?”, 16 disseram que antes e cinco apenas, opinaram que a favela está melhor pós UPP. Para não expor os moradores que colaboraram com seu projeto, Margaret os fotografou com pequenos cartazes em frente ao rosto, com as respectivas respostas e os motivos que explicam seu posicionamento.
O ensaio foi publicado na página da fotógrafa no Facebook há alguns dias. Ela afirmou ao Terra ter sentido necessidade de dar voz aos moradores da Rocinha. “O problema é que ninguém está escutando essas pessoas. Recebi dos meus pais a noção de que é importante escutar a realidade do outro. Como assistente social, preferi fazer contato com as pessoas que vivem nas favelas do que visitar as praias famosas”.
A ideia de lançar o ensaio de fotos com a pergunta surgiu do questionamento recorrente que lhe faziam, tanto no Brasil quanto nos EUA: afinal, a comunidade está melhor agora ou antes? Apaixonada pela Rocinha, Margaret, que fez mestrado na Universidade de Columbia, comenta que não buscou fazer um estudo científico com dados rigorosos, mas apenas refletir a realidade que acompanhou na favela.
Muitos moradores, como esperado, tiveram medo de se expressar e a decisão de cobrir os rostos foi da própria assistente social, para preservá-los. “Eles tiveram medo, pois é parte da cultura da favela não discutir essas coisas com estranhos”, admite, emendando: “As pessoas não querem responder porque tem medo de represálias. Eu não gostaria de colocar ninguém em perigo”.
Expectativas frustradas
Pelos relatos que ouve e pela experiência que ela própria viveu, a fotógrafa afirma que, no início, com a chegada da UPP, os moradores estavam esperançosos de que os serviços também chegariam e a qualidade de vida melhoraria. Hoje as pessoas estão de certa forma decepcionadas pois há tiroteios e casos como o do pedreiro Amarildo de Souza, desaparecido em 2013 depois de uma abordagem de policiais da própria UPP.
Margaret conta que recebeu vários alertas de que não deveria visitar a Rocinha. Ela não deu ouvidos. No segundo dia no Rio, ainda em 2011, subiu o morro para conhecer a comunidade. “Eu estava ciente da reputação do Brasil de país perigoso. Mas eu sou de Nova York, que tem reputação similar. Existe uma história semelhante, por exemplo, de opressão das ‘pessoas de cor’ no Brasil e também nos EUA. Me senti bem de conversar com os moradores”.
A fotógrafa garante que se sentiu muito segura na Rocinha - e se derrama em elogios aos moradores e à favela.